Capítulo 21

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O vento frio de Richmond parecia se tornar cada vez mais intenso à medida em que o carro passava pelas ruas pouco movimentadas. Encostei a cabeça no vidro da janela e tentei levar meus pensamentos para longe de Sebastian.

No dia anterior, acabei adormecendo e só acordei de manhã. Meu corpo ainda doía muito, mas me esforcei ao máximo para conseguir levantar e resolver aquele mal entendido. Eu estava aflita, não parava de olhar o relógio no painel do carro, mesmo estando perto de chegar.

— Está tudo bem, querida? — O doutor Eduard me olhou através do retrovisor central.

Ele era um homem consideravelmente bonito. Apesar de já ter cabelos grisalhos, não aparentava ter mais do que sessenta anos. Seus olhos eram azuis, o maxilar marcado e físico surpreendente para alguém naquela idade.

— Estou sim.

— Não falou nada durante a viagem — dessa vez, Laura, ao lado do marido, comentou.

— Estou um pouco nervosa... talvez ansiosa. Nunca estive num lugar como esse antes.

— É compreensivo. Mas já estamos quase chegando — o homem de voz gentil informou. — São quase oito horas. Talvez cheguemos uns minutos atrasados, mas sem dúvida a tempo de você dar seu depoimento.

— Espero que sim...

Enquanto os dois conversavam sobre o tempo, minha cabeça viajou até minha família e um nó se instalou em minha garganta. Minha mãe devia estar arrasada.

Laura e Dr. Eduard estavam com medo de sermos descobertos por Sebastian, já que eu era a única que poderia provar seu envolvimento em tudo, então desisti de ligar para meus amigos e polícia. Eu estava feliz por ninguém ter se ferido. Ao mesmo tempo me sentia temerosa por Dylan. Tinha medo que se fechasse novamente pra mim. Era quase certeza que se culpava pelo que houve.

Me olhei pelo vidro fumê da SUV preta e vi uma mulher abatida, desalinhada e sem ânimo. Permiti que uma única lágrima escorresse por meu rosto antes de enxugá-la com as costas da mão. Fechei os olhos brevemente e meu corpo inteiro se arrepiou. Eu poderia jurar que ouvi a voz do Matheus dizendo que tudo ficaria bem. Talvez fosse efeito do remédio para dor que havia tomado. Mas me agarrei aquelas palavras.

— Chegamos! — Eduard anunciou me trazendo de volta à realidade.

Após estacionar, os dois desceram e me ajudaram a sentar na cadeira de rodas.

O imenso e imponente prédio com grandes pilares me intimidou um pouco, claro, mas segui em frente ao ser levemente impulsionada por Laura. Muitas pessoas formalmente vestidas passavam de um lado a outro com pastas nas mãos, e isso me fez questionar se não deveria ter aceitado o terno feminino que foi me oferecido hoje pela manhã. Analisei minhas roupas, enquanto Eduard procurava informações sobre o julgamento. Decidi usar uma calça bem folgada para não pressionar meu ferimento e uma blusa preta de mangas longas que Laura tinha. Por cima, vesti um sobretudo marrom que me protegia do frio.

— Vamos? — Eduard retornou nos guiando pelo caminho certo.

Depois de passar por um longo corredor, Laura parou a cadeira de frente para uma porta dupla, fechada.

— Preparada? — ela perguntou se posicionando entre mim e a única coisa que nos impedia de entrar.

Sequei minhas mãos suadas no sobretudo e enchi os pulmões de ar.

— Sim.

O casal abriu as portas como se estivessem anunciando um espetáculo. E de certa forma, era. O barulho chamou a atenção de todos presente. Muitos olhares se direcionaram a mim quando comecei a empurrar a cadeira de rodas até o meio do corredor que separava o público. Todo o lugar de tom marrom escuro foi tomado por burburinhos. Todos que me reconheciam, seja por proximidade, ou pelos sites de noticia, levantaram de seus assentos.

Percorrendo alguns rostos, encontrei Emma e Cat boquiabertas e de olhos marejados. Lhes dei um sorriso na tentativa de conforta-las e mostrar que estava bem.

Alguns flashs foram disparados enquanto o juiz batia seu martelo e pedia por ordem. À direita, em pé ao lado de outro homem, estava ele, de terno azul escuro me encarando. Seus olhos estavam tão vidrados em mim que senti meu estomago contrair. Parecia submerso, talvez pela surpresa.

— Ordem! — o juiz vociferou novamente. Dessa vez, todos se calaram.

Sem parar de olhar para aquele homem grande, de barba feita e postura impecável, falei com a voz falha:

— Vossa excelência, gostaria de dar meu depoimento.

— E quem é a senhora?

Olhei o senhor de cabelos brancos, que me encarava com cenho franzido.

— Sou Eivy Fernandes Louise.

Um novo alvoroço repercutiu no tribunal, porém não consegui distinguir o que diziam. Meus olhos retornaram para aquelas íris azuis e, por um instante, pensei tê-lo visto sorrir.

A Minha Vez, Eivy - Livro 2 CompletoOnde histórias criam vida. Descubra agora