Capítulo 23 - Julia

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Antes que minhas palavras fossem expelidas com dificuldade para fora, tudo o que pude pensar foi um mar assombroso de sangue no qual eu havia afogado todos em minha volta.

Dor.

Sofrimento.

Tudo culpa minha.

Minha culpa.

Minha tão grande e irrecusável culpa.

-Eu não chamei vocês aqui pra que arrumassem confusão uns contra os outros... Não quero brigas ou agressões.. . Isso precisa acabar, tudo tem que acabar... - eu pronunciei com uma voz incisiva, clara e segura o máximo que eu pude, o que naquela altura não era muito. Sentia meu coração pulsando tão rápido e constante, movimentando e circulando o sangue em minhas veias que parecia que estava a um passo de um ataque fulminante.

O calor do meu corpo trabalhando a mil por hora entretanto não era o suficiente para aquecer minha pele fina, pálida e frágil que havia praticamente congelado. Olhei para as palmas das minhas mãos e meus dedos estavam arroxeados e dormentes.

Meus pensamentos eram um mar revolto de dúvidas, incertezas e medos mas eu me agarrava ao último fio de energia que me mantivesse em pé para continuar com os meus planos. As minhas lágrimas não mais eram isoladas e marcantes, escorrendo pelo meu corpo junto com as gotas pesadas da tempestade.

Observei Tadeu se reerguer agitado com a ajuda providencial de Etan que lhe controlava com os dois braços formando uma espécie de armadura de ferro, e o ponto bem longe de Caique. Os olhos de meu amigo nerd estavam tomados por uma chama com núcleo laranja e pontas avermelhadas que lhe conferiam uma aparência cruel. Ele estava possuído pelo ódio e pela raiva.

E eu nunca o tinha visto daquela forma.

Assim como eu nunca tinha visto Ricardo acusar alguém com tanta veemência.

Gabriel se manteve impávido e ereto com um dedo indicador no canto da boca. Sua postura transmitiam segurança e clareza, com uma gota de sangue negro brotando de seu ferimento discreto na bochecha e respingando no concreto e manchando as poças transparentes de água. Ele não havia reagido de maneira tão descontrolada e irracional quanto era esperado da acusação que ele havia sido vítima.

E essa era a questão: Ele era uma vítima ou a acusação de Ricardo tinha seu fundamento?

Minha criança seria um fruto impuro de uma violência sexual?

Não sei... Foi o que pude pensar.

-Ju, este cara está completamente louco... É insano o que ele propõe! Não faz o menor sentido... Eu estava tão embriagado e bêbado quanto você naquela noite e não usamos proteção por descuido. Você sabe disso, essa é a verdade... Mas é o nosso filho, o nosso amor... Você crê nisso, não é?

Eu creio!

Duvidar da sinceridade em suas palavras implicava necessariamente em duvidar de seu amor? Obviamente que sim, conjecturei comigo mesma. Porque não é possível que uma pessoa, um ser humano, seja capaz de violentar de quaisquer formas uma pessoa que diz amar.

E se eu não duvidava do amor de Gabriel, porque ele já havia me dado provas de que era verdadeiro, também não duvidava que ele não faltava com a verdade comigo.

Ricardo estava absolutamente errado.

-Eu acredito em você, Gabriel! Não tens que se preocupar com isso... Ricardo só está estressado, um pouco...

-Não estou! Você está tão cega que não consegue ver um palmo a sua frente... Pare de ser tão estúpida Julia! - esbravejou Ricardo com a mesma expressão repuxada e tomada pela figura flamejante. Eu me afastei um pouco e vi ele despencar de joelhos em minha frente, quando eu me apavorei e me senti perturbada.

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