PRÓLOGO

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A respiração saía em golfadas pelos lábios entreabertos, os pulmões pareciam queimar enquanto descia apressada a velha escada de concreto tentando não tropeçar nos próprios pés ou nos pedaços que faltavam dos degraus deteriorados, a imagem da tinta lascada da parede passava diante de seus olhos em um borrão, podia ouvir o som do próprio coração batendo acelerado, assim como o barulho de seus passos desesperados, os tênis de couro sintético rosé pouco faziam para abafar os sons de sua fuga.

Não havia ninguém a quem pedir ajuda, não havia viva alma nos corredores sombrios, todos os apartamentos daquele prédio decadente permaneciam com as portas fechadas e não queria perder um tempo precioso na porta de alguma casa que pudesse estar vazia. Pulou os dois últimos degraus vendo adiante o último lance de escadas.

Precisava escapar, tinha que escapar pensava ela aflita, sentia a mochila batendo em suas costas desconfortavelmente, queria poder se livrar dela, mas seus poucos pertences estavam em seu interior e não podia deixa-los para trás, seu pé escorregou no último degrau antes de chegar ao pequeno pátio que dava para a rua estreita que mais parecia um beco, apoiou uma mão na parede buscando se firmar sentindo a palma arder, mas não se importou, estava focada em chegar ao pequeno portão de ferro que a separava de sua liberdade e por que não dizer, de sua salvação.

Lançou-se sobre o portão com todo o peso de seu corpo pequeno conseguindo abri-lo continuando com sua corrida pela viela suja, desviando dos sacos de lixo e dos animais abandonados, as poucas pessoas com quem cruzava  corriam para o abrigo de suas casas temendo se envolver e acabar se tornando alvo daquilo que a perseguia, segurou a costela que começava a doer pelo esforço físico tentando se lembrar qual era a melhor rota de fuga, decidiu pela mais curta, seguindo pelo beco em direção a uma avenida que cortava a favela.

Faltava apenas mais alguns metros repetia como um mantra em sua mente tentando convencer o corpo cansado a percorrer a distância que faltava, suas pernas reclamavam, os músculos enrijecendo a cada passo e diminuindo drasticamente sua velocidade, os pulmões pareciam prestes a explodir, olhou de um lado para o outro buscando algum lugar onde se esconder, ouviu os passos de seus perseguidores ainda mais perto, forçou-se a prosseguir, não se entregaria, não facilitaria o trabalho daqueles miseráveis,  só mais alguns passos pensou implorando mentalmente que seu corpo colaborasse mais um pouco, resistisse e então poderia ficar livre, só precisava chegar até a bendita avenida que parecia inalcançável.

Puxou o ar sentindo que o fôlego a abandonava, segurou a lateral dolorida do corpo, o gosto amargo do medo impulsionando-a, o barulho do lixo sendo chutado estava assombrosamente mais perto, se tivesse uma arma, qualquer uma, até mesmo um pedaço de madeira, pensou angustiada, por favor, não deixe que me peguem, suplicou  aos céus aflita.

Viu a poucos metros a frente a avenida movimentada e sentiu a esperança se renovar, ia conseguir, só mais alguns passos e então...

Um carro preto parou fechando a passagem que dava para a avenida impedindo-a de prosseguir, em seguida sentiu um par de braços fortes a agarrarem  enquanto o grito de pavor que escapava de seus lábios  era abafado por uma mão sobre sua boca, uma picada em seu braço direto a fez gemer de dor enquanto seu corpo ia desfalecendo rapidamente, ele havia vencido, pensou furiosa um segundo antes de ser dragada pela escuridão.

EM SUAS MÃOSOnde histórias criam vida. Descubra agora