Paixão nos Bastidores

Capítulo 37 - Promessa

De volta a São Paulo, Katarina estava em seu camarim fazendo o último retoque em sua maquiagem. Certificou se todos os objetos que usariam em cena estavam aptos para serem usados, fez alguns exercícios de aquecimento vocal, recitou o seu mantra e sentiu seu corpo todo vibrar quando ouviu o terceiro sinal do teatro, anunciando que entraria em cena. 

 O teatro localizado na Avenida Paulista estava lotado. Aquela era sua terceira apresentação em São Paulo depois de 4 meses viajando em turnê por algumas capitais do país.
Sua peça fazia parte de um Circuito Cultural que estava acontecendo naquele final de semana não somente na capital como nas principais cidades do interior do estado. Mais uma vez lá estava ela, em seu espaço sagrado, naquele ambiente que a isolava de todas as lembranças ruins, principalmente as relacionadas à Christina. 

 Fazia quatro meses que não se falavam. Só sabiam uma da vida da outra através dos jornais e das redes sociais e foi muito doloroso o dia em que viu desses canais de fofoca, enquanto descansava no camarim, um vídeo de Christina sendo flagrada beijando Maurício Fausini, um chef e apresentador de um programa de culinária e que também era seu amigo pessoal.

 Ao ser entrevistada por algum paparazzi, ficou abraçada com ele a todo o momento encerrando a entrevista com um beijo que foi transmitido para milhares de expectadores, mas uma em especial fora atingida em cheio. 

 Aquilo doeu tanto a ponto de Katarina perder o ar, sua visão ficar turva, o corpo todo tremer, sem contar que tinha a nítida certeza de que fizera de propósito com o objetivo de atingi-la por conta de David, pois acreditava que ele tinha um romance com a garota e certamente para se vingar daquele dia fatídico em que fora flagrada saindo do quarto do rapaz. 

 Katarina chorou por horas tudo o que tinha para chorar. Não havia mais nada que pudesse ser feito em relação as duas. Ficou deitada em posição fetal, tentando ganhar forças e quando conseguiu levantou-se num ímpeto, olhou-se diante do espelho e jurou a si mesma que aquelas eram as últimas lágrimas que derramaria por Christina. Jurou para si mesma que não a deixaria machucá-la novamente. 

 Se dirigiu para o vestiário, tomou um banho frio e juntou-se com o restante da sua equipe para acertarem os detalhes finais, pois faltava pouco para subir ao palco. Em seguida voltou para seu camarim para se maquiar e passar seu texto pela última vez e então se posicionou na coxia até o seu momento de entrar sem cena e apresentar seu melhor espetáculo. 

 Cada palavra da poesia que recitava despertava na plateia várias emoções, levando-os das lágrimas aos risos. Nesta apresentação contou com a presença de uma pessoa muito especial, alguém que fazia parte dos momentos mais importantes de sua vida. 

 Ela dividiu o palco com David, o amigo que cuidou dela em meus momentos mais difíceis e novamente estavam juntos, ao som de atabaques, afoxés e agogô orquestrados por músicos do candomblé. O som daqueles instrumentos tão hipnóticos, vibravam cada célula do seu corpo e ela se sentia tão acolhida por seus ancestrais que hoje estão em outro plano e juntos recitaram a poesia também de Carlos Assumpção...:

PRESENÇA

É Zum
É Zum
É Zum
É Zumbi
Zumbi de Ogum
Guerreiro de Ogum
Aqui
Na praça na raça
Na reza fumaça
De incenso no ar
No canto de encanto
Na fala na sala
Na rua na lua
Na vida de cada dia
Em todo lugar

É Zum
É Zum
É Zum
É Zumbi
Zumbi de Ogum
Guerreiro de Ogum

Aqui
rabo-de-arraia
No aço do braço
No samba de samba
No bumba-meu-boi
No bombo do jongo
Congada batuque
Maracatu
Zumbi Zumbi Zumbi
Guerreiro da Serra
Sob as estrelas acesas
Na madrugada
Nó do ebó na encruzilhada

É Zum
É Zum
É Zum
É Zumbi
Zumbi de Ogum
Guerreiro de Ogum
Aqui

O ritmo frenético com que dançavam e brincavam com as palavras, contagiou todo o público, deixando muitos arrepiados e foram ovacionados. Emocionados, agradeceram ao público toda aquela manifestação de carinho.

Ao final do espetáculo foram para o apartamento de Katarina. Ele estava hospedado em sua casa, não como seu namorado e sim como seu amigo.

Ele desejou muito que o romance que começou nas serras gaúchas engrenasse. Ele levou um tempo para entender que só poderia tê-la como amiga, o que seria muito melhor que não tê-la. Enquanto Katarina tomava banho, ele preparou um lanche para os dois e estranhou ao vê-la de moletom numa noite tão quente. 

 Há dias ela não estava muito bem de saúde. Alimentava-se muito pouco, teve febre algumas vezes, dores nas costas só que era teimosa e não se cuidava. Tomava antigripais e chás, mas nada que desse resultado efetivo. Não era incomum ter crises de enjoo e ânsia, acreditando ser decorrente de suas crises de labirintite. -Mocinha, se até amanhã não melhorar, vou te levar para o hospital nem que seja amarrada. 

-Está com febre de novo e com essa cara, parecendo a Winnie Ranheta, tendo crises de enjoo em cima de um camelo. Katarina não conseguia parar de rir da comparação. Os dois amavam desenhos antigos, principalmente as Aventuras do Pica Pau, inclusive ele tinha alguns episódios baixados em seu celular que assistia durante as viagens de avião. 

Com ela deitada em seu peito, ficaram olhando o céu estrelado através da janela panorâmica de seu apartamento, ouvindo as músicas que havia selecionado em sua play list. 

 -Quando era adolescente, morava em um apartamento aqui no centro de São Paulo mesmo, no Cambucí e lá tinha uma janela como esta. Adorava ficar olhando para o céu até que em um dia cismei que os aviões que por ali passavam poderiam ser discos voadores. Entrei em pânico, desesperada, sem saber quem salvava primeiro, meus pais ou minhas irmãs. – confidenciou as gargalhadas. 

 -Garota que imaginação fértil! Você é incrível Katarina! – elogiou, apertando-a em um abraço. Estavam tão cansados que não demorou muito para que dormissem.

Acordaram com o celular de Katarina tocando insistentemente.

Enquanto levantava se perguntou quem era a pessoa tão desesperada para ligar com tamanha insistência.