CAPÍTULO 24

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August foi a melhor pessoa que conheci enquanto vivi em Aridon, não existiu outra pessoa, de Salim a Lhuria, em todos os cinco cantos, que tivesse uma alma tão pura quanto a daquele garoto.
Seu olhar como mel líquido conquistou minha confiança na noite em que jantamos juntos, quando eu e seu irmão Arthur trocamos farpas, mas nossa amizade começou mesmo quando ele tomou o chá de Melissa batizado com veneno de Ironfire, o lendário Fogo de Ferro, que era destinado a mim. Uma clara ameaça a minha vida. Clara Dallow me queria morta e se não fosse por August, talvez tivesse tido sucesso em sua falha tentativa.
Steffan só percebeu que Clara havia me dado aquela xícara tarde demais, um pequeno gole era capaz de matar imediatamente, uma gota capaz de matar dentro de pouquíssimas horas, com uma hemorragia interna do estômago tão forte que nada podia ser feito. Ironfire era agressivo, fazia o indivíduo que o ingeria chamuscar de dentro para fora, queimando, carbonizando até a morte.
Mas August não tomou, seu primeiro gole do chá fora expelido de seu corpo por meio da grande corrente de ar que meus dedos guiaram rapidamente para dentro de suas narinas, causando um engasgo que o salvou, em partes. O líquido tocara sua língua e suas bochechas, mas principalmente a língua, de forma que a mesma fora queimada até não existir mais, as bochechas se abriram em grandes feridas internas, mas com a ajuda de guardiões da água, curandeiros formados na Academia de Curandeiros de Devália, os ferimentos foram cicatrizados mais rapidamente. A memória de seus gritos abafados e das lágrimas que não cessavam não saiu de minha mente, tamanha era sua dor que ninguém podia controlá-la. Por dias August sofreu com a mutilação de sua boca, curandeiros tentaram, de todas as formas, aplacar sua agonia, mas para um veneno letal, ele estar vivo era tratado como um milagre e os guardiões não eram mais tão fortes, só podiam acelerar o processo de cura, não curar a ferida de forma definitiva imediatamente.
Mas como tudo na vida passava, uma semana e meia depois August já quase não sentia mais dor, conseguia dormir e beber água com ajuda do dom dos guardiões, ele teria que se adaptar, o destino lhe cobrou um preço caro para continuar a vivo.
Naquela manhã porém, finalmente, depois de três semanas, August Berthel ganhou permissão para sair de seus aposentos e eu, o acompanharia a um passeio pelo jardim sul, que fazia fronteira com a Floresta Branca.

— Sinto muito pelo que aconteceu, Gus, eu sei que palavras não vão servir de nada e não vão tirar as marcar profundas que ficaram em você.

Ele balançou a cabeça, em sinal de: deixa pra lá. E entrelaçou seu braço no meu, me dando um sorriso, que acabou se repuxando para o lado direito. Sequelas de um ferimento profundo demais para deixar o tecido de sua bochecha reconstruído por completo.

— Eu devo minha vida a você, August, mas não fico feliz em estar viva e ver você nesse estado, por culpa de uma rivalidade que você sequer tem proximidade.

Ele meneou a cabeça em sinal de confirmação e continua sorrindo, mas logo lágrimas começam a brilhar em seus olhos.
Talvez ainda doesse para sorrir.

— Dói para sorrir?

Ele fez um gesto com a mão, indicando que não muito. Então não era por isso que lágrimas despontavam de seus olhos.

— O que é então?

Ele parou pensativo, imaginando uma forma de se comunicar comigo, de me fazer entender. Então fez um gesto com a mão, como se estivesse escrevendo.

— Vou mandar providenciar uma pena e papel para você — disse e seus olhos brilham.

Chamei um criado que cortava a grama e fiz o meu pedido, deixando claro que precisava urgentemente e o homem saiu apressado, adentrando no palácio da Lua.
Guiei August até uma mesa abaixo de uma frondosa árvore que nos cobria com sua gigante sombra e nos acomodamos, esperando o criado voltar. Acabei contando as coisas mais relevantes que aconteceram naquelas três semanas que ele passou em seus aposentos enquanto ele apenas sorria e concordava com a cabeça.

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