CAPÍTULO 4 - JAIME

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Não sei em que momento eu me perdi.

Talvez tenha sido quando Henrique se aposentou há 10 meses e voltamos a morar no Brasil.

Anos e mais anos da minha vida dedicado à profissão de jogador de futebol do meu irmão e, de repente, me vi sem propósito.

Ser seu empresário me trouxe muitas coisas: dinheiro, conhecimento, viagens, respeito no mundo dos negócios, mas, por outro lado, me deixou limitado e, quando me dei conta, o tempo havia passado.

Henrique decidiu sair dos holofotes no auge da carreira. — Prefiro deixar o campo ainda brilhando, irmão — disse com seu enorme ego.

Ele queria ficar mais tempo com a sua família e sair enquanto era aplaudido de pé. No começo fui contra, bati o pé e quis fazê-lo mudar de ideia. O que seria de mim? Eu não teria há quem destinar o meu tempo livre. Não teria família para cuidar.

Tive raiva. Fui egoísta. Quis jogar toda a minha frustração em cima do meu irmão. Eu estava errado.

No fundo, Henrique estava tendo a ideia mais acertada da vida e foi nesse momento que me dei conta que eu estava sozinho. Afinal, meu tempo era apenas proposto nas tarefas do Soberano Soares.

A realidade doía.

Eu sempre quis ter uma família. Casa cheia e alguém para cuidar de mim e o tempo passou. Por ironia do destino, meu irmão, o qual nunca almejou nada disso, tinha uma família linda. Eu tinha um orgulho imenso dele, claro, mas também uma tristeza no peito por não ter aproveitado o tempo com o que realmente importava.

Cheguei perto algumas vezes, mas eu sempre fui muito cético em relação à sentimentos. Henrique costuma dizer que eu sou o príncipe dos contos de fadas só que ao contrário das fábulas, eu que espero a princesa em um cavalo. Era ridículo ele falar isso quando já se tem o amor da vida. Difícil era conseguir encontrar essa pessoa. Saber diferenciar daquelas que só querem aproveitar do dinheiro... enfim.

Vejo no celular que já passam das 9 da manhã. Coloco o café na xícara e me escoro na bancada da cozinha. Perdido nos meus pensamentos, olho para a janela da frente e vejo os meus sobrinhos brincarem de Nerf no quintal. Sorrio sozinho.

A moça em que passei a noite foi embora antes de amanhecer. Não sei por que, mas agradeci por isso. É sempre chato se despedir de uma transa descompromissada. Foi bem legal não terminar a noite sozinho e foi só isso.

Estava esperando Henrique acordar para se gabar.

Lavo a xícara do café e dou uma ajeitada na cozinha. A diarista só vem na segunda e eu detesto desorganização.

Subo as escadas de casa e tomo um banho gelado. Quando volto para a sala encontro Catarina no sofá lendo alguma revista de negócios que deixo em cima da mesa de centro.

— Bom dia — ela diz, percebendo a minha presença, colocando a revista no lugar. — A porta estava encostada.

— Minha acompanhante deve ter deixado aberto.

Ela torce a boa e arqueja as sobrancelhas.

— Hum... acompanhante. Isso soa meio esquisito. Mas e aí, como foi?

— Como foi o quê? Com a acompanhante?

Ela faz que sim com a cabeça.

Sacudo a cabeça em negação.

— Henrique me contou o que fez — diz ela.

Catarina se levanta e vai até mim com as mãos no bolso de trás da calça de jeans.

AGORA OU NUNCA (Spin-off de Tudo ou nada)Onde histórias criam vida. Descubra agora