Karma

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Os meus sentidos devem ter se desligado por alguns segundos para preservar a minha vida. Só isso explicaria a minha falta de memória repentina do momento em que eu processei a imagem à minha frente para o que eu estava fazendo logo em seguida. Não tive tempo para ouvir nenhuma explicação, não sabia se alguém tinha me pedido espaço para conversar. A única coisa que eu queria era trazer a verdadeira morte para quem já deveria ter partido dessa terra há muito tempo.

Harvey andava rendido em minha direção com as mãos para o alto feito um criminoso pego no flagra. Eu dei um passo para cima das escadas tentando ir para trás de minha mãe como se precisasse de sua proteção, mas na verdade estava me resguardando de exibir uma reação explosiva e que seria inevitável a qualquer momento. Cat ainda estava encolhida na porta sem coragem de entrar totalmente na casa.

- Blair... - ele me chamou novamente, agora com cautela. - Eu preciso que vocês nos escutem.

- Por que estão aqui, Harvey? - minha mãe perguntou por mim sem nenhum traço de desconfiança na voz, apenas impaciência.

- Todos nós precisamos conversar depois de hoje - o vampiro continuou falando num ritmo calmo e com a voz baixa que normalmente não usaria, não fosse o ambiente desfavorável para a sua presença.

Eu balancei o rosto negativamente. Meus olhos ainda não conseguiam acreditar.

- Somos uma piada para vocês dois? - Paul saiu do outro lado da sala e passou por Harvey num rompante de raiva muito similar ao que eu faria se não conseguisse me conter. - Vocês já deixaram bem claro de que lado estão, e não é do nosso.

- Isso não é verdade - Cat se apressou em negar do outro lado da sala, apreensiva. - Por isso temos todos que nos explicar.

- Explicar o que? - gritou Sam, para a minha surpresa tão indignado quanto qualquer um.

Era evidente como ambos os vampiros se sentiram acuados ao perceberem o ambiente hostil. Todos os lobisomens da alcateia estavam ali, além dos membros do conselho e eu. Harvey e Cat estavam fisicamente em desvantagem para qualquer coisa que quisessem fazer ou dizer, isso se alguém quisesse escutar.

- Blair - Harvey tentou ultrapassar Jake que se pôs em seu caminho para me alcançar. - Eu tive que fazer aquilo para que ele acreditasse em mim.

- Ele teve que fazer o que? - minha mãe se virou ao meu lado com uma feição de dúvida em seu rosto.

Eu gelei por dentro. Meus pais não sabiam que Caleb era o responsável por me sequestrar, então Harvey já havia estragado todo o meu trabalho para protegê-los de uma parte da verdade cruel.

Não consegui respondê-la; minha boca estava seca e estática na mesma expressão há vários minutos.

- Ele tinha que acreditar que eu não comprei a sua história - Harvey continuou suplicante. - Com o poder de controle mental que ele demonstrou todos esses anos que nem eu consegui mensurar, seria praticamente impossível enganá-lo se eu não tivesse pelo menos algumas memórias de você se decepcionando comigo!

Foi nessa hora que o meu espírito deve ter deixado o meu corpo, quando o suposto plano de Harvey começara a fazer sentido através de sua explicação ridícula.

Quase dois meses antes, no dia seguinte ao meu aniversário, ele me tirara o crédito dizendo que eu havia inventado tudo sobre Caleb. Eu oferecera todas as minhas lembranças, tão vívidas e impregnadas de medo e choque, para que ele visse que todas eram verdade, mas ele se recusou - aparentemente. Na frente de Jacob e Eric eu fui chamada daquilo que sempre fui, de manipuladora, de mentirosa e ardilosa. Nada que fugisse ao meu personagem, portanto, era fácil demais encaixar naquela narrativa.

Wolf Like MeOnde histórias criam vida. Descubra agora