Mas seus olhos me levarão direto de volta para casa

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O cansaço se apropria do meu corpo e da minha mente. Isento de energia, decido me manter quieto a espera do sono. Eu havia desenvolvido uma estranha dificuldade para dormir, algo que nunca antes aconteceu comigo. Apesar do sono, demorava para conseguir ser embalado por ele. O som do ar condicionado, o escuro que dominava o meu quarto, os lençóis macios, todo o externo era propício e ainda assim, minha mente, mesmo exausta, continuava a circular sobre alguns assuntos. 

Eu sentia falta do Mew. 

Ele foi viajar a três dias atrás, de acordo com ele, essa era uma viagem curta, uma semana era considerado curta. Não nos falamos muito durante esses dias, eu estava preso com novos ensaios e trabalhos da faculdade, além de estar esquematizando meu tcc. Fiquei com inveja quando ele disse que iria a Riel, lá era um lugar tão bonito. 

Queria fotos mas Mew apenas me enviou uma self sua dentro de um restaurante com uma foto minha na propaganda da cerveja. Claramente me zoando, porém, até minha imagem já foi para Riel e eu não. Mew aparentava feliz na foto, um pouco cansado, mas alegre. E foi tudo o que ele me enviou, depois disso sumiu. Mesmo eu tido feito algumas perguntas. Eu não me importava de fato, essas coisas aconteciam, nossa agenda de vez em vez era torturante. 

E o que minha mente teimosa não quer apagar é a foto postada por ele nos stories de seu Instagram. Ele estava com uma mulher, eu sabia quem era, a dona da Julis Cosmetics, eu até tinha alguns de seus produtos, eram realmente bons. Não deveria me incomodar com a foto, Mew conhecia muita gente, sempre postava fotos com diferentes personalidades. 

No entanto, não posso negar que algo me incomodou. Talvez fosse a luminosidade baixa do lugar onde eles estavam, parecia ser um local fechado, Mew sorria do jeito como quando bebia, Parm apoiava seu corpo na lateral dele, de maneira muito íntima. Íntima. Eu não posso me preocupar com isso, eu tenho mais coisa para pensar! 

E mesmo repreendendo minha mente, a imagem não saia de jeito nenhum. Mew podia fazer o que ele quiser, ele era um homem livre e desimpedido. 

- Certo. - Afirmo em voz alta, enfio minha cabeça em baixo dos travesseiros, tentando afobar as vozes mentais insuportáveis. 

- Eu não me importo. - Sussurro em meio ao casulo macio. 

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A campainha tocava sem parar, nunca havia reparado o quão irritante era. Me levanto em puro ódio de quem for que estava a me perturbar. Não me importava minha aparência, caminhei a contragosto até a porta, o olho mágico me mostrando o rosto ridículo do meu irmão. 

- Ei, que cara é essa? Tem certeza que você é modelo? Como ganha com um rosto desse? - Destilo todo meu ranço através do olhar, o observando adentrar sem ser convidado. - Que bom que vim, parece que você estava precisando de uma companhia. 

- O que você quer? Isso são horas de se aparecer na casa dos outros? - Kio franze a testa para mim e olha em seu relógio de pulso. 

- São meio dia e meia Gulf e você não é os outros, é o meu irmãozinho. - Encaro suspeito o homem que agora sentou confortavelmente em meu sofá. Kio era meu oposto, não somente na personalidade, como também na aparência. Talvez nossas tonalidades fossem a única coisa que nos ligasse fisicamente.  - Dormir até meio dia em uma sexta feira? Você está doente? 

- Não, cansado, porque não sei se você sabe, mas eu tenho minhas responsabilidades e você acabou de arruinar o meu descaço. - Me sirvo de suco de laranja e alguns biscoitos amanteigados. 

- Cansado e com responsabilidades, resume a vida adulta, parabéns. - O som da voz de Kio estava começando a me irritar. 

- O que você quer mesmo? - Kio pega o controle da TV e começa a passear entre os canais. 

- Vim dizer que você será o meu padrinho de casamento. - 

- Veio para isso? Eu sei que você é antigo mas sabe do porque utilizamos as redes sociais, certo? - Agora eu só estava implicando com ele e como sempre o sorriso idiota surge em sua face. 

- Mesmo que você despreze minha boa vontade, eu também vim te levar para almoçar. Vá se trocar, lava esse rosto e faça sua magia para voltar a ficar apresentável de novo. - Crescer com Kio foi um momento de grandes lições e muita raiva incumbida.  A cara de sonso dele só engana a esposa dele. 

- Então, sente falta da Lis? A tanto que precisa preencher seu tempo comigo? - Eu estava de mal humor, era um fato. Kio parecia não se importar e seguíamos em nosso diálogo de contrativos humores. 

Decidimos ir em uma restaurante no centro, não muito longe do meu apartamento. Não estava tão cheio quanto achei que iria ficar e mesmo estando mal humorado, agradeço a ele por me tirar de casa. Se não, provavelmente passaria o resto do dia deitado, não que isso fosse ruim, no entanto, meus pensamentos iriam me acompanhar  e fazer do meu tempo livre um estorvo. 

- Claro que sim.  - 

- Essa foi sua resposta para qual das duas perguntas ? 

- Para as duas. - Sorrio, me controlando para não jogar o pão da cesta a minha frente nele.

- A mamãe esta falando com você direito?  - Kio suspira e acena a contragosto. 

- Sim, ela me ama. 

- Claramente não ama sua noiva. - Bebo meu suco encarando suas expressões. Ele se remoía em desgosto a saber que nossa mãe não aprovava seu casamento. 

Na verdade, eu nunca proferi em voz alta, mas também fiquei surpreso pela mamãe não aceitar Lis. Não era como se ela fosse a pior namorada que ele já arrumou, acredite, ele teve piores do que uma mulher mandona e controladora. Entretanto, Kio sempre foi o filhotinho da mamãe, sim, esse era o apelido dele. E ele poderia fazer o que quisesse que ela passava o aval, até o dia em que ele apresentou-a a Lis, foi quando a onda de desafeto atravessou nossa família. 

Diferente de mim, mamãe nunca esperou que eu seguisse o que seja que ela planejou ou chegou a imaginar para mim, eu era o desgarrado. E durante a minha infância eu só precisava seguir as regras, de resto, eu era completamente livre. Então, o incomodo de rejeição que Kio sentia a cada vez que falava ou lembrava do fato que seu casamento vai contra o que nossa mãe quer, era verídico. 

- O que me leva pôr as esperanças em você. Arrume alguém que a mamãe desaprove em um nível bem maior do que a Lis e eu não estarei mais em último na escala de decepção. - Ele parecia realmente acreditar naquele plano mal diagramado.

- Nossa mãe é preconceituosa, aceita. Talvez ela até vá em seu casamento, de preto, mas vai. - Kio realiza meu pensamento anterior e joga em mim o pão que estava na cesta entre nós. 



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