Summer Strange Love - Solangelo

Confusão

  No dia seguinte, pela manhã, Will foi acordado pelo som de Lindsay pulando pelo quarto, enquanto cantava "Fabulous" de High School Musical, oque era suficiente para tirar qualquer um do sono.
  Vagarosamente ele se levantou, confuso. Assim que teve certeza que ele estava acordado, Lindsay correu para a sala, deixando-o atordoado no meio do quarto. Will olhou ao redor em busca de um relógio, mas só pelo brilho excessivo do sol já era notável que a manhã avançava.
Ele alcançou o celular no criado mudo. O relógio marcava nove horas. Com um gemido, ele largou o celular na cama e coçou o rosto. Poderia dormir por mais duas horas sem problemas.
  Will cambaleou até a sala, com o sono ainda ardendo no fundo dos olhos, e encontrou Silena e Charles em um beijo apaixonado no sofá. Eles dois eram um casal adorável, o favorito da sua mãe entre seus amigos. Silena tinha toda uma postura e beleza impecáveis, ganhando corações por onde quer que fosse com os cabelos escuros e olhos azuis, uma combinação que chamava atenção em qualquer lugar, tendo concorrido inúmeras vezes em concursos de beleza, além de ter ganhado consecutivamente como presidente de turma nos últimos anos do ensino médio em que estudaram juntos. Charles era o completo oposto de Silena, tirando pelo bom coração dos dois, enquanto ela era reconhecida por ser comunicativa e ter o corpo de uma Barbie, Charles era um grandalhão tímido, que ficara anos apaixonado por Silena, mas sem ter nenhuma iniciativa. Will quem "acidentalmente" havia deixado escapar para Silena sobre a paixão do seu amigo.
Will se encostou despretensiosamente na parede, e limpou a garganta para chamar atenção.
  -Achei que já havia informado onde fica o motel mais próximo. -disse Will, sorrindo maliciosamente.
O casal o fulminou com o olhar. Silena revirou os olhos, enquanto a melhor reação de Charles foi atira-lo uma almofada. Antes que tivesse reflexo para escapar, o travesseiro acertou seu peito e ele foi rindo para a cozinha.
  -Bom dia. -disse a Lindsay, que lhe empurrava uma caneca de café e um sanduíche de queijo e presunto.
-Qual a pressa? Achei que estivéssemos de férias. -disse Will, sentando em uma banqueta.
  -Você vai ser meu fotógrafo hoje. -ela disse, sorrindo para convencê-lo. -Preciso de fotos novas e de conteúdo. Estou pensando em gravar um vlog, o que acha?
  Will tomou o café amargo de Lindsay e controlou os músculos do rosto para não fazer uma careta. Sabia que sua prima estava fazendo o seu melhor.
  -Parece ser uma opção ótima para quem está sem ideias. -comentou, mordendo o sanduíche.
  -Sabia que acharia isso. -ela disse, se encostando na bancada da cozinha, enquanto olhava pensativa para a janelinha sobre a pia. -E você?
  -Eu?
  -Como você está?
  Will engoliu com dificuldade, subitamente sentindo a garganta seca.
  -Eu... estou ótimo.
  -Mesmo?
  Ele deu uma risadinha. Não estava ótimo, mas por que sairia por aí dizendo que estava mal? Estar ótimo era o seu objetivo. Will usava e abusava da teoria que dizia: quanto mais a mentira é repetida, mais ela se torna verdade.
  -Tão bem quanto preciso estar. -ele disse, ocupando a boca com o sanduíche.
  Lindsay assentiu devagar.
  -Vou preparar o que preciso para as fotos. -ela passou por ele e bagunçou seus cabelos.
  Will apenas acompanhou a prima sumir na entrada do corredor. Sentia-se bem sabendo que tinha uma ocupação no dia. Ser o fotógrafo de Lindsay era um dos seus hobbies, e uma das coisas que mais se divertiam fazendo. As fotos tiradas em horas erradas depois viravam matéria de risadas histéricas.
  Vinte minutos depois, todos estavam prontos pra descer. Lindsay ia à frente, gravando com uma câmera de mão, ela dizia alguma coisa sobre férias e Califórnia, mas Will não ouvia. Estava indo mais atrás, com uma câmera pendurada no pescoço, esperando que ela o chamasse. Ao seu lado iam Katie e Jake, que estavam no caminho para ter algo a mais. Will sentia no ar.
  Chegando lá embaixo eles andaram em encontro à irmã da Silena, Piper, que estava com o namorado, encostados na parede de outro prédio de apartamentos mais a frente. A intenção era um dia inteiro de piscina, mesmo sabendo que nem todos aguentariam. Então, assim que chegaram lá, jogaram suas coisas em uma das espreguiçadeiras e pularam logo na piscina para fugir do sol escaldante.
  Will mergulhou profundamente, sentindo o choque da água por todo o corpo, resfriando oque o sol havia esquentado. Quando emergiu, sentia-se tão bem que quase não acreditava que havia dormido tão mal. Para sua felicidade, ninguém mencionara seu comportamento estranho da noite anterior. Aparentemente havia passado batido, ou haviam tirado uma conclusão qualquer. Mas Will não se importava, qualquer coisa seria melhor do que a verdade.
  Enquanto todos estavam muito entretidos em uma fofoca que Lindsay contava sobre o mundo do YouTube, montada nas costas de Will, uma figura se aproximou pela borda da piscina e se sentou na cadeira do lado da que estavam suas coisas. Will sentiu as mãos de Lindsay apertarem seus ombros, enquanto sua voz brevemente se distraiu da fofoca. Ele a beliscou por baixo da água, e ela voltou com o mesmo tom entusiasmado a contar a história.
  Qual era o seu problema? Will se perguntou. Não conseguia lidar com a presença de uma pessoa? E oque aquele rapaz poderia causar nele? Faziam tantos anos que provavelmente toda aquela reação exagerada fosse apenas um reflexo tolo. Nunca precisara ficar ansioso dessa forma por causa de ninguém. Em alguns segundos ele tentou se convencer que o garoto na espreguiçadeira era um mero lembrete do seu passado que decidira por espontânea vontade deixar para trás para o bem... de si mesmo. Da sua família.
  Então se desafiou a uma olhada. E lá estava ele. De fato ele não era exatamente como ele se lembrava. Na verdade Will lembrava da sensação de vê-lo, não do seu rosto. Lembrava do cabelo preto, e da forma como ele achara peculiar ele ser tão branco em uma cidade tão bronzeada. Aparentemente, nesses aspectos ele não havia mudado muito. Só que agora não era mais um menino, Will suspeitava que ele fosse dois ou três anos mais velho que ele. Apesar de não haver nenhum resquício de barba no seu rosto, ele definitivamente parecia mais maduro. Talvez fosse a linha do maxilar, ou a expressão séria mesmo quando estava falando com seus amigos. Ele estava com uma camiseta preta, óculos escuros que não permitiam ninguém saber para onde ele olhava, uma bermuda de praia amarela e chinelos. Will tentou se convencer que nada no rapaz era extraordinário, muito menos atrativo. Era um rapaz comum. Nada demais.
  Nada demais.
  Nadinha.
  Will sentiu Lindsay desprender das suas costas. Ela continuava a contar a história e todos estavam imersos. Menos Will. Tinha tanta ideia do que ela falava quanto tinha do que o casal de desconhecidos mais na ponta falavam. Will desviou o olhar para o outro lado da piscina, onde uma menina o olhava, ela sorria pra ele e ele se permitiu retribuir. Era mais confortável ser distraído por uma garota que nunca vira do que ficar perto dos seus amigos naquele momento. Ele se sentia desconfortável ali, todo mundo conversando e ele totalmente fora do assunto porque não conseguia prestar atenção, além do rapaz sentado na espreguiçadeira, imitando ironicamente a vez que Will o vira pela primeira vez.
  Will não perdeu tempo. Aproveitou a deixa da menina desconhecida e se desprendeu do seu grupo em busca de socorro em uma conversa aleatória e de falas repetitivas. Na arte de flertar tão bem aperfeiçoada nas praia de Miami. Tão repetitivas. Cansativas. Ilusórias.
  Quando já marcava onze horas no relógio, a fome atacou à todos, e eles se viram obrigados a pausar os planos para saírem da piscina e se secarem, já que não podiam entrar no restaurante molhados ou com roupas de banho. Will havia pegado o número da garota, mesmo sabendo que não a ligaria,  nem ela o ligaria, pois haviam descoberto na conversa que não tinham nada em comum, mas haviam trocado números mesmo assim, por educação.
  Esperando ficar seca por completo, Lindsay se sentou do lado de Will na espreguiçadeira sob o guarda sol, fazendo-o sentar mais na ponta. E então o mundo ficou de cabeça para baixo por alguns instantes. Antes que se desse conta, Will estava caído no chão, e ao seu lado uma bola verde imitando uma melancia girava preguiçosamente. Ele levou um instante para entender oque havia acontecido, para então voltar a se sentar com a bola melancia em mãos. Ele esfregou o rosto, parecia que sua bochecha toda ardia. Will esperou os outros terminarem seus ataques de riso, sem conseguir rir por ainda estar atordoado.
  Do entrada para a área de piscina uma menininha apareceu, ela parecia com vergonha, tinha os olhos âmbar e cabelos castanhos escuros, sua pele era da cor de chocolate. E ela parecia ter sido obrigada a ir lá pelo homem que parecia ser o pai na entrada a esperando. Ela olhava para o chão e tinha as mãos pra trás.
  -Desculpa, foi sem querer. -ela disse, timidamente.
  -Tudo bem. -disse Will entregando a bola verde a ela. A garotinha se virou para voltar, mas então surpreendentemente parou em frente ao menino de cabelos escuros.
  -Mais cuidado quando jogar isso. -ele disse, mas um sorrisinho brincava no canto da sua boca, e Will não sabia se ele estava brincando ou ameaçando a garotinha.
  Antes que ele pudesse abrir a boca para defendê-la, ela soltou uma risadinha.
  -Desculpa, Nico. Papai é muito ruim brincando de bola.
  Papai? A mente de Will se voltou para o homem na entrada, que sem dúvida lembrava o rapaz sentado na cadeira, mas não lembrava nada a menina.
  -Diga a ele que tem uma área de vôlei de crianças pra lá. -ele indicou o lado de esportes do clube.
  Will ouviu com cuidado. Não porque queria saber onde era a área de crianças, mas porque nunca tinha ouvido a voz dele antes. E era tão...
  Will respirou fundo.
  Não era nada.
  -Vou dizer. -disse a menininha, e então saiu correndo de volta.
  -Sua irmã é um amor. -comentou Silena, olhando apaixonada para onde a menina tinha sumido. -Quantos anos ela tem?
  -Cinco. -Nico respondeu, e seu rosto não conseguia negar que ele a amava muito.
  Nico, pensou Will, também havia descoberto o nome dele.
  -Ela quase quebrou meus dentes. -disse Will, massageando a bochecha.
  Jake ainda ria em intervalos quando lembrava da bolada. Katie tentava repreendê-lo. E Will estava começando a achar cômico também.
  -Ela insiste em fazer meu pai brincar com ela, mas ele é péssimo nisso. -disse Nico, e se virou para Will, assustando-o. -Me desculpe por ela. -e então sorriu.
  Não sorriu. Não chegou a mostrar os dentes, mas seus lábios se esticaram o suficiente para dizer a Will que ele estava perdido.
  -Sem problema. -Will conseguiu responder, se distraindo vestindo a camisa.
  -Bem, -Lindsay disse alto, batendo palmas. -Acho que já podemos ir almoçar.