Onze

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Coloco Lucy para dormir cedo e fico acordada no meu quarto até saber que as meninas caíram de verdade no sono. Fico encarando os estrados da cama de cima até que contei todos eles milhares de vezes, e perco as contas de quantas vezes me lembro que Amanda não está lá, que não ouço-a se mexer durante a noite e o quão inquieta ela era dormindo.

Quando esse pensamento me passa pela cabeça de novo, não aguento mais e me levanto. Visto o casaco que deixei nas costas da cadeira, pego o frasco do remédio e saio em meio à escuridão.

Já sei o caminho de cor, e dessa vez, não corro risco de me perder. Ao fazer esse trajeto, me lembro da vez que o tracei pela primeira vez. Não fazia ideia do que poderia acontecer lá, e como hoje, estou com o mesmo sentimento.

Saio das escadas que ficam ao lado do elevador – que estão desativados para a economia de energia – e caminho pelo corredor totalmente deserto. Tento não fazer barulho, o que na verdade não é um problema, desde que aprendi a ser cautelosa, inclusive no caminhar.

Mesmo assim, prendo a respiração e me concentro na terceira porta a minha esquerda.

Um... Dois... Três.

E enfim, chego.

Respiro fundo para tomar coragem e bato primeiro duas vezes, faço uma pausa e bato de novo, quatro vezes. Esse é o nosso código. Nunca oficializamos isso com palavras, mas conhecemos essas batidas. Virou nossa marca, na verdade. Principalmente nos dias que ficamos presos na Central, quando não tínhamos nada para fazer. Primeiro, ele começou a bater assim no chão. Depois, por puro impulso, peguei sua mania e estava tamborilando a batida com os dedos na perna. Até que esse som passou a ser o nosso código.


Quando ouço, sei que é ele.

E quando bato na porta, sei que ele sabe que sou eu.

E é por isso que logo ouço o barulho da porta sendo destrancada e aberta. A luz que vem lá de dentro é fraca, e sei que o seu abajur está ligado. Entro sem ser convidada e me espremo na parede, até que a porta esteja fechada.

Por Deus, que ninguém nunca me pegue no meio de uma fugida dessas.

— Desculpe se te acordei. – sussurro por sussurrar. Sei o quanto essas portas e paredes são grossas para que alguém possa ouvir.

— Não estava dormindo. – ele diz, e ouvir sua voz, mesmo que depois de pouco tempo, me acalma. Não é o mesmo tom que o "professor Hunter" usa. É o tom que o "alguma-coisa-da-Lore" usa, e isso me deixa aquecida. – Novamente os pesadelos? – pergunta, e dessa vez, há um quê de preocupação.

— Na verdade, não. – confesso. – Não tenho dormindo para poder ter pesadelos.

Minha visão se acostuma com a meia luz e começo a vê-lo melhor. Ele está sem camisa e veste uma calça de moletom que tive o prazer de vê-lo vestir pouquíssimas vezes. Seu rosto está cansado, mas sem nenhuma evidência que ele esteve dormindo.

— Pensei que só eu estivesse com insônia. – Hunter observa.

— Não acho que seja insônia. – dou um risinho e esfrego os braços. Não por estar com frio, mas somente por não me sentir confortável, sem saber exatamente o porquê.

LIGHTS - Livro IIOnde histórias criam vida. Descubra agora