LIVRO 01
Um casinho em uma noite sórdida com um homem sedutor deveria terminar em ambos seguindo cada um a sua vida. Desde os primórdios da humanidade duas pessoas com desesperança e desejo se encontram e, deste encontro, surge uma história única qu...
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Um dia comum como qualquer outro.
A neve inundava as ruas de Mount Charleston, e eu observava ela através do vidro do resort enquanto tentava escrever qualquer coisa que me fosse capaz. Eu tinha uma cliente, Lilian, que era minha cliente justamente por que me pedia contos personalizados todo ano para o seu aniversário, e ela insistia em ambientá-lo sempre em neve e florestas. Se a grana era boa, por que não aceitar? Lilian sempre reservava o mesmo quarto nesse resort faziam dois anos, quando ela me achou na internet. Era tipo um fetiche de mulher rica, e eu a admirava por aquilo.
O telefone tocou e me tirou do transe descritivo, nele eu narrava como Lilian vivia seus desejos mais obscuros com sua parceira Tiffany, e até mesmo eu me senti de coração partido naquele instante. A cena estava ficando boa demais e eu talvez não conseguisse recuperar o pique de onde eu havia parado.
- Hum? - murmurei, espiando a tela do computador por cima da lente fina dos meus óculos, mexendo no mouse de um lado para o outro enquanto tentava desfazer o erro de formatação qe eu cometi.
- Mallory, oi. Sou eu, Michael. - a voz pigarreou quando eu não a respondi, absorta no meu problema. - Você está em casa?
- Não. - falei casualmente, levando a xícara de chocolate quente aos lábios e bebericando um gole.
- Estou em Nevada com meus pais, gostaria que você os conhecesse.
Naquele momento eu engasguei e derrubei um pouco do chocolate pelo nariz no suéter branco que eu usava, tossindo desgraçadamente enquanto abanava meu rosto com uma mão e um funcionário alerta vinha me perguntar se eu estava bem.
- Desculpe. - apontei para o telefone enquanto tossia e me abanava. - Foi pro buraco errado.
Ele pegou um pano e limpou o chocolate que havia respingado na mesa, se retirando em seguida com suavidade.
- Mallory? Mallory?
- O que foi que você disse? - perguntei, imaginando que aquela frase foi só uma coisa da minha cabeça.
- Meus pais e eu estamos em Nevada, quero apresentá-los pra você. - repetiu Michael, a voz mais baixa do que normalmente falava. - Mas primeiro eu queria encontrar com você pra conversarmos pessoalmente.
- Você tá ficando maluco Michael? - sibilo, olhando para além da paisagem da janela. - Eu não quero conhecer seus pais.
- Me diga onde você está e eu vou até aí sozinho para conversarmos, estou deixando eles em um resort que a minha mãe adora e então...
A voz dele foi ficando cada vez mais ecoada, como se estivesse em um corredor aqui do resort mesmo.
- Qual o nome do resort? - perguntei, me virando ao ouvir os burburinhos da recepção se tornando mais próximo do saguão.
Ele estava usando um casacão enorme por cima da roupa de alfaiataria refinada e, quando me viu, os olhos da mãe dele foram como águias e voaram na minha direção também.
Michael pareceu não saber como reagir por cinco segundos além de acenar e caminhar na minha direção quase como se estivesse sendo congelado aos poucos. Eles todos se aproximaram e só então o celular saiu da orelha dele, este que adquiriu um semblante nervoso e esquisito.
- Mal, que surpresa agradável que você resolveu nos fazer. - ele pegou em minha mão, me ajudando a levantar mesmo que eu não precisasse de ajuda. - Estava com saudades querida.
Na maior cara de pau do mundo, ele me deu um beijo casto na boca e tocou o tecido manchado do tricot branco.
- É um prazer conhecê-la finalmente Mallory, o Michael nos falou muito sobre você. - disse o homem grisalho e de nariz aquilino.
- Eu sou Maria, é um prazer querida. - a mulher de cabelos brancos diz, apertando minha mão também.
- Vão para o quarto, vou com a Mal trocar de roupa e nos encontramos pro jantar, pode ser? - ele combina aquilo sem eu sequer conseguir dizer uma palavra.
Enquanto os pais dele concordam, eu levanto um dedo em protesto que ele obstruí do campo de visão deles ao se colocar em minha frente.
- Mas que porra...
- Eu posso explicar. - começou ele, se sentando na mesa e perdendo toda aquela postura. - Um bourbon com gelo e refrigerante dentro.
O funcionário era discreto e eu nem havia percebido sua presença até então, e a forma como Michael suspirou sofregamente me irritou demais.
- Pois eu acho bom que você comece a falar e logo, por que eu não gostei nada do que você fez.
Ele se reclinou na cadeira e pegou o drink que o garçom trouxe, tomando um baita gole logo de pegada.
- Eu menti para os meus pais Mallory, eu falei que nós estamos noivos. - Michael despejou aquilo tudo sem sequer me olhar nos olhos. - Por favor, sustente essa mentira por enquanto, pelo menos até o bebê nascer.
- Não. - arfei, falando mais alto do que deveria. - Eu não vou fazer isso, é ridículo.
- Mallory, você não entende.
- E nem quero entender Michael, isso é absurdo. - continuo, batendo com a ponta do dedo na mesa. - Não se atreva a me enfiar em uma coisa como essa, nós não somos um casal, nunca fomos, e nunca vamos ser.
- A minha mãe e o meu pai acham que estamos juntos desde pouco antes daquela noite, que nos conhecemos em uma de minhas convenções em Vegas. - ele pareceu me ignorar, continuando a contar a história. - Eu e você nos conhecemos depois que eu e Emiliana terminamos e uma coisa levou a outra.
- Você está se ouvindo? - eu insisti, abanando as mãos.
- Mal, eu preciso da sua colaboração, por favor. - implora ele. - A minha família é muito tradicionalista, eu sou filho único, nunca vão me deixar assumir um filho fora do casamento.
- Mas isso aí é problema seu. - dou de ombros, exasperada. - Eu nem te procurei pra saber se você queria o bebê ou não, você foi uma coincidência muito grande do destino, mas foi só isso.
- Mas eu quero ele, e ele é meu filho também. - voltamos pra estaca zero, discutindo em tom acirrado e baixo. - Eu quero que ele herde tudo que tem direito, ele merece isso. Mas preciso que você sustente essa merda pelo bem dele, não pelo seu.
- Eu duvido que seu pai vai chamar o único neto dele de bastardo. - cruzo os braços, jogando um verde pra ele.
- O meu pai? Nunca. - Michael ri, fazendo minha fala parecer monstruosa. - Mas os acionistas da empresa sim. Eles estão loucos com essa notícia, isso significa que eu não vou passar a majoritariedade das empresas pra frente, e por consequência ainda vai ser a minha família quem é legitimamente dona dos negócios.
- Eu não entendo isso. - confesso, suspirando de frustração.
- Isso significa que, se eu não tiver um filho legítimo, ele não tem o direito de herdar nada das empresas e os demais acionistas e sócios minoritários vão tomar elas para si. - ele fala com calma, bebendo mais um gole. - Não é só pela tradição, é pelo futuro dele também.
- Michael, isso não é certo.
- Não precisa ser pra sempre Mallory, é só até ele nascer.
Michael me olha com profundidade, e na minha visível dúvida e fragilidade, ele pega minha mão e a acaricia de leve.
- Aí não, também não força. - digo, afastando minha mão dele. - Eu não vou cair nessa.
Pela primeira vez desde que eu me lembrei da existência dele, eu o vi sorrir genuinamente.