Shawn
Sirvo-me na máquina de café. Uma dose forte para combater o sono a esta hora da manhã é mais do que bem-vinda. A cidade nunca para, mas, estranhamente, hoje o movimento parece menor.
Eu deveria aproveitar o raro intervalo de descanso para ir ao escritório do maldito advogado de Francine, ouvir a proposta que ele diz ter. Seja lá o que for, Ellie passar qualquer tempo com aqueles dois está absolutamente fora de cogitação.
— Você viu o noticiário? — Diana pergunta, enquanto enche seu próprio copo, elevando o queixo para a pequena televisão ligada na copa do batalhão.
Na tela, uma reportagem sobre o festival de música que acontecerá na fronteira do estado. Quatro dias de festa com público estimado em trezentas mil pessoas. A reportagem dá conta dos problemas envolvendo o número de adolescentes que passaram mal na edição anterior, comumente pelo excesso do uso de drogas que correm livres em eventos assim. O secretário de segurança pública, entrevistado no momento, fala das medidas adotadas para assegurar a integridade física do público. Haverá reforço no policiamento e no pronto atendimento médico...
— Isso vai refletir na gente — ela lamenta.
— Bem, já refletiu — o velho Raled se pronuncia, escorado contra a porta de entrada. Não notei sua chegada antes — Bom dia, senhores.
Diana lança um olhar pra mim e volta a encarar seu copo.
— Bom dia, chefe.
— Chefe — aceno de volta.
O sargento retira um copo de isopor da pilha e o abastece quando Diana desocupa a máquina.
— Acabo de receber uma ligação da secretaria de saúde. Querem-nos reforçando este evento. Todo o batalhão foi convocado.
— Mas e como ficarão os atendimentos aqui?— minha colega questiona, tomando a bebida quente.
— Os chamados serão transferidos para o 43º.
— Eles ficam do outro lado da cidade —observo o evidente.
O chefe adoça seu café com excessivas três colheres de açúcar.
— Nem me diga, filho. Argumentei isso, mas ninguém se importa. O governador só está pensando em sua reeleição e este prefeito obedece a tudo sem questionar.
Reflito por alguns instantes, assimilando a notícia. E então me dou conta de que há um pequeno problema nisso. Mari viajou há uma semana, minha irmã e mãe estão fora da cidade. Tenho Camila, mas não sei se ela...
— Chefe, eu não posso me afastar agora —nego — Ellie ficará sozinha.
Raled Saleh absorve a bebida, pensativo. A ideia também é ruim para ele, reconheço quando o velho está descontente com uma ordem.
— Deixe-a com Nadja, se quiser, Shawn. Minha esposa adora aquela criança. Serão poucos dias. Dependendo de como estiver lá, eu te libero para que retorne antes — ele bate em minhas costas— Precisamos de todos cobrindo aqueles jovens irresponsáveis, filho.
Comprimo meus lábios. Deixar Ellie com Nadja não é uma opção. Apesar de eu gostar da esposa do chefe, minha filha não a conhece direito.