42 - De volta à Dreva

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ELLE

No dia seguinte estávamos em um helicóptero indo buscar a Yara no condomínio de chalés em Dreva. Nós pousamos no fim da tarde em um descampado perto dali e seguimos de carro, Issacar, o motorista do avião, Tony e eu, até os chalés. Era uma cidade no interior, distante da confusão no centro. Um lugar calmo e tranquilo, onde ao passarmos podíamos ver crianças andando de bicicleta e brincando no meio da rua. Quando chegamos, vejo logo de cara um parquinho onde outras crianças se divertiam no pequeno espaço. Yara estava em um dos balanços e quando ela me vê, dá um salto e vem ao meu encontro.

– Elle! – Ela pula no meu colo para me abraçar.

– Oi minha linda. – A levanto do chão e a abraço forte sentindo o cheiro de frutas vermelhas do seu shampoo. – Senti tanta saudade!

– Eu também. – Ela diz. Em seguida olha para Tony atrás de mim. – Eric não gosta dele.

Viro-me para Tony, que sorri para Yara.

– Sabe como é... Ele é meio rabugento às vezes. – Diz Tony se explicando.

– Eu sei, ele nem gostava de muita gente. – Responde, virando-se para mim. – Eric disse que a gente não podia voltar para lá, porque tinha perigo. Disse que você viria para cá assim que pudesse. – Ela fica em pé no chão e tira o cabelo do olho. – Cadê ele?

Eu e Tony nos entreolhamos e ele me lança um olhar compassivo. Ajoelho-me diante dela para ficar no seu tamanho. Eu não queria ter que fazer aquilo. Não queria vê-la se sentir abandonada por alguém de novo. Eu mal sabia como iria consolá-la quando nem mesmo eu havia superado. Eu ainda pensava no momento em que eu segurava as suas mãos enquanto a vida saia do seu corpo. Depois de uma vida inteira de dor, aquilo não era justo. A guerra não era justa.

– Yara... – Eu tinha medo que ela sofresse. Era inevitável, era horrível. Eu só queria tirar toda a dor de cada perda que ela já tinha do coraçãozinho dela. – Ele não vai voltar.

...

À noite, eu estava na cama com Yara. Eu olhava para aqueles olhinhos fechados, e a respiração acelerada, e as bochechas já secas das lágrimas. Ao mesmo tempo em que me sentia impotente diante do fato de que eu não podia protegê-la da dor, eu admirava tamanha beleza. Cada traço do seu rosto era perfeito. Eu queria estar com ela para sempre, me certificando de que a casa amarela não seja mais apenas um sonho. "Eu prometo que vou cuidar dela, por nós dois." Penso, como se o dissesse a Eric.

Ouço um batuque na porta, Tony entra silenciosamente em seguida.

– Ela dormiu? – Pergunta sussurrando.

– Há cerca de meia hora atrás. – Digo com um aceno. Levanto-me e a cubro com um cobertor. Beijo sua testa e saio deixando a porta entreaberta. – Boa noite meu pequeno anjo.

Tony e eu ficamos no outro quarto do chalé, onde tinha outra cama de solteiro que dividíamos.

– Yara nasceu na ilha. Tudo o que ela conhece e sabe sobre o mundo é pela ótica da guerra e violência... – Tony tira uma mecha de cabelo dos meus olhos enquanto seus olhar atencioso acompanhava o movimento dos meus lábios, dando total atenção ao que eu dizia. – Quero que ela seja feliz, que possa brincar na rua sem medo de ser morta, que possa ter uma família sem medo de que alguém não volte mais.

– Nós vamos dar uma boa vida a ela. – Ele diz pegando a minha mão e entrelaçando os dedos dele com os meus. Sorrio diante da pronuncia da palavra "nós". – A única preocupação que ela vai ter serão os deveres de casa da escola.

– É isso é uma droga mesmo. – Nós rimos. – Mas me parece um futuro perfeito.

Ele sorri. Seus olhos encaravam os meus de forma avassaladora. Eu me sentia amada, desejada...

– Eu tenho que te contar uma coisa. – Ele diz.

– O que?

– Lembra que eu disse que eu estava treinando na arena de corrida?

– Sim. Foi quando o Matthew te sequestrou.

– Ah, droga eu não queria me lembrar disso. – Ele sacode a cabeça. – Bem, eu consegui um patrocinador... Na verdade são três. Vou assinar o contrato quando voltarmos para a Imperial.

– Tony isso é incrível! – Digo, sentando-me na cama.

– Calma, ainda tem mais. – Continua. – Os patrocinadores me adiantaram um valor em dinheiro... E eu comprei uma casa um pouco mais afastada do centro da Imperial. Era pra ser uma surpresa, mas acho que agora é uma boa hora pra contar. – Ele dá de ombros. – Fiz isso por que... Bem. Eu queria algo que deixasse nosso sonho de futuro uma coisa um pouco mais concreta. Uma prova visível de que eu pretendo passar o resto da minha vida com você, se você quiser. – Ele havia me deixado sem palavras. – Bem, e agora vem outra parte... – Ele se senta também. – Eu sei que no passado não fui a pessoa mais ousada do mundo. Sei que deixei muitas oportunidades de ficarmos juntos passar por que eu não fiz o que queria fazer de verdade na hora em que eu queria ter feito. – Ele se levanta. – Então decidi que não vou mais cometer esse erro.

Ele se ajoelha diante da cama.

– Pode chegar um pouquinho mais pra frente? – Ele pede. – A beira da cama está empatando a coisa toda.

Eu dou risada e chego pra frente, obedecendo-o.

– Ótimo. – Ele pigarreia. – Ellena Kirsten Volant, em toda a minha vida eu nunca amei alguém como eu amo você. Depois de passar por várias experiências de quase morte, eu decidi que não posso arriscar passar mais nenhum segundo dessa vida instável sem usufruir dela ao seu lado. Quero estar com você para sempre, para te amar, cuidar e proteger. – Ele pega aa minha mão. Seus olhos fixos nos meus. – Você aceita se casar comigo?

Tony estava com um tipo de pijama e meias, por causa da noite fria de Dreva. Eu igualmente de pijama e o cabelo amarrado. Não estávamos em um jantar à luz de velas ou no topo de um prédio alto. Éramos apenas nós dois, fazendo daquele lugar comum, e daquelas roupas comuns o momento mais incrível de nossas vidas. Não podia ser mais perfeito. A verdade de toda aquela simplicidade era nítida: Nós pertencíamos um ao outro.

– É claro que sim. – Sorrio. Ele sorri também. O sorriso mais alegre e radiante que eu já tinha visto em toda a minha vida.

Ele se levanta e me beija ansiosa e urgentemente. Suas mãos acariciam a minha cintura enquanto passo as mãos pelos seus cabelos desgrenhados e puxo-o para mim.

...

No dia seguinte pegamos o helicóptero de volta a Imperial.

– Pra onde vamos agora? – Pergunta Yara sentando-se no acento ao meu lado do carro.

– Para casa. – Digo, com um sorriso.

O RegressoOnde histórias criam vida. Descubra agora