Capítulo 11 - Lian

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 Eles se afastaram rapidamente, me deixando sozinho naquele enorme salão. Olhei novamente em volta, estava escuro demais para notar qualquer detalhe diferente, a luz da lua entrava pelas vidraças, iluminando as escadaria.
Pisei no primeiro degrau e coloquei a mão no corrimão, mas tirei na mesma hora que senti a consideravelmente grossa camada de poeira.
- Não acredito que tiveram a coragem de deixar esse lugar imundo - comentei limpando a mão
Contei os degraus enquanto subia a escada, são exatos 30 degraus, 15 antes da bifurcação e 15 em cada lado depois dela.
O corredor estava escuro e parecia não haver nada nele, olhei para trás e vi que o outro corredor estava iluminado por varias tochas, dei meia volta e fui para o outro lado.
Carregar aquele manto pesado era muito irritante, além de deixar meus ombros cansados, ele também dificultava na hora de andar, mau podia esperar para tira-lo.
Segui pelo corredor e vi uma porta encostada, entrei imaginando que ali fosse meu quarto.
A primeira coisa com que me deparei foi uma mulher de cotas espalhando pétalas pela cama, ela tinha o cabelo ruivo e um pouco a cima do ombro, o que era incomum, pois praticamente todas as mulheres tem cabelos longos, seu vestido era de um tom cinza não muito claro e cobria seu corpo inteiro, inclusive o pescoço.
Notando minha presença, ela se virou e deixou a cesta que estava segurando de lado, pegou seu vestido e se curvou.
- Senhor Lian - me cumprimentou formalmente, com uma voz calma e gélida - Me chamo Liliana da casa Umber, a partir de hoje serei sua serva particular e acompanhante
Fala sem enrolação ou conversa fiada, bom, muito bom
Levantou e olhou para mim, seus olhos azuis eram frios e sem nenhuma emoção aparente e o rosto levava uma expressão seria e calma.
- Uma dama de companhia, você quis dizer - disse sem tirar os olhos dela
- Se prefere entender desse jeito... Então sim - se aproximou para me ajudar a tirar o manto, agora que estava perto notei que ela é pelo menos um palmo e meio mais alta do que eu.
- Não preciso de nenhuma... - relaxei depois de tirar aquele peso- dama de companhia.
- Mesmo que não me queira como dama de companhia, continuo sendo sua criada. - disse enquanto dobrava o manto e o deixava em cima de uma cadeira.
- É... Acho que sim
Olhei melhor o quarto, ele estava repleto de velas, que davam ao lugar um ar calmo e irritantemente romântico, tinha varias pétalas espalhadas por toda cama, e as flores que escaparam do massacre estavam em vasos em cima das mesas decorando o quarto. Também havia vários panos em volta da cama, a cobrindo para formar uma espécie de cabana.
- Foi você que fez tudo isso ? - perguntei me virando para ela.
- não senhor, os outros criados do castelo que arrumaram tudo, minhas únicas funções essa noite são espalhar pétalas e te preparar.
- O que quer dizer com "te preparar" ? - perguntei enquanto tirava a coroa
- Vou te deixar pronto para o senhor seu marido.
Suspirei
- Tudo bem, como vai ser ?
- Primeiro, tire esta roupa - pegou uma roupa branca - e coloque essa.
- Certo - fiquei esperando que ela saísse, mas ela continuou imóvel - Você pode me dar um pouco de privacidade ?
- Claro, vou buscar as outras coisas enquanto isso - pegou a cesta e saiu.
Aquela mulher era o próprio norte encarnado em uma pessoa, tenho que lembrar de perguntar sobre isso para ela.
Troquei de roupa e sentei na cama, não muito depois ela voltou com uma pequena bandeja nas mãos. Em total silêncio ela a colocou em cima da mesa e começou a mexer nos frascos.
- Então... nortenha, não é ?
- Sim senhor
- E... como é o norte ?
- frio e duro - disse se aproximando depois de achar o frasco que estava procurando.
- O que é isso ?
- Óleo perfumado - ela estendeu o frasco para que eu cheirasse.
- Madressilva - disse sentindo o característico aroma doce e suave da flor
Ela virou o frasco no dedo e passou no meu pescoço, mas recuou a mão assim que o contrai.
- Eu sinto... muitos arrepios aqui - disse um pouco envergonhado.
- prefere fazer isso ? - perguntou indiferente
Peguei o frasco e passei o óleo no pescoço.
- Passe nos pulsos também - instruiu enquanto ia buscar outra coisa na bandeja.
Ela voltou com algumas folhas de menta, mandou que eu as mastigasse para acabar com qualquer mau hálito existente. Depois fez uma mistura de pimenta e mel e passou em volta da minha boca.
- Isso vai aumentar seus lábios - disse enquanto limpava o dedo - pode arder um pouco, mas logo irá passar
Esperamos alguns infernais instantes até que ela passou um pano em minha boca para tirar a mistura.
- Que coisa horrível - disse sentindo meus lábios formigarem - preciso de água.
Ela serviu um copo e me entregou.
Toquei meus lábios e senti que eles realmente pareciam estar um pouco maiores.
- O que vem agora ? - perguntei já ficando impaciente
- Nada, já acabamos - pegou a bandeja
- Graças aos Deuses - comentei
- O senhor precisa de alguma coisa ?
- Acho que não.
- Então vou me recolher por hoje, com sua licença - se curvou e foi em direção a porta
- Espere - não acredito que vou fazer isso.
- Sim ? - perguntou se virando
- Será que... - que fraqueza toda é essa Lian ? Mostre mais autoridade - Digo... Quero que fique aqui comigo enquanto meu esposo não chega.
- Sim senhor
Ela deixou a bandeja em cima da mesa e ficou em pé parada.
Ficamos em silêncio, o clima estava começando a ficar desconfortável, pelo menos para mim, já que ela não demonstrava nada.
- Seu nome é Li... Lili... - como que você já esqueceu o nome dela ?
- Liliana senhor, Liliana Umber, mas se preferir pode me chamar apenas de Lili
- Certo - decorar só Lili seria muito mais fácil - Então Lili, imagino que seja filha do senhor da ultima lareira.
- Sim, sou filha dele.
- Como era viver tão perto da muralha ? - tinha começado a gostar desse "jogo" de perguntas.
- Era árduo, principalmente durante o inverno, mas já estava habituada ao clima - deu de ombros
- E porque você veio para cá ?
Ela suspirou
- Estava cansada de tanta neve - disse simplesmente
- Entendo.
O silêncio voltou, mas dessa vez, quem surpreendentemente o quebrou foi Lili.
- O senhor me permite perguntar algo ?
- Sim
- Quão nervoso o senhor está ?
Sete infernos, ela notou.
- Eu não estou nervoso - disse tentando passar confiança.
Em resposta, ela olhou para minha perna, só então percebi que eu estava a balançando muito. Parei de mexe-la na mesma hora.
Lili então olhou para minhas mãos, que estavam suando, tratei de enxuga-las rapidamente. Por fim, ela me encarou nos olhos, esperando que eu cedesse.
- Tudo bem, você ganhou, eu estou nervoso. - disse irritado
- Não há porque se envergonhar, é normal se sentir assim na primeira vez, procure tentar se acalmar.
- Mas como ?
- Respire fundo, tente pensar em outra coisa.
- Falar é fácil - disse cruzando os braços.
- Acredite, logo você se acostumara.
- Como pode dizer isso com tanta certeza ?
- já preparei muitas moças, sei como isso funciona.
- Certo, vou tentar me acalmar - Respirei fundo e descruzei os braços.
O silêncio voltou mais uma vez, então aproveitei para olhar para Lili, ela aparentava ser bem jovem e era muito bonita.
- Quantos anos você tem ? - me atrevi a perguntar.
- 26 - ela não pareceu se importar em revelar sua idade.
- Você é mais jovem do que eu esperava para alguém que esbanja tanta experiência.
- Eu comecei a trabalhar cedo como criada pessoal - fez uma pausa para pensar - em torno dos 17 anos.
- Sei, mas uma coisa que não entendendo é...
Alguém bateu na porta enquanto eu falava, Lili foi até ela e a abriu, Amenom entrou, olhando em volta.
- Desculpe a demora - disse olhando para mim - eu tive que tirar a armadura antes de vir pra cá.
Só então notei que ele estava com roupas normais, segurando seu manto e sua coroa nas mãos.
Ele então olhou para trás e só então prestou atenção em Lili.
- Ah! Desculpe, não te vi ai antes - foi até ela e segurou sua mão - eu sou príncipe Amenom da casa Targaryen, é um prazer conhece-la - deu um beijo na mão de Lili.
- Igualmente senhor - ela se curvou - Sou Liliana da casa Umber, sou criada pessoal e acompanhante de seu esposo.
- Você quer dizer tipo uma dama de companhia ?
- Tipo uma dama de companhia - Lili pegou o manto da mão de Amenom, o meu manto e a bandeja - Senhores, nossa conversa foi muito agradável, mas agora darei privacidade ao casal - olhou uma ultima vez para mim - Amanhã voltarei para trazer o café da manhã, com sua licença - se curvou e foi embora.
Fiquei sozinho com Amenom, me virei e deitei na cama, torcendo para que ele não começasse a conversar e tentando respirar fundo e ser o mais otimista possível.
Felizmente ele também parecia não estar querendo conversar. Amenom colocou a coroa na mesa e começou a tirar a parte de cima da roupa, notei que ele tem uma pequena cicatriz nas costas, ele é uma pessoa com muitas cicatrizes pra quem nunca foi para nenhuma guerra ou algo do tipo.
Ele começou a tirar a calça também, mas parou e refletiu por um minuto, então olhou para mim, rapidamente desviei os olhos para a varanda do quarto, fingindo que tentava ver alguma coisa do lado de fora.
- Acho melhor não - subiu o pouco que tinha abaixado e veio se deitar na cama.
Ficamos assim, parados, por um tempo, nenhum dos dois falava ou tomava iniciativa.
De repente Amenom começou a cheirar o ar.
- Que cheiro gostoso - se sentou na cama - será que são das flores ?
Estendi o pulso para ele, Amenom a principio estranhou mas logo se aproximou.
- Ah, então é você - cheirou mais um pouco - o que é ? você sempre usa isso ?
- Óleo de madressilva e não, Lili passou em mim.
- Lili ?
- A mulher que estava aqui - disse me virando para ele.
- Ah tá - ele voltou a se deitar
Houve um momento de silêncio.
- Você notou que essa é a primeira vez que nos falamos em semanas ? - se deitou de lado - procurei por você varias vezes, mas não te achava em lugar nenhum.
- Sério ? - não é como se estivesse fugindo de você ou algo do tipo.
- Sim - ele sorriu mas logo sua cara ficou seria - Sabe... meu pai me disse que temos que consumar o casamento.
- É... eu já imaginava - calma, calma, calma, vai ser só hoje e logo vai passar.
- Você tá bem ? - ele perguntou me analisando.
- Estou sim, por que ? - só falta ele ter notado.
- você parece tenso - olhou para baixo - e sua perna tá estranha.
Olhei para baixo e minha perna estava tremendo de novo, parei de treme-la e tentei relaxar.
Ele ficou me olhando por um tempo.
- Você não vai conseguir, não é ?
- Lógico que vou - fiquei irritado por ele me achar tão fraco, virei a cabeça de lado e fechei os olhos - Apenas faça isso logo.
Ele ficou em silêncio por um tempo e então suspirou.
- tudo bem - senti ele se mexer na cama e logo depois percebi que ele estava sobre mim com uma mão de cada lado do meu corpo.
Ele ficou assim parado por uns instantes, até que de repente ele tocou meu rosto e recuei automaticamente.
- É... você não vai conseguir - voltou a se deitar do meu lado.
Abri os olhos e olhei para ele, envergonhado de ter sido tão fraco.
- Não precisa ficar assim - disse tentando me consolar de alguma forma - eu imagino como deve ser horrivel pra você, pra mim também é.
Ficamos quietos por um tempo, até que o rosto de Amenom se iluminou.
- Tive uma idéia - se levantou com um pulo e foi até a porta.
Ele saiu me deixando curioso e surpreso.
Depois de um tempo ele voltou com uma faca de queijos na mão, deu uma ultima olhada no corredor e então fechou a porta.
- Meu pai disse que queria ver pelo menos umas gota de sangue nesse lençol, então vamos dar isso para ele - Amenom se sentou na cama e colocou a faca no braço, mas antes de cortar parou e pensou melhor - e melhor cortar um lugar onde ninguém veja - ficou de pé, dobrou a calça e posicionou a faca, mas novamente antes de cortar parou e pensou - se bem que vão queimar o lençol depois... - olhou para mim - Terá de ser você Lian.
- Ah não - disse recuando as pernas - não vou deixar você me cortar antes de me explicar o que você esta tentando fazer.
- O que você não entendeu ?
- O porque do sangue.
- Você não sabe ? - disse surpreso
- Deveria ? - disse impaciente
- é que... como te digo ? - parou para pensar - Quando a mulher fica junto com um homem pela primeira vez, sai um pouco de sangue na hora do ato.
Como poderia saber disso ?
- Mas eu não sou mulher - disse irritado.
- Mas meu pai espera que você sangre - me encarou - então ?
Vendo que não tinha muitas opções, suspirei e dobrei a barra da calça.
- Vai, corta logo - virei a cara.
Amenom relutou em segurar minha perna, mas quando o fez rápido em fazer um pequeno corte, que no final nem doeu tanto. O sangue pingou enquanto Amenom pegava um pano que estava em cima de uma mesa para estancar a ferida.
- Pronto, agora temos a desculpa perfeita.
Ficamos em silêncio por alguns instantes e então falei:
- Acho melhor irmos dormir, já esta muito tarde.
- Tem razão.
Ele apagou as velas, deixando apenas uma acessa, se deitou na cama e disse:
- Boa noite Lian - assoprou a vela
Suspirei
- Boa noite Amenom.

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