Capítulo Dois

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Emanuelle...

Um ano atrás

Brasil... (Salvador, Bahia)

Entrei em casa, soltando fogo de tanta raiva. Arremessei meus livros sobre a cama, respirei fundo, tentando acalmar cada nervo em mim. A paz durou pouco, ouvi os passos apressados subindo as escadas, eu tinha que me preparar.

— Emanuelle?

Minha mãe já estava parada, com as mãos no quadril, seu olhar carregado de ameaças.

— O que você tem nessa cabeça?

— Estou cansada, mamãe.

Isso só a irrita mais, dando munição para seu ataque.

— Cansada? Emanuelle, cansada estou eu.

— Mamãe, por favor.

— Você sabe o que fez, irritando o Hugo daquele jeito?

Fico de pé, sentindo a mágoa me corroer.

— Ele não é meu dono, mamãe.

— Ele é seu noivo.

Quase rio, isso era o que todos pensavam. A garota que pertencia a Hugo Valdez, o dono da comunidade. O mestre em capoeira.

— Eu não sou noiva dele.

Minha mãe volta a falar, num tom mais alto, me assustando.

— Você sabe, que devemos tudo a ele, depois que seu pai...

Ela fecha os olhos, não tinha coragem de dizer em voz alta, às vezes, eu acreditava que ela nunca nem aceitaria, mas já fazia dois anos que meu pai fora morto em serviço.
Meu pai era policial, sempre a, serviço da lei. Foi num ato covarde, uma emboscada, que sua vida foi ceifada. Nunca descobriram, como a informação fora vazada.

— Todo mundo, nessa vila deve algo a Hugo, o que me irrita.

Minha mãe, segura seu avental, respirando fundo.

— Ele é um bom rapaz, e você tem sorte que seus olhos, caíram sobre você.

Sinto um tremor percorrer meu corpo. Todos naquele lugar, veneravam Hugo, eu não conseguia me afeiçoar, havia algo de sombrio por trás de seus olhos. Algo dentro de mim, gritava que Hugo, escondia algo de podre, que toda aquela sua simpatia, não passava de uma máscara, ludibriando as pessoas humildes. Em todos esses anos, ele se transformou numa espécie de Deus.

— Só pare e pense, filha.

Ouço minha mãe se afastar, solto um suspiro quando ouço a porta se fechar.
Tudo que eu sonhava, era em embarcar nos meus sonhos. Eu estudei tanto, para me formar, sabia que poderia dar aula para muitas crianças carentes. Eu tinha planos, os quais, não revelei a minha mãe. Eu havia me inscrito num programa, uma espécie de intercâmbio, se tudo desse certo, eu embarcaria, ficando uns dois anos fora. Eu sabia que minha mãe, Helena, teria meu irmão Pedro, que, havia ingressado no Batalhão de Polícia, onde meu pai servirá por anos. Pedro, era decidido, mesmo com as lamúrias de nossa mãe, temendo que seu destino fosse o mesmo que do nosso pai, mas Pedro estava decidido, tinha um objetivo na vida, isso me causava arrepios, me tirando o sono. Ele investiga a fundo, mesmo sem permissão, tentando desvendar, o que aconteceu no dia da morte de nosso pai.
Me jogo na cama, olhando para o teto danificado pelo tempo. Não éramos ricos, e mesmo com o trabalho do meu irmão, somado com o meu, não sobrava tanto dinheiro para manutenção. Minha mãe Helena, tentava complementar a renda, fazendo seus salgados e doces por encomenda, mesmo assim, sabemos como as coisas estão cada vez mais impossíveis. Olhei para minha pequena estante de livros, passei os olhos parando num exemplar de Romeu e Julieta, eu já havia lido tanto, decorado algumas passagens, suspirando com a intensidade daquele amor, tão intenso, porém trágico. Eu me perguntava, o que teria acontecido, se Romeu tivesse prestado atenção em Julieta, por um segundo, enquanto discursava, uma despedida carregada de drama, desespero, balanço minha cabeça.

Deus me livre!
Nunca quero amar alguém assim, estúpido é o amor.

*******

Atualmente...

Ergui meus olhos, me deparando com um, cara, seus olhos estão fixos em mim, sua testa franzida. Eu deveria me levantar e sair correndo, então percebo que aquele rosto, era o mesmo que me encarava no bar. Seus olhos carregados de mistérios, me atraiam como uma espécie de magnetismo, nunca havia experimentado uma sensação como aquela e agora, ele estava aqui, parado me olhando. Eu podia jurar que ele é um Deus, um daqueles da mitologia Grega. Seus cabelos negros, estavam com algumas mechas sobre a testa, conforme a brisa soprava, seus lábios, simetricamente perfeitos, havia um pequeno furo no queixo, aposto que seus olhos, tem um tom que lembra algo feito por Deus, o mar, talvez uma vegetação imensa, eu não conseguia definir, já que a única luz, era da imensa lua.

— Hmmm, sorry!

Claro, um sotaque britânico vazou de seus lábios, para minha sorte, sou formada em línguas, ou não teria conseguido esse intercâmbio, um ano atrás. Ele retirou um papel amassado do bolso, entendeu na minha direção, quando meus olhos se prenderam no papel, fechei meus olhos, sentindo um tremor.

— Encontrei no bar...

Ele dizia, pausadamente, prestando atenção, se eu conseguia, entende-lo.

— Você me entende?

Ele parece aflito, resolvo acabar com o "suspense".

— Sim, eu o entendo.

Seu lábio se curva, isso, o deixa mais lindo.

— Meu nome é Drake.

Limpo meu rosto, ele se acomoda, sentando ao meu lado. A primeira regra, seria, corra quando um estrangeiro se aproximar de você, eu, no entanto, estava ali, paralisada.

— Você não disse o seu nome.

— Eu sei disso.

Ele esboça um sorriso se divertindo.

— Mas vi no bilhete, Emanuelle, certo?

Suspirei internamente ao som de meu nome em seus lábios.

O quê?
Que merda é essa de suspirar?

— Não falo com estranhos.

— Já lhe disse meu nome.

— Um nome não quer dizer nada, você poderia se chamar Margarida, mesmo assim, não saberia se é uma flor, ou a vizinha fofoqueira.

Ele arqueia a sobrancelha confuso.

— Mar...ga...ri...da!

Confesso, foi fofo.

— Brasil, você é de lá?

— Sim, sou do Brasil.

Ele esboça um sorriso, até o nome do meu país era atraente em seus lábios.

— Gosto desse sotaque...

Eu deveria dizer que o dele, era quase como um cântico sedutor.

Balanço meus pensamentos, o que havia comigo. Fiz menção de me levantar, mas ele age rapidamente, parando ao meu lado, com sua mão estendida.

Eu deveria recusar, mas em vez disso, aceitei sua gentileza.

Péssima ideia, ao tocar sua mão, senti uma descarga elétrica, percorrendo todo meu corpo.

— Emanuelle!

Oh! Droga!!

Porque ele tinha que dizer meu nome, aquilo soava tão erótico, eu havia me esquecido até, do meu dia de merda ao receber aquela carta.

*********

Algumas horas antes...

Minha mão tremia, enquanto meus olhos percorriam cada linha daquela carta. Eu sei, ridículo, quem conseguia enviar uma mensagem por bilhete, do outro lado do mundo. A resposta era óbvia, Hugo Valdez, eu sempre sentia seus olhos sobre mim, mesmo a distância. Era como se eu nunca houvesse me libertado, há qualquer momento, ele pressionaria ao seu modo sorrateiro.
Eu havia acabado de acordar, quando bateram na porta do meu quarto, um, cara, todo de preto e mal-encarado, estava parado, sem dizer nada, esticou a mão e me entregou o envelope, depois se virou e foi embora. Eu sabia que não era boa coisa, senti aquele velho calafrio percorrer minha coluna.
O pedaço de papel, estava carregado com o peso das palavras carregadas de ameaças.

Brasil...

Não preciso lhe dizer, de quem se trata, minha querida Emanuelle.

Apertei o papel com força, quase o rasgando.

"Você sabe, que não pode procrastinar, te quero, e você sabe que me pertence, tenho protegido sua mãe e seu irmão, mas você sabe, como as coisas podem, ficarem difíceis, então, volte"

Amassei o bilhete, deixando a raiva queimar em minhas veias. Como ninguém conseguia enxergar a verdadeira face daquele demônio, disfarçado de bem feitor.
Esfreguei meu rosto, tentando controlar a vontade de chorar, preciso fazer algo, se ficasse ali, cometeria uma insanidade. Decidi me recompor, tomei um banho longo, deixando que a água fria, aliviasse o meu sangue em ebulição.
Decidida, me arrumei e sai, queria beber algo, esquecer do que me perseguia, peguei o bilhete amassado e o carreguei comigo.

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Mister PrazerOnde histórias criam vida. Descubra agora