Naquela mesma noite, Jéssica recebeu o convite para ser madrinha. Diferente de todas as outras pessoas que Ana Clara fez a proposta, a amiga deu um grito que provocou uma careta em Otávio e comemorou por toda a noite, jurou diante de todos que se comprometia a estragar o pequeno Tales, dar doces quando sua mãe proibir e comprar jogos violentos para ele. O apadrinhamento só aproximou a amizade de Clara e Jéssica e, mais do que nunca, Ana precisava de toda companhia do mundo.
Otávio encontrou um apartamento bem maior do que o que ela estava morando com Ana Helena. Dois quartos, tinha uma parede de verdade separando a sala da cozinha e ainda tinha uma varanda bem legal. Até que o dinheiro sujo de Tales estava vindo a calhar.
Foi para esse apartamento que voltaram após a consulta mensal, Jéssica estava a ajudando com a mudança e os ajustes dos móveis que comprou. Também estava enchendo sua paciência como era de costume.
– Você sabe que o Otávio está afim de você, né? – indagou Jéssica cheia de audácia em seus olhos verdes.
– Quê?! – a voz de Ana Clara ficou aguda.
– Ah, não se faz de sonsa, Aninha! – repreendeu a mulher estreitando os olhos para a amiga – Eu vi tudo.
– Viu o quê? Ficou louca? – perguntou em tom de bronca.
– O homem não desgrudava o olho de você na minha festa, Clara! – alertou – O cara é solteiro, era uma festa, o que não faltava era mulher bonita e ele ficou te cercando igual um cachorro.
Ana Clara deu de ombros e revirou os olhos.
– O Otávio ainda está reagindo ao luto, tá legal? Ele fez uma promessa para o Tales de cuidar de mim na ausência dele e está se agarrando a isso. – explicou – O Otávio tem esse super cuidado comigo por causa do bebê. Naquele dia, ficou furioso porque eu tentei beber um gole da cerveja dele.
– Amiga, eu tenho 24 anos na cara, não nasci ontem. Até acreditaria em você se eu não conhecesse homem – Jéssica determinou para a decepção de Ana.
– Eu vou dar minha opinião – interferiu Ana Helena com uma vassoura na mão.
Jéssica e Ana Clara pararam a arrumação do armário da cozinha para ouvir o que Helena tinha a dizer, a irmã mais velha de Clara não era de grandes conversas, tinha a timidez da caçula multiplicada por dois.
– Pelo menos uma vez a cada três dias, quando eu vou sair para o trabalho, o Otávio está lá. Ele parece ser o pai da criança, exige ver os exames, está sempre comprando fraldas, esses dois ficam conversando sobre o bebê como se fossem uma família. – apontou para a irmã com desgosto – Isso para não falar do contato físico – acrescentou.
– Contato físico? – perguntou Jéssica com um sorriso nos lábios.
– Ela deixa ele tocar na barriga dela – contou.
– Mentira! – Jéssica exclamou.
Ana Clara puxou uma cadeira para se sentar vendo que a delação premiada de sua irmã seria longa.
– Por baixo da blusa! – enfatizou.
A loira desviou do olhar chocado e da boca aberta de sua amiga.
– Fora os abraços, o beijo na testa, os beijos na barriga... – Helena pontuou em seus dedos.
– E só! – Ana Clara interferiu com os braços abertos – Vocês se esquecem o quão importante o Tales foi na minha vida e na dele, a gente ainda está de luto, a gente se abraça porque ainda estamos tristes. De cada cinco conversas que nós temos, duas são sobre o bebê e duas são sobre o Tales. A gente chora a morte dele até hoje. – discursou enfezada – E eu não nego que eu estou carente, eu me sinto sozinha, eu fico feliz quando ele pede para falar com o bebê. Que mãe não fica feliz de ouvir que seu filho é amado, esperado, bem vindo...? Eu não tenho o pai do meu filho aqui para fazer isso, eu só tenho o padrinho dele.
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O que você deixou para trás
RomanceTales passou a vida buscando aventuras e liberdade sem parar para perceber todas as coisas boas que o cercavam. Otávio passou a vida arrumando tudo o que o melhor amigo bagunçava e, com a morte dele, não foi diferente. Mesmo vivendo a maior dor da s...