Outro mundo

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Levaria um tempo até que Bright se acostumasse com um Win viciado em café. Não era um simples gosto por aquela bebida, o detetive era literalmente doido por ela, começando pela caneca cheia até a borda na parte da manhã, fora os copos na delegacia que Bright não fazia ideia de quantos eram e então à noite, depois do jantar. Era o pior remédio para a ansiedade e Bright poderia muito bem pedir para que ele fosse com calma, mas então ele olhava o rosto de Win e esquecia o pensamento, a fala, o próximo passo, porque quando olhava para ele só conseguia pensar em como um ser humano comum era tão essencial para si.

— Eu agradeço se você parar de me encarar, Bright.

— Você é tímido? — Win escondeu o sorriso atrás da caneca, engolindo mais alguns goles do café que o próprio Bright fez para vê-lo sorrir quando acordasse, embora ver Win sorrindo na parte da manhã fosse quase uma missão impossível. Não que acordasse mal-humorado, ele só precisava de um tempo até entender quem era e o que estava fazendo naquele mundo. — Que fofo.

Tomar café da manhã com outra pessoa não era uma novidade porque estavam fazendo aquilo há alguns meses depois de começarem a dividir o mesmo teto. Acontecia apenas nos quase raros dias de folga do detetive, quando ele não precisava correr apressado até a delegacia atrás de um caso de última hora. Então ele se sentava na mesa da sala com Bright, colocando torradas e uma garrafa de café no meio dos dois. Era tudo muito simples, mas muito incrível, exceto quando Bright resolvia provocá-lo naquele horário tão cedo, o observando na cadeira próxima, entendendo que o detetive não gostava de conversar quando acordava. Naquele dia, porém, Win escolheu um assunto para conversarem. Um assunto que fez Bright parar por um momento para se recuperar e se perguntar se havia escutado com clareza.

— Como foi a sua infância? — O café havia acabado, então a caneca estava na mesa e agora Win encarava Bright frente a frente, o deixando sem jeito com um assunto delicado. Bright era sensível demais e todos os assuntos da sua vida eram delicados, mas aquele em questão, ele poderia considerar a pior parte, porque tudo na sua infância havia sido bom e saber que não voltaria àquela época mexia consigo de uma forma não muito boa. — Eu sei sobre o seu passado, sobre os seus pais, a parte em que tudo começou a dar errado. Mas e quanto a infância?

— Eu devo ter contado a você sobre ela em algum momento. — Desconversou.

— Não, lindo. E eu sou todo ouvidos.

— Por que você resolveu me fazer essa pergunta, Win? — Estava se mostrando nervoso. Falar de qualquer parte do seu passado sempre o deixava daquele jeito.

— Você sabe que eu fui até o orfanato há algumas semanas. Lembra? — Bright assentiu. Win continuou. — Ver todas aquelas crianças sem um lar me fez pensar... Que tipo de memórias elas vão ter quando estiverem adultas? Fiquei com algumas coisas na cabeça depois disso e quero saber como foi a sua infância.

— Entendi. — Pensativo, Bright compreendeu todo o contexto da pergunta que antes achava não ter fundamento. Não soube como começar a responder, porque eram muitas memórias onde ele sempre estava sorrindo. Não se lembrava de tudo, mas alguns momentos ainda estavam claros em sua mente. — Foi uma época feliz. — Era aquilo que representava da melhor forma a sua vida quando era uma criança. — Sei que na época o quadro da minha mãe não estava avançado. Ela já tinha indícios de depressão, mas não ao ponto de não levantar da cama ou não se alimentar, como quando eu estava mais velho. Ela fazia um esforço para ficar bem.

— E o seu pai?

— Ele não percebia que a minha mãe tinha problemas. — Preferiu não encarar Win. Olhar o quintal verde pela janela o ajudou a refletir melhor. — Então eles tinham um casamento bom. Sei que relações não são perfeitas, mas, pelo que eu lembro, e dessa parte eu lembro muito bem, nós saíamos juntos muitas vezes e brincávamos todos juntos. Fazíamos tudo juntos. Tenho uma memória muito viva, onde eu, minha mãe e o meu pai estávamos em um parque de diversões, aqui em Cleveland, quando decidimos viajar por um final de semana. Eu estava prestes a completar nove anos.

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