PT 2 | Capítulo 17 | Robe branco

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Quando minha tia Katia perdeu a Pamela, ela nem ficava em casa. Ora resolvia o enterro, ora a investigação da morte dela. E ora estava num psicólogo. Talvez não fosse uma boa ideia visitar pessoas que nem estavam lá. Nem física, nem emocionalmente. Talvez ainda nem soubessem o que fazer com o que sobrou da filha.

E a discussão sobre violência recomeçou na TV e em todo lugar, bem como na minha casa:

— Não dá pra confiar mais em ninguém nesse mundo. É realmente uma pena. Duvido se não foi, no mínimo, um caso de estupro e assassinato ou, no máximo, um crime passional muito bem arquitetado, sabe — Marcus soltou, enquanto minha mãe estava na cozinha.

— Eu concordo... Conhecia essa garota, Celo? — ela gritou de longe.

— Sim, mãe... Ela... — só me lembrava do quão ausente ela se tornava por longos períodos. Estaria envolvida em alguma coisa perigosa?

— Ela o quê? — Marcus mutou a TV.

— Não, deixa. Com certeza, vão interrogar outras pessoas e descobrir.

— ...Já entendi. — ele deu aquele riso do tipo série de comédia, apesar de a situação não pedi-lo. — Ela era da pá virada.

— Era, do "Mundo Invertido". — e rimos, tentando tornar a situação menos tensa. — Mas todo mundo gostava dela. Ela não mostrava ser uma garota que gostasse de arrumar confusão pra ganhar fama, sabe... Ela era muito tranquila. Eu espero que a justiça seja feita.

— Bom, eu não a conhecia, então... Sem muitas conclusões no momento. Fico com a sua palavra, mas... como eu aprendi em "How To Get Away With Murder"...

— A justiça é assim. Não tem certo, nem justo. É só a versão mais convincente. — falamos juntos.

— Aliás... — mamãe veio, ficando perto de mim com um pano de prato, sem sequer olhar pro Marcus. — Eu sei quem matou a garota. Foi o professor, sem dúvida.

— É cedo pra tirar conclusões, mamãe...

Sempre parece menos problemático lidar com crimes. Crimes reais, não suicídios. Ninguém tem paciência pra descobrir o que há dentro do coração de uma pessoa pra fazê-la tirar a própria vida. Mas sempre sobram dois, três ou dez anos para lidar com as razões e os personagens de uma boa cena do crime. Se você tirou a vida de outra pessoa, você tem um problema sério, que todo mundo precisa saber pra te "ajudar" (a.k.a. condenar na maioria das vezes, precisa ter um culpado sempre).

Mas a oportunidade de saber um pouco mais sobre a vida dela surgiu.

Geléia me ligou, eram umas 19h. Eu estava estudando pra prova de Geometria.

Oi, Celo — ela disse, ofegante.

— Oi, corredora. Quantos quilômetros?

Ah, cala a boca, dá pra parar de se fingir de pateta por cinco minutos? — ela não sabia ainda, mas eu precisava brincar. O clima estava pesado.

— Desculpa, cara. Que que foi?

Me lembrei que preciso estudar pra Geometria. Mas a pior parte nem é essa. É que eu emprestei minha matéria pra Lena e uma das minhas apostilas, e eu preciso das minhas anotações. E ela está... — ouvi seu gole em seco. — E agora? Estou pensando em ir nos pais dela pedir minhas coisas, mas e se eu estiver sendo inconveniente?

— Olha... — eu realmente queria ver os pais da Lena, a curiosidade estava me matando. — Eu acho que seria uma boa passar lá. Até pra prestar condolências, sei lá. É bom se mostrar à... disposição pra... qualquer coisa que eles precisem. Se quiser que eu vá contigo... — cocei minha cabeça, mas talvez fosse a consciência incomodando. — Ou se quiser, eu te empresto minha matéria, sei lá.

Não... você tem razão — ela respirou fundo. — Mas eu tô morrendo de medo. Eu vi os pais dela umas duas vezes. E não, não é uma experiência muito legal ficar de frente com eles. Aparentemente... Então, vai comigo amanhã?

RascunhosOnde histórias criam vida. Descubra agora