Mariana acompanhou Paulo até a lanchonete do outro lado da praça, onde se acomodaram em uma mesa bem ao fundo do lugar, que já estava repleto de jovens conversando animadamente.
Todos cumprimentaram o padre com acenos e sorrisos empolgados.
—Apesar de ser uma cidade pequena, é bem movimentado aqui, não?
Mariana constatou observando o lugar, que tinha várias mesinhas espalhadas pelo ambiente e na calçada a frente do estabelecimento, e estavam quase todas ocupadas.
—É sim, a cidade é pequena, mas temos muitas fazendas nos arredores, então os jovens vêm para estudar e costumam ficar até o final de semana.
Paulo explicou, acenando a mais um grupo de jovens que chegava ao lugar.
—E todos parecem gostar muito de você.
Ela disse sorrindo para Paulo, que lhe retribuiu.
—A maioria, são meus alunos do centro esportivo, temos um grupo de leitura e uma banda também, onde eles aprendem a tocar algum instrumento, e até cantar.
—Sério? Você também dá aula de canto Paulo?
Mariana perguntou contendo o sorriso. Paulo riu.
—Não, não. Infelizmente não tenho esse dom. Nem sou muito bom com os instrumentos também. Mas tenho alguns voluntários que me ajudam nessa tarefa de manter os jovens com as mentes e os corpos sãos e ocupados.
—É muito bonita essa sua preocupação com os jovens. É uma idade complicada, muitos acabam... se perdendo pelo caminho.
Paulo não pôde deixar de reparar no quão profunda foi aquela reflexão. Aos seus olhos, Mariana parecia uma jovem muito sofrida, ela havia comentado vagamente sobre a perda do irmão, porém ele acreditava que não era só isso.
Mas ainda era cedo para questioná-la, ele esperaria o momento certo, em que ela estivesse mais propensa a falar.
Enquanto Paulo a observava, Mariana olhava o movimento, o entra e sai de meninas e meninos. Mesas com casais, outras com grupos de amigos.
Em seus pensamentos, ela se lembrava de um tempo, onde ela era como eles, um tempo que não durou muito.
A garçonete, uma mocinha sorridente de uns dezesseis anos, se aproximou para pegar os pedidos. Porém, não antes de tomar a mão do padre e lhe pedir a benção.
—A sua benção padre!
—Deus te abençoe Sandrinha.
Parabéns pelo trabalho, a decoração da lanchonete ficou muito bonita.
Paulo disse se referindo as bandeirolas e luzes que enfeitavam a frente da lanchonete.
—Ah, não foi nada padre. O pessoal todo ajudou, e mamãe liberou o refri grátis hoje em agradecimento.
A jovem diz com um sorriso radiante dedicado a Paulo e Mariana.
—Sandrinha, essa é Mariana. Ela é nova na cidade.
—Ah! Seja bem vinda Mariana.
—Muito obrigada... Sandra?
Mariana perguntou um pouco tímida.
—É Sandrinha mesmo...
A jovem se aproximou de Mariana como quem lhe contasse um segredo.
—... Sandra é nome de velho.
Ela disse e fez uma careta engraçada que fez os dois rirem.
—Sandrinha! Deixa o padre em paz e vai servir as mesas menina!
—Já tô indo mãe, só estava cumprimentando a amiga do padre!
Sandrinha correu para entregar os pedidos que havia recolhido e entregou a mãe que acenou ao padre de trás do balcão onde estava.
—A Sandrinha joga futebol, temos um time feminino, que não é para me gabar não, mas, tem muito futuro.
—Eu imagino que sim. O que eu não imagino, é por que você decidiu ser padre. Qual a sua história Paulo?
Mariana perguntou prendendo seu olhar ao de Paulo, que lhe respondeu com um meio sorriso, como se pensasse em algo.
—Por que você acha que há uma história por trás da minha decisão? Nem sempre há, as vezes é só vocação, o desejo de servir a Deus, de levar a palavra e fazer o trabalho dele.
—Então não há uma história.
—Eu não disse que não havia.
—Então me conte.
Paulo pegou uma das mãos de Mariana que estava sobre a mesa, e a segurou entre as dele, fazendo com que ela prendesse o ar.
—Podemos fazer um acordo? Uma troca talvez. Eu lhe conto a minha história e você... me conta a sua.
Mariana afastou sua mão das dele, não muito confortável com a sugestão de Paulo. Sua história era algo que ela preferia esquecer.
Ela apoiou o rosto sobre os punhos, e suspirou com profundo pesar.
—Minha história iria deixá-lo deprimido.
Paulo balançou a cabeça em negativo.
—Eu escuto todo tipo de histórias Mariana, a sua não vai me abalar, acredite.
Sandrinha retornou trazendo o lanche que eles haviam escolhido no cardápio e logo se retirou, deixando-os a sós novamente.
—Bem, eu vou começar...
Paulo disse após beber um gole do seu suco.
—...Como eu lhe disse, não houve uma grande desilusão, nem uma terrível tragédia na minha vida, que me fez optar pelo sacerdócio. Eu sou filho único, fui criado em uma família muito católica, mas, ao contrário do que imaginei, eles não ficaram muito felizes quando contei a minha decisão de entrar para o seminário.
Então como pode ver, também não foi por influência familiar.
Paulo ri e morde um pedaço de seu sanduíche. Um gesto simples, porém fez com que Mariana ficasse completamente hipnotizada. Quando se deu conta disso, tratou de desviar o olhar, e comer o seu lanche.
—Então um dia você acordou, e decidiu... vou ser padre!
Paulo riu divertido com o questionamento de Mariana. Ele sabia que o fato de ser ainda jovem, criava curiosidade pelos motivos das sua escolhas, porém, era a primeira vez que alguém realmente fez a pergunta. Nem mesmo seus pais, nunca haviam lhe perguntado o porquê.
—O sacerdócio é um chamado, Mariana. Quando você o recebe, ou você aceita ou ignora. Eu o aceitei de coração, e tenho dedicado a minha vida a levar a palavra de Deus aos necessitados dela.
Eu iniciei a faculdade de educação física, que a princípio achei que fosse o que eu queria fazer, mas ao terminar, eu sentia que faltava algo, que eu podia fazer mais, e bem lá no fundo eu já sabia o que era. Então entrei para o seminário e descobri que eu realmente tinha uma vocação. Quando fiz os meus votos, fui designado para uma paróquia em Olímpia, mas não fiquei lá por muito tempo, eis me aqui desde então.
Os dois riram, e riram por mais algumas vezes no tempo que ficaram na lanchonete.
Paulo contou a Mariana sobre seu trabalho com os jovens desde quando estava em Olímpia, e de como ajudou aquela comunidade a tratar melhor das suas crianças. Paulo havia deixado alguns projetos por lá, que tiveram seguimento com os voluntários que o acompanhavam.
Os jovens pouco a pouco foram esvaziando o lugar, e só quando Sandrinha e a mãe começaram a recolher as mesas e as cadeiras, foi que Paulo e Mariana se deram conta de que já se fazia tarde.
Os dois se despediram da jovem e de sua mãe, e seguiram caminhando lado a lado, até a entrada da hospedaria, onde pararam.
—Bem Mariana, falamos sobre muitas coisas, e acabei me esquecendo do real motivo por eu tê-la convidado.
—E eu aqui, achando que era porque gostava da minha companhia.
Paulo riu um pouco sem jeito, havia sido pego de surpresa.
—Claro, isso também. Mas eu queria lhe dizer que, acho que consegui um emprego para você.
Mariana ficou sem palavras, no segundo que assimilou o que Paulo havia dito.
—Um... emprego? De verdade?
Ela perguntou ao mesmo tempo surpresa e animada.
—Sim sim. Tem um garotinho que está com muita dificuldade na escola, bom... você disse que era professora particular, então pensei que talvez você poderia ajudá-lo.
Mariana olhava para Paulo com os olhos marejados.
—Eu... nem sei como agradecer, eu...
—Ei, não precisa agradecer Mariana.
Paulo disse se aproximando e segurando o rosto dela entre as mãos.
—Na verdade acho que você foi enviada do céu, porque eu já não sabia mais o que fazer para convencer os pais do pequeno João, de que o menino não estava sendo atormentado por nenhum espírito maligno.
Mariana riu por entre as lágrimas. E em um impulso, ela o abraçou forte, deixando de lado o quanto aquilo era imprudente e inadequado.
—Obrigada.
Ela disse ainda abraçada a ele, com seu coração acelerado por estar tão perto que podia também ouvir as batidas do coração dele.
Foi Paulo quem se afastou primeiro. Era evidente que estava atordoado com o contato repentino, mas tentou não demostrar.
—Não tem de que, Mariana.
Agora é melhor você entrar, já está tarde, eu... também preciso ir.
—Está bem, até amanhã.
Mariana se despediu com um sorriso emocionado. Algo dentro dela não queria deixá-lo, porém achou melhor ir de uma vez.
—Até amanhã.
Paulo observou Mariana entrar na hospedaria, e só então pois-se a caminhar de volta a igreja.
Seu coração estava agitado dentro do peito. Ele se sentia estranho, apesar de acostumado a estar próximo das pessoas, e a receber diversas demonstrações de afeto, aquele abraço foi... diferente. Havia algo que ele não conseguia distinguir, um calor confortável, convidativo. Uma sensação que lhe causou grande estranheza, talvez porque nunca houvesse sentindo antes.
A doçura e a fragilidade de Mariana lhe despertavam sensações e sentimentos que Paulo sabia que era perigoso sentir, porém algo dentro dele estava muito disposto a ignorar o perigo que essa proximidade lhe traria.
Imagens meramente ilustrativas
Textos ainda sem correção.Música tema do Capítulo
La Solitudine- Renato Russo/ Solidão
Esses dois, ai ai ai
😅😅😅
Espero que gostem do capítulo, não esqueçam de votar e comentar se gostaram.😉😘
As músicas tema do livro estão disponíveis na playlist Tentação no Spotify
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Tentação
RomanceMariana perdeu tudo que amava na vida. Ela só encontrou dor por onde passou. Mesmo sendo ainda tão jovem, ela já não tem perspectivas de futuro. Em seu íntimo ela já desistiu. Descrente de que haja um Deus no céu, pois ela não acredita que um Deus...