Capítulo-17

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Quando Paulo retornou de sua corrida matinal, sua mãe já estava de pé, terminando de preparar o café na pequena cozinha da casa paroquial.
—Bom dia mamãe! Já acordada? Ainda é cedo.
Paulo disse se aproximando e lhe dando um beijo na testa.
—Bom dia querido. Você sabe que herdou esse hábito de mim. Me levanto junto com o sol. Não consigo ficar enrolando na cama.
Paulo sorriu entendendo bem, ele era igual. E na noite passada, não havia conseguido dormir direito, por isso, antes mesmo do sol nascer, já estava de pé. Foi ao ginásio fazer seus exercícios, e finalizou com a corrida. Porém nada foi capaz de sossegar seus pensamentos, e também estava ansioso pela conversa que precisava ter com Lucas.
—Eu sei bem como é.
Bom, eu vou tomar um banho, e venho tomar café com a senhora. Me espera?
—Claro filho, pode ir sossegado. Ainda estou terminando aqui.
Paulo deu mais um beijo na mãe, e se encaminhou para o banheiro. Se despiu do conjunto de moletom que usava e entrou embaixo do chuveiro, deixando que a água fria caísse sobre seu corpo o entorpecendo. De olhos fechados, a lembrança de Mariana veio a sua mente. E foi impossível para ele se impedir de sentir, algo que já não sentia a muito tempo. Um desejo incontrolável de beijá-la outra vez, de tocá-la, muito mais do que havia se permitido tocar.
—Deus! Sei que fiz um juramento. Dê-me forças para suportar, até que minha vida esteja no caminho para o qual o senhor está me guiando.
Paulo se deixou ficar sob a água por mais alguns minutos, antes de terminar o banho.
Logo estava reunido a mãe para o café da manhã, que ele não estendeu, pois imaginava que Lucas logo apareceria para vê-lo.
—Tenha um bom dia mamãe. Se precisar de mim, estarei na igreja, tenho muitos assuntos a resolver hoje.
—Está bem, eu vou deixar o almoço pronto para você, e vou encontrar as meninas. Angélica, Adele e Mariana ficaram de me acompanhar em um passeio pela cidade.
—Isso é muito bom, assim a senhora não fica o dia todo dentro dessa casa pequena. Deve estar com saudades da fazenda, não?
Madalena observava enquanto Paulo colocava o colarinho clerical, e pegava alguns papéis que estavam sobre a mesinha no canto junto a porta.
—Está querendo se livrar de mim, menino?
Paulo riu da expressão zangada da mãe, exatamente como ela costumava fazer quando ele era realmente um menino. Isso já fazia muito tempo que não era.
—Por mim a senhora pode ficar o tempo que quiser mamãe. Eu adoro a sua companhia, e não dispenso a sua comida.
Só perguntei, porque papai também deve estar sentindo a sua falta.
—Ah, com seu pai não se preocupe. Ele está ótimo. Mandou um abraço.
Madalena sorriu ao se lembrar da conversa que havia tido com o marido, na noite anterior. De como ele ficou empolgado com tudo que lhe havia dito sobre o filho. Ele havia falado para ela ficar o tempo que fosse preciso.
—Bem, diga a ele que agradeço e retribuo.
Agora preciso ir. Até mais tarde mãe.
Paulo deixou Madalena, e seguiu para a igreja. Parou quando chegou a porta ainda fechada, ao ver do outro lado da rua, Lucas conversando com algumas pessoas.
Assim que o viu, Lucas se despediu daqueles com quem conversava, desde que havia se sentado ao banco da praça logo cedo, e caminhou ao encontro do amigo.
Ele adorava ouvir os moradores dos lugares por onde passava. Perceber suas aflições, e aconselhar na medida do possível. Porém, o que mais ouviu das pessoas com quem conversou, foram elogios a Paulo. E isso o deixou muito feliz, saber o quanto o amigo era querido por aquelas pessoas, mesmo ele estando na cidade a tão pouco tempo.
Normalmente, não era o que acontecia com padres jovens, que iam substituir um padre já idoso em cidades pequenas, onde o mesmo já era o pároco a muitos anos.
Era sempre difícil a adaptação, tanto para o padre, como para os fiéis.
Não era o caso de São Tomás, que estava claramente adaptada a forma litúrgica de padre Paulo.
—Bom dia irmão!
Lucas cumprimentou Paulo, assim que se juntou a ele na porta da igreja, e o seguiu quando ele as abriu.
—Bom dia Lucas. Teve uma boa noite?
—Sim, sim. Consegui descansar da viagem.
Os dois seguiram para a sacristia, onde Lucas se sentou em uma das poltronas dispostas pelo espaço, e observava o amigo, que não se sentou, estava procurando algo sobre a mesa.
Paulo estava nervoso, não sabia muito bem como abordar o assunto que precisava falar com Lucas. O certo seria lhe pedir para ouvi-lo em confissão, porém não queria fazer isso.
—Vi sua amiga mais cedo. Mariana, não é isso?
Paulo se virou para Lucas, ao ouvi-lo. Se ele não sabia como iniciar o assunto, parecia que Lucas havia lhe dado a deixa.
—Me fez companhia no café.
A moça parece ter algum problema com a religião, mas não tive tempo para descobrir o que seria. Outra jovem se juntou a nós, antes que eu pudesse questioná-la.
Sabe de que se trata?
Lucas se manteve sentado tranquilamente, porém seu olhar acompanhava Paulo, que se sentou na poltrona ao seu lado.
—Mariana passou por muitas tribulação na vida, Lucas. Está com sua fé abalada.
—Entendo. Um desafio e tanto.
Acredito que foi isso que os aproximou?
—Foi.
Lucas aguardou que Paulo dissesse mais alguma coisa, mas ele só suspirou pesadamente.
—Não vai me dizer qual o problema da moça? Talvez eu possa ajudar.
—O problema da Mariana, bom... não era sobre isso que eu queria lhe falar Lucas.
—Então me diga, sobre o que quer me falar? Quer se confessar?
—Não, quero falar com meu amigo.
Lucas estreitou o olhar, e observou o quanto Paulo parecia angustiado.
—Tudo bem, pode falar.
Paulo olhou para Lucas e sem encontrar um jeito fácil de dizer aquilo, optou por apenas dizer.
—Estou apaixonado, Lucas. Completamente e irremediavelmente apaixonado.
O choque tomou conta da expressão de Lucas. Em seguida veio a perplexidade. Ele não acreditava que havia ouvido certo.
—Eu não ouvi certo... eu...
—Você ouviu Lucas. Eu estou... apaixonado.
—E você me diz isso assim? Sem preparo algum.
Lucas se levantou tentando encontrar o ar. Ainda não acreditava estar mesmo ouvindo Paulo dizer que... Deus! Ele não conseguia dizer a palavra nem em pensamento.
—Sempre enfrentei minhas batalhas de frente, Lucas. Não seria diferente agora.
—Deus! Tem certeza que não precisa se confessar?
—Tenho. Porque eu precisaria estar arrependido, eu precisaria acreditar que estou em pecado. Mas não estou.
Quando lhe digo que estou apaixonado, eu pensei muito sobre isso.
Não é... luxúria, ou somente desejo carnal. É algo muito maior, e muito mais forte.
—Paulo...
—Me deixe terminar Lucas. Prometo ouvi-lo depois.
Paulo pediu, e Lucas anuiu em concordância, voltando a se sentar diante de Paulo.
—Não sei se conseguirei explicar ao certo o que sinto, mas o que posso dizer é que... a minha convicção de que meu caminho era dedicar a minha vida única e exclusivamente a igreja, essa determinação mudou, eu não a vejo mais em mim.
—Como isso é possível Paulo?
Uma vida inteira na igreja, e você conhece essa moça a o que? Alguns meses?
Lucas não conseguia conter sua indignação, era visível, mas Paulo não se abateu, estava determinado, e sabia que aquela conversa era só o primeiro passo, e agora iria até o fim.
—O que o tempo tem a ver com o amor, Lucas. Amor tem a ver com conexão, com encontro de almas, pouco importa se foram dias, ou uma vida inteira.
Dei bons anos da minha vida a igreja, porém agora estou convicto que o meu objetivo mudou.
—Não ama mais a igreja? Eu... eu estou perplexo Paulo. O que aconteceu com toda a sua convicção? E os seus projetos de mudanças, todas as suas lutas, e tudo que já havia alcançado? Vai simplesmente dar as costas? Por um sentimento que... vamos ser francos aqui, você nem sabe se é real.
—Eu a amo, não tenho dúvidas quanto a isso. Mas isso não quer dizer que não amo mais a igreja. Eu só agora acredito que posso amar as duas.
Lucas esfregou o rosto com as duas mãos, tentando clarear as ideias, e suspirou pesadamente ao voltar a olhar para Paulo.
—Nós não somos proibidos de amar, Paulo. Somos humanos, somos homens.
Aquele que não ama, não conhece a Deus.
O que não podemos é viver o amor carnal, porque fizemos um juramento de nos mantermos puros. Você pode amá-la a vida inteira. Guarde esse sentimento em seu coração, talvez ele dure para sempre.
Paulo olhou entristecido para Lucas. Ele deixou visível algo que Paulo nunca havia percebido, em todos os anos que o conhecia.
—Você não acredita no amor, Lucas?
—Sim, acredito no amor de Deus.
E você também acreditava Paulo. Está se deixando levar por uma tentação.
Paulo balançou a cabeça em negativo.
—Quando conheci Mariana, eu acreditei que Deus a pôs em meu caminho para que eu a ajudasse a encontrar o próprio caminho, porém, hoje acredito que Ele a colocou junto de mim, para que eu mudasse o meu caminho.
Meu coração me guiou até aqui, Lucas. E é esse mesmo coração que me diz que essa jornada terminou.

Imagens meramente ilustrativasTexto ainda sem correção

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Imagens meramente ilustrativas
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Música tema do Capítulo

Cosa Della Vita- Eros Ramazzotti/ Coisas da vida

Conversa difícil essa hein
O que será que aconteceu para que Padre Lucas deixasse de acreditar no amor 🤔
Humm, acho que teremos livro de Padre Lucas para que ele possa explicar direitinho kkkk
Bom, Paulo deu o primeiro passo.
Espero que tenham gostado do Capítulo. Bjs, não esqueçam de votar e comentar 😉

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