Naquela tarde, Will montou três quebra-cabeças. Achava que por Hazel ainda ser uma criança seus quebra-cabeças eram com pecinhas fáceis como os que ele tinha quando era criança. Seis peças grandes que quando unidas formavam a imagem do Ursinho pooh. Mas Hazel não era assim.
As peças eram um pouco menor do que o tamanho mediano, e ela levava a sério o quebra cabeça. Will era um mero espectador enquanto ela unia pecinhas e pedia sua opinião se uma parte fazia sentido com a outra. Ela estava montando um grande quebra-cabeça com a figura de um cenário da Princesa e o Sapo. Will ficara extremamente impressionado.
Nico, nesse meio tempo, estivera lendo um livro no sofá. Era um livro de mitologia, Will percebeu, com a grossura de dois dedos seus e ele usava o marcador cinza vez ou outra. Seus olhos escuros ficavam cem porcento focados nas páginas enquanto lia, Will podia dizer, de longe, que ele não estava mais ali. Na cabeça dele, provavelmente, estava lutando uma batalha épica, digna de um livro. A luz incidia nas suas costas, lançando uma sombra a frente e cobrindo o livro da iluminação que provavelmente iria ferir seus olhos.
A casa ficara em um quietude impressionante. Will nunca ficara em uma casa em que o silêncio durasse mais de um minuto, sempre haveria Lindsay para cantar com o eco do lugar, ou Jake para fazer um péssimo beatbox.
Quando já estavam no fim do segundo quebra cabeça, Nico pediu Will emprestado e o levou para a cozinha.
-Estamos te entediando? -ele perguntou, encostando-o na pia.
Will negou.
-Faz algum tempo que estou tentando ter paz para pensar, mas sempre existe muito barulho ao meu redor.
Nico sorriu, passando os braços ao redor da sua cintura.
-Se estiver cansado do quebra cabeça, pode me contar, não banque o forte.
Will se inclinou e mordeu o lábio inferior de Nico, que estava o perturbando desde cedo. Nico tinha o péssimo hábito de morder os lábios enquanto estava lendo, e isso os deixava vermelhos. Will ficara tão impressionado com a cena que, por quase cinco minutos, ele tentara encaixar metade da coroa da princesa Tiana com uma perna do sapo.
-Estou muito bem, não se preocupe.
Nico então pareceu se lembrar de alguma coisa.
-Você não ia conhecer a namorada do seu pai ontem?
Will fez uma expressão de desgosto.
-Meu dia com você valeu mais a pena. Falei com ele hoje de manhã e... acho que talvez hoje a noite eu a conheça.
-Você não quer conhecer ela?
-Não é que eu não queira. Eu sei que ela não vai ficar por muito tempo.
Nico balançou a cabeça, indicando que entendia. Ele se aproximou até encostar o lado do rosto no peito de Will, que não negou passar os braços ao redor dele ainda mais apertado. Não que Will quisesse que ele saísse dali, mas não era um comportamento muito comum da parte de Nico.
Com a cabeça encostada nele, Nico deu um suspiro longo. Will não conseguia ver seu rosto, apenas o topo de cabelos bagunçados.
-Você está bem?
-Hum.
Will não exigiu nenhuma resposta a mais, se Nico quisesse o dizer alguma coisa, ele diria quando tivesse oportunidade.
-Will! -chamou a vozinha melódica de Hazel vinda da sala. -Me ajuda com a o cenário escuro, eu não sei o que é o que.
-Estou indo. -ele respondeu por cima do ombro. Quando se voltou para Nico, ele beijou o topo da sua cabeça e afrouxou um pouco o abraço. -Precisamos de um programa só nosso.
Nico riu.
-Eu acho uma ótima ideia.
-Quer ir para a praia hoje a noite?
Nico não titubeou em concordar.
-Depois do jantar com o seu pai? -Nico perguntou.
Will suspirou, nem se lembrava desse evento, mas era um bom álibi para sua mãe.
-Sim. Vou de lá direto para a praia, te mando mensagem quando eu sair do apartamento.
Nico assentiu. Ergueu-se nas pontas dos pés e pressionou os lábios nos de Will.
-Agora, vá ajudar a Princesa Tiana, ela tem um cenário inacabado.
Will riu, devolvendo o beijo e soltando-o do aperto. Seus olhos vasculharam o rosto de Nico por mais um instante, para ter certeza que ele estava bem, e então seguiu para a sala.***
-Will! -disse Apolo, animadamente, quando viu o filho passar do limiar da porta.
Apolo estava em seu melhor traje casual, camiseta e bermudas que exalavam qualidade e dinheiro, assim como a colônia que incensava o ambiente. Will suspeitava que se ligasse um fósforo, tudo iria pelos ares.
Apolo estava parado em frente a tv, mas quando viu o filho, largou o controle e foi até ele, recebendo-o com um abraço. Will retribuiu da melhor maneira possível, mas quando tentou se afastar, Apolo o segurou por uns segundos. Tempo suficiente para que sussurrasse.
-Seja bonzinho, certo? Ela é uma pessoa boa.
Deu dois tapinhas nas costas de Will e se afastou subitamente, de repente interessado na sua antiga atividade de passar os canais da televisão.
Will segurou os olhos para que não revirassem. Quantas vezes ele não havia visto uma namorada do pai? Por que seria diferente de qualquer modo?
Will respirou fundo, e se direcionou para a cozinha, esperando encontrar Dylan ou Lee. De preferência Dylan. Ele era mais simpático. Mas invés da figura um tanto quadrada do irmão ou do cunhado, Will se deparou com uma silhueta cheia de curvas na beira do fogão. Os cabelos loiros estavam impecáveis e brilhosos, caindo até a cintura, roçando o laço do avental.
Will limpou a garganta, entrando na cozinha. A figura no fogão mexeu a cabeça para um lado e para o outro, tentando ver sobre o ombro, os cabelos loiros acompanhando o movimento graciosamente.
-Oh, Apolo? -perguntou a mulher, ela deu um passinho para trás e então sua visão alcançou onde Will estava. -Nossa, você parece muito com o seu pai.
Will riu, educadamente.
A mulher limpou as mãos no avental e estendeu uma mão para ele. Olhando-a de frente, a mulher parecia ter uns trinta anos, olhos joviais apesar das rugas que começavam a aparecer no canto dos seus olhos, e ela tinha um sorriso largo cativante. Will apertou sua mão.
-Meu nome é Sara, e espero que goste macarronada. É o único prato que sei cozinhar. -ela disse, com simpatia exalando dos seus poros.
-Sou Will. E acho que não tenho nenhum problema quanto a macarrão.
Sara deu um suspiro dramático de alívio e voltou ao fogão rindo.
-Está quase pronta, estou só acabando o molho.
-Não se preocupe, estou atrás do Lee.
Ela pegou uma colher de madeira e começou a mexer o molho vagarosamente.
-O quarto dele é o último do lado esquerdo. Acho que ele está lá. -ela se virou rapidamente, como se lembrasse de algo. -E bata na porta. Apolo esqueceu de fazer isso e foi uma cena bem constrangedora.
Will não queria imaginar o que o pai deveria ter visto, mas estava feliz de ter recebido esse aviso. Não queria ser o próximo a receber um guia sexual visual de Lee Fletcher.
-Obrigado. -Will disse com sinceridade, antes de voltar para o corredor.
Antes de bater na porta, Will encostou o ouvido na madeira, ouvindo apenas o silêncio. Achando seguro, deu uma batidinhas. Lá de dentro veio o som abafado de sapatos que ecoavam a preguiça da pessoa que vinha abrir a porta.
-Sim? -perguntou Lee, abrindo a porta e se deparando com Will. -Não pedi nenhuma entrega de irmãos por correio, pode devolver.
Lee fez menção de fechar a porta, mas Will se esgueirou para dentro, passando rapidamente pela abertura.
-Wow.
O quarto de Lee devia ter duas vezes o tamanho do seu no apartamento da mãe, com direito a guarda roupa de madeira, varanda de porta dupla e uma bela parede para televisão que só dívida com uma porta para o banheiro. Do lado oposto dessa parede ficava a cama em cima de um estrado planejado com dois degraus até a cama.
-Você é algum tipo de príncipe? -Will perguntou, batendo numa bolinha de luz que caia do teto.
-Não bata nisso, passei um ano colando.
Will rodou pelo quarto do irmão, acenando para Dylan que estava sentado na cama, lendo.
-Por que você tem um quarto assim e eu não?
-Porque eu sou mais velho. -Lee respondeu, como se fosse óbvio, voltando ao que Will suspeitava ser o que ele fazia antes, deitar ao lado de Dylan e ficar parado. -O que você faz aqui?
-Esqueceu que hoje é o meu dia de conhecer a Sara.
-Ah, vocês já se conheceram?
-Sim. Ela é bastante simpática.
-Sim, ela é. -disse Lee com uma risada que ergueu suspeitas em Will.
-Qual o problema?
-Nenhum.
Dylan, vendo que seu livro já estava arruinado, o fechou e deixou em cima das suas pernas.
-Lee está rindo porque ela é mãe de uma ex-namorada sua. -Dylan disse, com simplicidade.
Lee se sentou, irritado.
-Por que você não me deixa irritar ele?!
Will olhou de Dylan para Lee, a surpresa se espalhando pelo seu rosto. Ele trouxe a imagem do rosto de Sara de volta a sua mente, tentando reconhecê-la. Will não se lembrava de ter chegado ao ponto de conhecer a família de ninguém com quem tinha tido um relacionamento. Nem o mais longo havia conseguido gerar esse feito. Mas pensando bem... o rosto de Sara o lembrava alguém. Sara. Sara... S... Sophie?!
-Sophie?! -Will repetiu a pergunta em voz alta. -Ela... Ela deu em cima de mim uns dias atrás, quando ela me atropelou.
Lee deu de ombros e pegou o livro que estava sobre as pernas de Dylan, analisando a capa.
-A vida é engraçada.
-E desde quando os pais dela se separaram?
-Essas são informações que não temos.
Mas fazia sentido, Will pensou, Sophie odiava o verão... ou era o que ele pensava. Talvez o problema no fim da contas fosse o pai dela que não gostasse do verão. E saber disso endossava ainda mais a sua conclusão de que ela nunca teria ido até ali para tentar uma mínima chance para que reatassem. Isso também colocava por água abaixo a teoria de que ela estava ali para se aproximar de Lindsay e ganhar seguidores.
-Sara é mãe de Sophie? -Will riu, ainda incrédulo.
Lee o observava da cama, os olhos azuis escrutinando o rosto do irmão mais novo. Will tinha uma certa tensão nos ombros, assim como seus olhos não passavam muito tempo parados. A notícia podia ter o deixado agitado, mas Lee suspeitava que isso seria o suficiente para deixar seu irmão, normalmente tão calmo, agitado daquela forma.
-Achei que você viria mais tarde. -disse Lee. -Falei com a Lindsay e soube que você ficou com o Nico a tarde toda, logicamente, pensei que você só fosse colocar o pé aqui quando fosse sua última opção.
Will parou de andar na frente da janela. As mãos cruzadas nas costas enquanto ele olhava as piscinas lá embaixo.
-Na verdade, eu passei a tarde fazendo quebra cabeças com a Hazel.
-Hum. Programa familiar.
-Eu tinha prometido antes, então... fui lá cumprir. Mas minha participação foi mínima. Não sabia que quebra-cabeças ainda estavam em alta.
-Não estão. -comentou Lee.
-É. Acho que não.
O quarto ficou em silêncio por um instante.
-E o Nico? -Lee perguntou.
Ainda sem se virar, Will suspirou.
-Ele estava estranho hoje.
-Não se ofenda. Mas defina estranho.
Will escutou um som abafado e um "ugh" que o confirmou que Dylan devia ter dado um tapa em Lee.
-Eu disse "não se ofenda"! -Lee ralhou. -Não é que ele seja muito estranho. É só que... ele tem uma... energia... um pouco negativa.
-Não sabia que você acreditava em energia. -Will disse, rindo do irmão. -Mas é, ele é mais na dele.
-Sim, mas você ainda não disse como ele estava estranho. O que você fez? Essa é a pergunta certa.
-Eu não fiz nada.
Will se virou, indignado pelo tom acusador de Lee.
Lee estreitou os olhos para ele, então riu.
-Nós sempre fazemos alguma coisa, Will. Não seja tão inexperiente.
Ao lado dele, Dylan balançava a cabeça positivamente.
-Fazemos alguma coisa, mesmo sem perceber. -Dylan endossou.
Will parou, pensando nas coisas dos últimos dias. O próprio Nico dissera no carro que não estava com raiva por causa de Thomas. Talvez fosse porque Will não ficara com ele durante o passeio ao deserto, mas ele não parecia bravo com ele antes de Thomas se meter.
-Estou vendo fumacinha saindo das suas orelhas. -Lee cantarolou. -É mais fácil perguntar a ele do que ficar pensando.
-Não consigo pensar em nada, na verdade.
-Então talvez o problema não seja nem com você. -disse Dylan, oferecendo a gentileza que Lee não se esforçava em demonstrar. -Quando for ver, ele só estava com sono.
Lee riu.
-Não, querido, essa é a desculpa que você usa para não brigar comigo. -Lee se sentou como se tivesse tido uma ideia incrível. -Talvez ele quisesse brigar com você.
Will juntou as sobrancelhas, em dúvida se o irmão estava ficando louco.
-Lee, ninguém fica triste por não brigar.
-Eu fico. O Dylan normalmente não quer brigar comigo. Não é? -ele virou um olhar inquisidor para Dylan, que não via opção a não ser assentir. -Viu?
-Não acho que o Nico seja como você. Ele tem uma personalidade mais maleável apesar de não parecer.
Lee revirou os olhos e voltou a se recostar nos travesseiros. Enquanto isso, alguém bateu na porta.
-Pode entrar. -Lee respondeu.
A porta foi aberta minimamente, e a cabeça de Sara apareceu na fresta. Ela sorriu amigavelmente, parecendo tanto com Sophie que Will começava a se achar burro por não ter percebido.
-O macarrão está pronto. Seu pai já colocou a mesa.
Will ergueu as sobrancelhas. Algo dentro de si dizia que algo estava errado. Ou talvez não fosse que algo estivesse errado... talvez estivesse certo demais.
-Já estamos indo. -disse Lee, erguendo-se da cama e passando as mãos na camisa amassada. Sara, por sua vez, balançou a cabeça e saiu, fechando a porta. -Se eu fosse você, -ele disse para Will. -Conversaria com o Nico. As vezes uma briga basta para aliviar o coração.
-Tenho certeza que ele não está procurando por briga.
Lee bufou, olhando-o indignado.
-Qual é a de vocês pessoas pacíficas? Se não for brigando, como vocês aliviam a raiva?
Dylan, que havia levantando e estava checando o celular na cabeceira da cama, desviou sua atenção para o noivo por um instante.
-Nós pensamos antes de agir.
-E isso alivia a raiva?
-Não muito, mas a conversa alivia depois.
Lee fez uma expressão de desgosto, como se uma conversa nunca seria o suficiente para resolver seus problemas. Ele se virou para Will e estreitou os olhos.
-Mas você não é uma pessoa muito pacífica. Papai ainda está com uma mancha na bochecha. Você não vai conseguir ver pela quantidade absurda de base que ele usa no rosto, mas ainda está lá.
Will deu de ombros enquanto se direcionava a porta.
-Algumas pessoas fazem por merecer.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Summer Strange Love - Solangelo
Fanfiction"Conhece-te a ti mesmo" - Tempo de Apolo O amor de verão é uma coisa clássica. E que todos, se não quiseram, já tiveram. E na maioria das vezes tudo se passa em um sonho na nossa cabeça. Mas e se um menino realmente se apaixonasse por outro duran...