A visão era imponente. Até o cético Akyrius ficou admirado por aquela cidade ter sido erguida por mãos humanas. Altas torres despontavam pelas ruínas, alaranjadas pelo sol de fim de tarde, assim como as outras ruínas e a grande pradaria que se estendia pelo horizonte. Uma muralha com não mais de sete metros cercava a outrora próspera cidade, agora rompida em diferentes pontos.
O sol já havia se posto e a lua subira ao céu, brilhante, quando eles finalmente alcançaram os portões da cidade. Parecia abandonada há séculos, embora a destruição daquele lugar tenha ocorrido apenas há algumas décadas...
Não trocaram palavras, o ambiente parecia emitir uma energia fúnebre, como se dissesse que os mortos não deviam jamais ser perturbados.
Encontraram abrigo perto do que havia sido um pátio e montaram acampamento. O espaço era suficientemente aberto para conferir uma visão ampla. Embora se acreditasse que aquela cidade era abandonada, havia sempre o risco de monstros ou animais selvagens estarem espreitando por ali.
- Este lugar... eu sinto uma energia diferente nele, nem boa nem má, mas é como se as almas dos que morreram ainda estivessem aqui, nos vigiando. O que você acha, Hannah?
- Eu posso sentir isso também. Embora eu reconheça que nunca havia sentido tal coisa em nenhum lugar em que estive antes.
Akyrius confirmou que tivera a mesma impressão dos outros dois.
- Acredito que isso se deve ao grande número de pessoas deste lugar e aos sentimentos que tiveram na hora da sua morte.
Cain pusera para fora a pergunta que viera-lhe à mente na hora em que pôs os olhos naquele lugar.
- O que causou toda essa destruição?
- Um dragão. Um enorme e vermelho dragão, é o que os poucos que conseguiram sobreviver relataram. E tem mais, conta-se que nem antes nem depois ele tenha sequer sido visto.
Cain ficou surpreso com o que a maga falara. Mas o fato dele ter aparecido naquele lugar do mundo deixou-o aflito. Afinal, não estavam tão distantes assim de Zentage, da mãe. Havia sim, a possibilidade de uma criatura como aquela aparecer por lá, embora o reino de Luna fosse em grande parte um lugar calmo.
A lua estava especialmente brilhante naquela noite. Não havia nenhum som, apenas a ocasional passagem do vento e mais nada. O mestiço fazia a vigília, posicionado num local elevado, o que lhe propiciava uma visão ainda mais abrangente de onde estavam.
Hannah estava recostada em uma coluna de pedra ruída, enquanto fazia anotações nas páginas gastas de um velho tomo, sob uma pequena mesa improvisada.
A manhã seguinte, pegou-o ainda na vigília do grupo. Após os preparativos, seguiram viagem. Hannah contou que Cylos era o nome daquela cidade. Em um passado remoto fora a sede do trono dos reis de Angorath, o extenso reino que se estendia desde Rhylm até a cadeia de montanhas nevadas ao norte conhecida como a Borda do Mundo.
Cylos era exuberante. Mesmo em decadência, os três puderam enxergar um pouco de sua grandiosidade. As ruas eram largas e calçadas, havia incontáveis fontes e poços, todos secos. Cada casa por que passavam era mais rica em detalhes que a anterior. Jardins antes bem cuidados invadiam as ruas e as moradias, tapetes de grama cobriam as ruas. Era fácil se perder ali.
Finalmente eles chegaram no que deveria ser a praça principal, e avistaram duas figuras idênticas. Eram humanos, ou aparentavam ser, pois suas figuras eram tão altas, tão esguias, que poderiam ser confundidas com elfos.
Os dois pareceram notar a presença do grupo e levantaram-se. Um longo momento sucedeu-se, até que um deles, o que estava a direita disse:
- Podem se aproximar. Não somos ladrões.
Sem ter porque desconfiar, o grupo foi até eles.
Eram gêmeos. Aparentavam ter a mesma idade de Hannah. Algo em torno de vinte a vinte e
cinco anos. Tinham uma cimitarra cada. O da esquerda apresentou-se como Saan, e o da direita como Siel. Pareciam abatidos física e mentalmente.
- Éramos parte de um grupo maior. - O primeiro falou. - Nós e mais outros três. Juntamo-nos
em Rhylm há alguns dias e fomos reivindicar a cabeça de Barktheld. Eu e meu irmão fomos os únicos que conseguimos escapar.
- Estávamos indo para lá também. - Confidenciou Hannah. - Na verdade, paramos em Rhylm com a esperança de encontrarmos mais algumas pessoas dispostas a juntarem-se a nós.
Os irmãos entreolharam-se e concordaram com um leve aceno de cabeça.
- Vamos com vocês. - Siel falou. - Somos caçadores e vinhemos de longe para ter um pouco do tesouro desse meio-dragão.
- Além disso, somos bem fortes, vocês verão. - Falou Saan por entre um sorriso.
- Muito bem, está decidido. - Era Hannah. - Eu devo contar a vocês que temos um único objetivo que é reaver a espada bastarda Executora Divina. Essa é a nossa prioridade.
Os gêmeos ficaram espantados por um instante, mas disseram:
- Por nós tudo bem. Estamos acostumados só com armas leves.
Saan e Siel reuniram seus parcos pertences e juntaram-se aos outros. Seria uma longa viagem
até o ponto onde eles disseram ter confrontado o meio-dragão.
Três dias de caminhada foi o tempo que levaram para atingir o topo de uma montanha, aparentemente sem a presença de nenhum ser vivo.
- Nenhum animal ou monstro seja ele qual for ousa vir aqui.
Uma região sem plantas ou árvores de nenhum tipo estendia-se à frente do grupo, além,
uma enorme caverna como se encravada dentro da montanha. Algumas construções muito antigas despontavam aqui e acolá.
Acima de uma dessas construções alguém os observava. Vestia roupas leves, porém suntuosas, condizentes com o clima daquele lugar e com a classe social de algum nobre. Parecia um humano, exceto pelos olhos, que eram vermelhos e possuiam uma íris muito estreita, reptiliana.
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A Canção Dos Mortos
FantasyUm trio de aventureiros sai em uma jornada para recuperar a lendária espada Executora Divina, que outrora pertenceu ao paladino do Deus da Justiça. Paralelamente á isso, os lacaios do Deus da Morte, Hakai, estão comprometidos em trazer a glória para...