25.

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Camila

— Entre… — ofereço passagem ao homem que não desgruda os olhos sérios de mim. Parece saber que o que tenho a dizer vai mudar a forma como me enxerga.

Não consigo enfrentá-lo por mais tempo. Viro-me e ando para a sala sentindo o peso do que vou lhe contar. Sua presença silenciosa vem atrás de mim, me seguindo.

Sento-me no sofá, cabeça baixa, e respiro bem fundo. Não é algo fácil de dizer, talvez por isto eu não fale, mas mesmo que eu viva cem anos esta parte da minha vida sempre me acompanhará. Eu teria feito melhor, se pudesse. Voltaria no tempo e agiria diferente. Contudo, nada disso é possível.

— Há algo que você precisa saber sobre mim, Shawn — a distância em minha voz não é planejada.

Ele senta-se ao meu lado.

— E, pelo jeito, você pensa que isso mudará a maneira como me sinto sobre você — não é uma pergunta. Seu tom sustenta uma confiança tranquila, difícil de derrubar (eu só não sei por quanto tempo).

Sorrio, sem vontade. E olho bem no fundo de seus olhos.

— Talvez sim.

Encaramo-nos profundamente por um tempo.

— Eu já fui casada.— revelo, sem quebrar nosso contato — E tive uma filha…

Filha.

Esta palavra ainda é dolorosa de pronunciar. Tenho de segurar minha garganta para tentar amenizar a sensação de queimação.

Fecho os olhos e viajo de volta àquele lugar que se parece como um sonho ruim, o pior que alguém poderia ter.

*

Sentada na poltrona do quarto de Clara, confiro o relógio digital na base da babá eletrônica. Já se passa das três da manhã.

Esfrego meu rosto, exausta. Estou há mais de quarenta e oito horas sem dormir, vigilante… pois a cada vez que fecho os olhos por mais de cinco minutos, tenho a falsa impressão de escutá-la chorar. A ausência de sono está me confundindo, acho que esta é a verdade. Sinto-me uma bagunça.

Confiro meu celular para ver se há alguma ligação ou mensagem de Lucas. Desde que ele foi à esta convenção, na quinta, ainda não nos falamos. Eu gostaria que ele estivesse aqui… na verdade, eu gostaria mesmo era que as coisas voltassem ao normal entre nós. Sinto que ele tem me evitando, e...Chega, não posso enlouquecer, é provavelmente uma fase de adaptação.

Essa gravidez veio de maneira inesperada, foi uma surpresa para todos nós. Acho que ele ainda não teve tempo de assimilar, passou praticamente minha gestação inteira entre uma viagem a trabalho e outra.
Estamos juntos desde o colegial, sempre apoiamos os sonhos um do outro, foi assim que o segui para vir morar num país onde não conheço ninguém, longe de meus irmãos, dos nossos amigos, de todos. Era uma grande oportunidade para seu início de carreira. Certo, não contávamos que eu engravidaria, mas Clara está aí, agora temos uma linda bebezinha. No final, as coisas vão se encaixar, eu sei que sim.

O som agudo de seu chorinho me faz saltar da poltrona novamente. Vou até o berço e a retiro dali, coloco-a descansando no meu ombro para acalmá-la, conforme a enfermeira recomendou.

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