Eu simplesmente ainda não consigo acreditar. A ficha ainda não caiu. Isso é tão irreal, que às vezes penso que estou sonhando. É loucura demais para minha cabeça, que há pouco mais de dois meses suas únicas preocupações eram a nota que tiraria nas provas e a geladeira vazia.
E em pensar que agora minhas prioridades eram questão de vida ou morte, literalmente.
Imagino o que meus pais me diriam caso soubessem o rumo que a vida de sua filhinha nota dez e perfeitinha levou. Namorando um bad boy que tem tendência a cometer atos levemente ilegais. Faltando a faculdade tão sonhada de uma forma extraordinária. E o que estou esquecendo? Ah, é mesmo! Também estou fugindo de uma organização criminosa que quer a todo custo me ver morta! Com certeza eles iriam amar isso tudo! E o mais legal de tudo, eu não me arrependo de absolutamente nada! Pois se não fosse por isso, provavelmente eu jamais teria tido Adrien em minha vida!
É. Como estava dizendo… Meu cérebro ainda não processou tudo isso. E com certeza, nem chegou perto de processar meu agora.
Olho para os lados, apenas para ter certeza de que eu realmente estou aqui. Vejo várias pessoas sentadas em seus assentos, com cintos bem afivelados. Uma comissária de bordo ajuda uma senhora a colocar sua bagagem num dos compartimentos de cima. E enfim a voz do piloto do avião mandado todos permanecerem em seus lugares e prenderem o cinto para o avião poder partir. E assim, dentro de algumas horas poussarmos na Itália. O lugar onde todo o pesadelo de Adrien começou.
E o pior de tudo? Ele ainda não me contou o que estamos indo fazer lá, apenas me pediu para confiar nele. E como a boba apaixonada que sou acabei aceitando.
Fecho meus olhos com força e respiro fundo.
Um aperto na minha destra me faz virar a cabeça e encarar a imensidão verde dos olhos de Adrien.
– Ei, está tudo bem. Eu estou aqui para o que precisar.
Eu soltei uma risada anasalada.
– Não deveria ser eu a te consolar agora?
– Talvez. – Ele se ajeitou em sua poltrona. – Mas prefiro me focar em você.
– Adrien… Você não pode ignorar isso para sempre, ainda mais indo para onde tudo isso começou. Eu estou aqui por você.
– Eu sei. – Ele sorriu fracamente – Eu só… Estou com medo. Medo do que vou sentir assim que por meus pés lá… E do que vou descobrir. Meu pai pode ter sido um canalha, mas ainda era meu pai. Além disso tem minha mãe… Às vezes imagino se seria diferente se eu não tivesse travado, talvez ela ainda estivesse viva agora.. Isso é tudo minha culpa! Sinto que a qualquer momento vou desabar…
– Ei, nada disso foi sua culpa. Você teve uma reação humana normal a uma situação daquelas, sua mãe sabia o que estava fazendo Adrien. Emilie conhecia todos os riscos e fez a escolha dela. Ela morrer foi trágico, mas também serve para mostrar o quão forte e corajoso você é… E se você desabar, bem, eu vou te segurar como todas as outras vezes.
Lágrimas molharam os olhos de Adrien e ele sorriu triste. Meu coração se apertou no peito. Adrien não merece sofrer…
– Eu definitivamente não te mereço.
– Não, você merece muito mais.
Me aproximo e o beijo intensamente, sinto suas lágrimas molharem meu rosto. Mas eu não me importo. Me separa dele com o resquício de sanidade que me resta e o abraço de lado. É pouco, mas no momento é tudo que posso lhe oferecer. O meu mais singelo apoio e afeto.
E então o avião decola.Assim que pisamos no aeroporto de Itália, eu tive o vislumbre de um dos lugares mais cheios de pessoa que já vi na vida.
Pessoas com ou sem pressa se acumulavam nos bancos do lugar, enquanto outros zanzavam de um lado para o outro.
– Tente não encarar muito as pessoas, elas podem nos reconhecer.
Concordei suavemente com a cabeça, e ajeitei a peruca loira e cacheada na minha cabeça discretamente, essa coisa coça muito!
Por trás dos meus óculos azuis, enxerguei Adrien rindo baixinho da minha cara de desgosto. Sua touca vermelha escondia seus fios dourados totalmente. E cobrindo seus olhos, óculos escuros grandes que impediam de conseguirem avistar seu esverdeado tão chamativo.
Com raiva, o deu um tapa em seu antebraço.
Ele encolheu seu braço e chiou de dor.
– Bruta! – Ele resmungou.
Eu apenas dei de ombros e me permiti revirar os olhos.
– Vamos pegar nossas malas de uma vez. – Declarei e comecei a andar sem esperar por ele.
Adrien acelerou os passos e me acompanhou até a esteira que devolvia nossas malas. As pegamos e caminhamos para fora do aeroporto, assim que saia pelas grandes portas senti o clima quente e seco da Itália me atingir com força. Desliguei baixinho pelo calor, que com certeza, não é o meu habitual.
Um carro preto parou bruscamente em nossa frente, fiquei com medo e instintivamente apertei a mão de Adrien.
A janela escura do carro se abriu, uma mulher de provavelmente com minha idade nos encarou com seus olhos castanhos - âmbar puxados, deixando claro sua descendência asiática. Seus cabelos curtos indo apenas até seus ombros. Sua expressão era indecifrável e analítica, e dessa maneira notei que ela era o tipo de pessoa que lia as pessoas, nunca a que era lida. E isso é apavorante.
Adrien a fitava surpreso, mas ao menos não estava com medo dela.
A japonesa sorriu cinicamente em direção ao loiro. – É sério? Esse é o melhor disfarce que encontrou? Eu te reconheci a metros de distância.
– Simpática como sempre, Kyoko! – Adrien respondeu sarcástico.
– E mesmo assim, ainda te ajudo.
– Nunca te pedi ajuda.
– Fala sério, se não fosse por mim você viveria encrencado.
Os dois se olharem desafiadores, nem ao menos piscavam. O que me deixou desconfortável.
Uma curva se ergueu nos lábios de Adrien, assim como nos de Kyoko. Ambos gargalharam juntos. Suas expressões se suavizaram, e eles sorriram.
– Entrem logo no carro, Pietro e Stefanie já estão esperando por vocês dois na delegacia.
Encarei Adrien e ele apenas assentiu levemente para me tranquilizar. Relaxei meu corpo tenso até então e entrei no carro. Me acomodei no banco traseiro, assim como o Agreste.
Kyoko deu a partida logo em seguida e o carro deslizou pelas ruas.
Após alguns minutos de silêncio na viagem a japonesa decidiu quebrá-lo já que a viagem não estava sendo confortável para ninguém com o clima tenso que pairava no ar.
– Há quanto tempo estão juntos?
Eu me ajeitei no banco e a encarei pelo o espelho empertigada.
– Como sabe que nós…?
– Foi bem simples na verdade, vocês dois são bem óbvios se quer saber.
– Faz algumas semanas já. – Adrien respondeu a indagação.
– Então… – falei desconfortável. – Como vocês dois se conhecem?
– Namoramos durante o ensino médio. – A mulher deu de ombros.
– Oh… – Murmurei.
Me senti em uma posição ruim, além do ciúmes irracional que aquecia meu corpo de ira.
Imaginei Adrien e Kyoko se pegando na arquibancada da escola deles escondidos como adolescentes normais fazem. Fiquei com repulsa pela imagem… E pensar que ela beijou a boca dele, assim como outras garotas antes de mim. Isso não me ajudou em nada.
Adrien apertou minha mão, virei a cabeça para encará-lo e notei uma careta preocupada vinda dele.
Sorri pequeno para mostrar a ele que estava tudo bem. Ele se aproximou e me deu um selinho nos lábios. Minhas bochechas coraram e eu entrelacei mais ainda nossos dedos.
Kyoko notou o clima desconfortável que ficou no ar e limpou a garganta.
– Mas e vocês como se conheceram?Meu olfato fazia meu estômago revirar-se de fome pelo cheiro de café recém passado e rosquinhas doces que pairava em todo o recinto.
O corredor amplo é repleto de pessoas que zanzam de um lado para o outro, enquanto outras, borbulham de raiva e cansaço pelas pilhas de papéis em suas mesas.
Eu bato meu pé no chão pela milésima vez enquanto encaro a grande janela de vidro que me dá visão da sala de interrogatório da delegacia.
Posso ver Adrien com as mãos sobre a mesa, ele parecia cansado enquanto relatava algo para Tikki e Plagg. A conversa deles estava sendo produtiva, pois já fazia mais de quinze minutos que eles estavam lá dentro.
Encosto minha cabeça na parede e me ajeito em meu assento. Eu queria tanto saber o que eles conversaram! Estava preocupada com Adrien mesmo ele falando que não tem motivos para isso.
– Rosquinha?
Me viro e vejo Kyoko, ainda não assimilei a parte dela ser filha de uma chefa da mesma organização que está me caçando e ela querer depor contra a própria mãe. Mas ao menos sei que ela é minha amiga e não minha inimiga.
Ela devora uma rosquinha de chocolate e me estendendo uma de cobertura de morango.
Aceito e a devoro faminta. – Valeu. – Murmurei.
– De nada.
– Sabe eu estou feliz por você e Adrien. Você parece fazer um grande bem a ele.
– Obrigada. Ele é um cara incrível.
Fico envergonhada e ela sorri simpática.
Cinco minutos depois, a porta da sala de interrogatório finalmente se abre. Eu corro até Adrien e o abraço apertado e ele retribuiu.
– O que vocês conversaram?
Adrien me olha com ternura e me abraça forte.
– Precisamos conversar.
Eu assenti suavemente e me afastei do loiro.
Tikki, Plagg e Kyoko perceberam que a conversa seria particular e inventaram desculpas esfarrapadas para saírem de perto.
– O que está acontecendo Adrien?
O loiro suspirou fundo e encarou meus olhos. Sua expressão era tensa e preocupada.
– Lembra-se da coisa idiota que eu teria de fazer?
Maneio a cabeça em concordância.
– Olha, eu poderia esconder essa escolha minha de você como absolutamente tudo. Mas… Eu realmente não quero te perder de novo por não te contar as coisas, não vou cometer o mesmo erro outra vez. Por isso eu tenho que te contar…
O observei atentamente, suas palavras apenas fizeram toda minha preocupação se agitar ainda mais. Porém ao menos, eu entenderia pelo o que ele estava passando para ajudá-lo.
– O que tem no pendrive não é o suficiente para incriminar, apenas para prisão preventiva. Eles precisam apenas contratar bons advogados e estarão livres no dia seguinte. Precisamos de mais provas Mari…
Eu engoli em seco, queria entender até onde ele queria chegar com tudo aquilo. – De que tipo de provas? – Indaguei com medo da resposta.
– Marinette, eu vou ter que me mostrar para eles.
– O que?! – gritei, Adrien só pode ter enlouquecido de vez! – Mas de jeito nenhum!
– Mari… – Adrien gemeu frustrado e segurou minhas mãos com ternura. – Eu tenho que fazer isso…
– E sabe o que mais você tem que fazer? Ficar vivo! Isso sim é importante!
– Escute seus instintos, Adrien… É, agora eu aprendi a lição. – O loiro murmurou para si mesmo com a cabeça baixa.
Seu aperto em minhas mãos foi maior, me deixando sentir toda sua tensão. Ele estava tão preocupado e angustiado quanto eu.
Mas mesmo assim, eu não poderia deixá-lo fazer essa loucura. Isso é inconsequente demais, até para ele!
– Eu sei que é difícil de aceitar, Marinette. Mas pense bem, com o pendrive, o depoimento de Kyoko e a confissão gravada que eu vou conseguir, isso vai ser o suficiente para desmascarar eles. Nós vamos ter nossa vida de volta, não vamos mais precisar fugir! Não é isso que você quer?
– É claro que quero! Mas não assim! Isso é arriscado demais, e se algo der errado, Adrien?! Já pensou nisso?
– Se algo der errado, Tikki, Plagg e a equipe deles vão interferir. Eu uso uma escuta, eles gravam e depois prendem todos eles! Mas para isso eles precisam de mim. Por favor, me deixe fazer isso por mim, por você, por nós! Confie em mim, tudo irá acabar bem!
Ele sorriu radiante, esse maldito sorriso lindo e sincero que me desarma toda vez que vejo.
Eu quero acreditar nele, que tudo ficará bem… Mas ainda assim, essa pequena porcentagem de tudo dar errado me perturba. Já experimentei a sensação de perdê-lo uma vez, não quero e não posso vivenciar isso de novo!
Nem ao menos percebi quando as lágrimas desceram descontroladas pelo meu rosto. Seria egoísmo demais querer que ele não faça isso?!
Ao menos uma vez na vida as coisas podem ser fáceis com nós dois?! Reprimi uma risada sarcástica, é claro que precisam. Nada nunca é fácil quando se tem Adrien Agreste como namorado. Mas eu aceitei o preço para poder estar junto dele.
O abraço com força e escondo minha cabeça em seu peito, minhas lágrimas molham sua camisa. Mas ele não se importa.
– Prometa que vai tudo ficar bem, que você vai voltar intacto para mim, sem nenhum arranhão!
Ele respirou fundo e se afastou minimamente, apenas para poder ver meus olhos azuis inquietos.
– Eu prometo.
Assenti e o puxei para mim, colidi minha boca na sua e comecei um beijo necessitado que era igualmente correspondido.
Senti mais uma vez o sabor da boca de Adrien e o seu cheiro. Com medo de que talvez, ele não volte mais para mim.
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O cara do apartamento 27
FanfictionMarinette é uma estudante dedicada da faculdade, uma amiga leal e em suma uma boa pessoa. Contudo, ao conhecer seu novo vizinho - Adrien - que se mudou para ao lado de seu apartamento há pouco tempo. Ela experimenta o inferno na Terra. Tanto pela pe...