15 - Falhas

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Depois que os soldados voltaram ao helicóptero eu continuei sozinha no último banco. Eu não tinha coragem o suficiente para olhar para eles. Já estávamos longe da nevasca, então tirei o cinto de segurança e sentei na horizontal ocupando os dois bancos. Um tempo depois Mia aproximou-se e sentou do outro lado, de frente para mim. Ela não iniciou nenhum tipo de assunto a princípio. Só ficou ali me fazendo companhia.

Após algum tempo, desisti de esperar uma resposta e apenas encostei minha cabeça no banco e fechei os olhos.

Eu repassava a cena inteira na minha cabeça, de novo e de novo. Odiando o Matthew e me odiando mais ainda. Talvez eu devesse mesmo ter fugido com o Eric. Assim eu poderia cuidar dele da Yara e fazer algo de útil com a minha vida ao invés de estragar cada potencial plano da liga.

– Eu poderia ter salvado o soldado Joseph. – Mia começa a falar, de repente.

Abro os olhos para olhar pra ela que estava sentada numa posição igual a minha. A cena era quase filosófica.

– Eu estava com uma bomba de fumaça para emergência e outra arma no cinto. Depois que ele morreu pensei em varias maneiras que eu poderia tê-lo salvado se eu não tivesse entrado em desespero e agido por impulso. Mas na hora eu só conseguia pensar nele gritando para que eu o matasse antes que o policial o levasse.

Continuo observando-a enquanto ela entrelaçava as mãos e soltava um suspiro. Eu não saberia o que dizer mesmo se eu achasse que poderia ajudar.

– Eu não tive coragem de contar isso a ninguém... Nem mesmo ao Thomas. Achei que saber disso o faria mudar de ideia a meu respeito como segunda no comando. Afinal um líder não pode agir por impulso mesmo em uma situação de desespero. – Ela dá de ombros. – Mas então no dia em que sua mãe ligou dizendo que você estava na Imperial, que havia pegado a cópia dos documentos e entrado em um carro do governo, ele não pensou duas vezes quando decidiu ir te salvar. Mesmo quando eu disse que era uma péssima ideia e que era melhor criarmos um plano primeiro. – Ela dá um sorriso desacreditado – E então... Ele fez a coisa mais impulsiva que alguém como ele poderia fazer: Tomar o soro que usávamos para apagar a memória dos de fora que tinham visto demais.

Imagino o quão desesperado meu pai devia estar para tomar uma atitude drástica dessas. Mas concluo que no lugar dele, conhecendo a crueldade de Matthew há mais tempo como ele conhecia talvez eu tivesse feito o mesmo.

– Eu pirei. Óbvio! Ele não podia estar falando sério. E então ele parou, olhou para mim e disse: "Construir a liga foi o trabalho mais árduo e desgastante da minha vida". "Dediquei anos aqui para fazer o que eu achava que era o certo a ser feito e posso até ter salvado algumas pessoas em consequência disso... Mas eu não sou um herói. Porque se pra salvar quem eu amo eu tivesse que derrubar tudo isso, eu faria". – Mia balança a cabeça. – Eu não acreditei quando ele disse aquilo. Era a atitude mais burra que ele poderia ter naquele momento. Mas ele ainda completou dizendo "Eu sei que é burrice o que estou prestes a fazer... Mas é a minha família".

Ela faz uma pausa parecendo imergir em seus pensamentos por um instante.

– Bem, o resultado disso tudo você já sabe. – Ela dá um leve sorriso como se tentasse aliviar a tensão. – Mas a questão aqui é que depois de eu ter entrado em colapso porque eu teria que assumir a liga de ali para frente, eu entendi que ele não fez aquilo porque era um péssimo líder... Ele fez porque era humano. Porque era um pai e sua natureza é salvar seus filhos não importa o quão imprudente seja. – Eu não percebi que eu estava chorando até sentir um gosto salgado na boca. Limpo o rosto e volto a minha atenção a ela. – Com isso conclui que talvez eu também pudesse ter feito diferente. E talvez Joseph ainda estivesse aqui se eu tivesse pensado melhor... Mas eu não sou uma heroína. Sou humana, e às vezes eu erro e entro em desespero em horas erradas. – Ela diz com um olhar frustrado. – Aceitar que não podia ser uma super heroína, muito menos ser perfeita, não apagou o erro que eu cometi... Mas me libertou do peso da culpa.

Ela se achega para mais perto de mim.

– Você não vai acertar sempre, precisa entender isso antes de tudo. Mas precisa ter coragem o suficiente para conseguir seguir em frente, se perdoar e tentar de novo. – Ela coloca a mão no meu joelho. – Não foi você que colocou o seu pai na mira do Sanz... Ele escolheu ir. – Diz, olhando nos meus olhos. – Mas também não é culpa do Thomas que agora a liga esteja por um fio. Só precisamos parar de tentar achar um culpado e aceitar que apenas fomos humanos e fizemos o que fazemos de melhor... Errar.

Suspiro.

– Não quero que outra pessoa tenha que sofrer por um erro meu. – Murmuro.

– Apenas dê o seu melhor para que isso não aconteça. Se perdoe pelo passado e aprenda com ele... É a única forma de realmente deixá-lo para trás.

Aceno, concordando.

– Quando chegarmos você tem uma missão. – Ela se levanta pra ir. – Quero que assim que chegar, vá até o seu quarto... E descanse.

Faço uma careta e levanto uma das sobrancelhas.

– É uma ordem! – Ela fala, séria. – Temos muito trabalho a fazer e preciso dos meus soldados saudáveis.

Levo a mão à testa, prestando uma espécie de continência.

– Entendido chefe. – Digo com um sorriso amarelo e ela retribui. 

O RegressoOnde histórias criam vida. Descubra agora