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Demorei muito?

Ouço canto de pássaros.

Eu nunca tinha ouvido canto de pássaros no meu antigo apartamento. O limbo entre o consciente e a inconsciência brincam com os meus sentidos, mas eu sei que posso ouvir pássaros. Há um parque em frente a janela da sala, e deve ser por isso que eu estou ouvindo-os cantar. 

Abro os olhos lentamente, dando algumas piscadas para tentar me acostumar com a claridade e percebo que preciso comprar cortinas também. A consciência me atinge e me lembro de que estou no colchão na sala. Pisco mais algumas vezes e apalpo os lados tentando buscar por Harry, mas não há ninguém no colchão comigo. 

Estou sozinho. 

Me levanto do colchão com uma certa relutância sentindo meu corpo inteiro dolorido e olho em volta, tentando buscar Harry em algum canto desse apartamento, mas ele não está em lugar nenhum. 

Vejo o relógio da parede da sala marcar oito e meia da manhã e sei que ele deve ter saído a pouco tempo. Não contenho o sentimento de decepção por saber que ele nem se deu o trabalho de me acordar ou despedir de mim.  

Me jogo de volta no colchão e suspiro alto. O atrito faz com que eu sinta um cheiro que não é meu na fronha. É dele. O cheiro que exala dos seus cabelos ficou preso ao travesseiro, e percebo que isso é a única  coisa dele que terei ㅡ seus rastros. 

Tento pegar no sono novamente, mas meus pensamentos estão bagunçados demais e minha cabeça dói tanto a ponto de não me permitir fazer isso. Me levanto e vou até a cozinha percebendo que as duas xícaras estão lavadas e a garrafa d'água que deixei ao lado do colchão está vazia em cima da pia. Tento não pensar na noite de ontem, mas é inevitável. 

Eu não deveria me sentir como eu me sinto agora. Tenho a sensação de estar em um trilho esperando que um trem me atinja em cheio. Ouço o apito ao longe e sei que ainda tenho tempo de me salvar, mas eu simplesmente não me movo… eu apenas espero o impacto. 

Neste momento, tudo o que eu deveria fazer é dar um tempo para mim, para os meus sentimentos e tentar compreender a vida sendo só. Mas, no fundo, eu sei que não é isso que estou fazendo. Sinto como se eu finalmente estivesse saindo de uma piscina, onde estava me afogando, para ir em direção ao mar, onde eu sei que não tenho chance nenhuma. 

Faço um café e vou até à janela da sala fumar um cigarro. Talvez Niall tivesse razão quando me disse que eu não faço nada além de estar preso atrás de telas de computadores. Minha vida é monótona. Mesmo tendo algumas reservas financeiras, eu não faço nada da minha vida. Eu não viajo, eu não saio, eu não me divirto. Eu nem sei ao certo o que é ser livre.

É aí que eu caio em mim de que eu e Harry somos diferentes demais. Enquanto ele é livre por inteiro, eu vivo procurando um canto para me esconder.

Eu sempre fui assim. Eu gosto da tranquilidade de uma vida sossegada. Eu gosto da ideia de ter alguém, de uma vida a dois, eu gosto de ser monótono. Sei que isso não anula o fato de que eu poderia sair mais, viajar mais, viver mais… mas isso também não me incomoda. Eu faria todas essas coisas se eu tivesse alguém para fazê-las comigo.

James era parecido comigo neste aspecto, tirando o fato de que ele vivia bem mais do que eu ㅡ inclusive na cama de outros homens. Sua diversão provavelmente era se deitar em outras camas e se deliciar com outros corpos sabendo que eu estaria em casa esperando quando ele quisesse voltar para a vida comum e simples.

Penso nisso e me lembro de que tenho coisas a fazer além de ficar divagando sobre o caos que está sendo os meus dias.

Apago o cigarro e me sento na mesa, abrindo o meu notebook. Procuro o site da polícia e começo a preencher um pedido de ordem de restrição. Me espanto em saber que eu ainda sei os dados de James todos de cor, e poderia apostar a minha vida que ele não sabe nem metade dos meus.

Backfire [L.S]Onde histórias criam vida. Descubra agora