Mau humor. No momento essas duas simples palavras em conjunto definem meu estado de espírito e determinam meu dia. Então sim. Hoje estou mal humorada, simples assim. Então não, não espere por piadas engraçadas, ou comentários humorísticos que aliviam o peso da situação vindos de mim. Por que ao menos que um milagre ocorra, nada vai melhorar meu dia, que da mesma forma que meu humor vai de mal a pior. Posso até mesmo ouvir as gargalhadas que o mundo solta, já que ele obviamente está conspirando contra mim.
Ao acordar, já pude sentir o ar gélido que arrepiou minha pele por inteiro, meus olhos cansados por uma noite mal dormida repleta de insônia vislumbraram o cobertor que deveria estar me tapando caído aos pés de minha cama. Meu nariz coçava e estava trancado e assim que notei a janela esquecida aberta, constatei o óbvio: Havia pego uma porcaria de resfriado.
Levantei-me indisposta, e fiz o possível para me arrumar do jeito mais rápido que minha preguiça, permitia. O que não foi uma tarefa muito fácil levando em consideração o meu chuveiro ter queimado, e não conseguir colocar nada no meu estômago, que apenas de ver qualquer sinal de comida embrulhava-se.
Suspirei pesado, e cheia de fome e espirrando feito uma condenada saí de casa. Ao descer as escadarias e finalmente sair do prédio em que habitava, deparei-me com uma garoa densa que desabava. O dia estava tão nublado e chuvoso quanto minha alma.
Devagar abri meu guarda-chuva e dei o primeiro passo em direção a rua. Não tinha pressa alguma, pois apesar de tudo, havia algo de belo naquele clima que preenchia uma bolha de tristeza privada para cada pessoa.
Somente andei com o vento fraco e frio soprando e fazendo-me arrepender amargamente de não ter trazido um casaco mais grosso comigo. E mesmo estando perto, não possuía vontade nenhuma de voltar somente para fazê-lo.
Abaixei minha cabeça e teria deixado meus pés andarem no automático se antes não houvesse escutado um grito. Grito esse que tardei a identificar devido a chuva que abafava qualquer som. Mas ainda assim estaquei os passos no meio do caminho, e devagar assimilei cada sílaba da palavra proferida aos berros. “Marinette” era o que haviam pronunciado. Me virei lentamente para trás, e tive a visão de uma silhueta que apoiava-se com dificuldade em duas muletas.
Respirei fundo e tentei me acalmar, é claro que ele apareceria para deixar tudo pior. Caminhei até a figura loira, sem pressa, mas ainda com determinação. E quando estava perto o suficiente, apenas olhei diretamente em seus olhos e deixei as palavras saírem da minha boca por conta própria de forma seca:
– O que foi?
– Eh… Eu quero conversar com você, não gostei da nossa briga de ontem…
– Como pode ver, estou ocupada e saindo de casa. Não podemos conversar.
– Eu sei! Mas não precisa ser agora, pode ser mais tarde a hora que preferir.
Eu mordi meu lábio inferior com seu pedido que havia causado-me tamanha indecisão. Minha vista finalmente saiu de seus olhos e observei-o por inteiro. Ele estava inteiramente molhado, incluindo a faixa que deveria auxiliar em seu tornozelo machucado. E tudo isso devido a falta de um guarda-chuva, problema que logo resolvi colocando nós dois debaixo de meu guarda-chuva pequeno. Os cabelos loiros estavam bagunçados e grudados em sua testa. E a face demonstrava anseio e de certa forma medo, era como se nossa briga realmente tivesse mexido com ele. Assim como ela tinha mexido comigo.
Passei boa parte de minha madrugada refletindo sobre ela, e, com certeza, engordei algumas calorias a mais com a quantidade absurda de sorvete que ingeri. Os efeitos negativos estavam até mesmo me acompanhando nessa manhã, onde tudo que quero é descobrir qual o sentido da vida e se estamos aqui somente para sofrer. Mas é claro, eu jamais admitiria isso em voz alta, era simplesmente orgulhosa demais para isso.
– Se eu aceitar, vai parar de me esconder coisas?
– Eu quero muito, Marinette. Eu juro. Mas é complicado, muito complicado…
– É… – Sussurrei e dei de ombros. – Imaginei que fosse.
Mergulhamos num silêncio terrível, onde tudo o que ouvíamos era as gotas da chuva caindo e nossas respirações. Tudo envolto de nós parecia tão irrelevante, mesmo que buscasse uma saída de emergência em qualquer canto dessa situação. O ar era denso, difícil de respirar. Me fazendo questionar se isso se dava ao meu mais novo resfriado ou ao momento nada positivo que me encontrava.
– Se é só isso que queria. Eu preciso ir andando, ou vou me atrasar.
Adrien suspirou pesado, um suspiro que era uma mistura de decepção e tristeza. De seu bolso traseiro da calça jeans ele retirou um pequeno objeto e esticou para mim. – Aqui, a chave do meu carro. Pode pegar emprestado.
Olhei desconcertado para a chave, e ponderei o quão mais fácil e prático seria eu ir à faculdade dirigindo. Mas mesmo assim ainda era colocado um peso muito maior na balança. A injustiça. Não seria nada legal pegar o carro emprestado do meu vizinho depois de ter praticamente negado o pedido dele. Isso seria cruel, injusto demais.
– Obrigada, mas não posso aceitar. – Declarei o olhando nos olhos e com um gesto simples empurrei levemente a chave de volta para ele.
– Mas…
– Mas nada, eu vou de metrô. – Declarei o interrompendo. – E você vai voltar para casa pelo elevador, e ficará quieto e confortável num canto só, como te mandaram ficar. Já forçou tanto esse tornozelo nessa uma semana que se continuar assim nunca vai melhorar! Agora se me der licença tenho realmente que ir. Nos vemos por aí, Adrien.
E sem esperar por uma resposta o dei as costas e sai andando em direção a estação de metrô. Aos poucos o som da chuva e a tristeza dessa manhã voltaram a me envolver sem piedade. Sentia meu coração apertado no peito e a garganta seca. E isso doía. Mas já havia tomado a minha decisão e apenas um milagre me faria voltar atrás.
Já não existia mais Adrien Agreste em minha vida, ele era apenas mais um estranho que se misturava na multidão Era só isso, um estranho que eu não conhecia. Como deveria ter sido desde o início.
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O cara do apartamento 27
FanfictionMarinette é uma estudante dedicada da faculdade, uma amiga leal e em suma uma boa pessoa. Contudo, ao conhecer seu novo vizinho - Adrien - que se mudou para ao lado de seu apartamento há pouco tempo. Ela experimenta o inferno na Terra. Tanto pela pe...