COMO CONSEGUIU CHEGAR ÀQUELA LANCHONETE, TÁSSIA NÃO SOUBE. A resposta dada por Patrick foi um choque. Tanta coisa passou pela sua cabeça ao mesmo tempo que ela ficou tonta. Quando deu conta de onde estava, o ex-namorado caminhava em direção a ela com um copo d'água para lhe entregar.
— Tá melhor? — ele se sentou e olhou para a garota na expectativa de que algo fosse acontecer.
— O que aconteceu?
— Bom, a gente estava conversando ali na rua e tu do nada ficou branca. Pensei até que fosse desmaiar.
— Acho que peguei muito sol, sei lá. E essa andança toda... Tomei café muito cedo e... Bem, as coisas que tu me disse — ela segurou o copo com mais força. Tentou beber um gole, mas desistiu. — Afinal, o que o Breno tem a ver com o que tu anda fazendo?
Patrick, que até então estava debruçado sobre a mesa para ficar mais perto de Tássia, assumiu uma posição de distanciamento. Recostou-se na cadeira e bufou de raiva.
— Tem tudo a ver, né, Tássia?
— Como assim? Ele acabou de chegar.
— É, mas agora todo mundo só tem olhos pra ele — e, antes que a garota perguntasse, ele emendou a crítica. — Inclusive, tu.
— Espera, espera: tu tá com ciúmes? Com ciúmes de mim?
— E não era pra tá?
Tássia se forçou a tomar um gole de água. Como previu, o efeito foi o contrário e a garganta ficou seca. Quando estavam juntos, era raro Patrick demonstrar algum sentimento que não fosse a carência de ter a namorada sempre ao seu lado. Pelas lembranças dela, ele só parecia se lembrar de quem ela era quando precisava aparecer com uma namorada à tiracolo, como em almoços e festas da família dele ou em algum evento que porventura fossem. Até nas partidas online, nos chats, ele às vezes fazia questão de dizer que tinha namorada.
"E agora ele me sai com essa?"
— Patrick, eu terminei contigo por causa dos estudos, esqueceu? O ENEM tá batendo na porta.
— Eu sei que não foi só por causa disso... — ele comentou, emburrado.
— E eu te disse claramente que não foi. — Bebeu mais um gole de água. — Agora, o Breno? Faça-me o favor! E outra: qual o problema com ele?
— Ele é... é...
— É o que, Patrick? Bonitão? Tu tá a fim dele?!
Tássia disse da boca pra fora, sem esperar reação alguma, apenas para provocar. Contudo, o garoto empalideceu de um jeito que a deixou assustada. No instinto, ela empurrou o copo d'água para perto dele. Patrick não fez menção de que iria beber, mas precisou retirar a máscara. Ele hiperventilava.
— Tu.... Que conversa... Conversa besta!
— Foi só uma brincadeira. Eu, hein!? Calma! Tu ainda te incomoda por causa daquelas brincadeiras no terceiro ano? — Ele desviou o olhar. — Olha, como o meu pai sempre diz, se o cara sabe quem é e sabe do que gosta ou deixa de gostar, ser chamado de gay não abala ninguém.
— Tu sabe muito bem que não é tão simples assim.
— Por quê?
— Porque... Porque... Porque quando a gente é adolescente, e homem, não é só sobre o puro preconceito, mas, principalmente, sobre provocar o outro.
Tássia segurou a vontade de revirar os olhos. Já estava de saco cheio dessa masculinidade frágil, que para ela não fazia sentido algum. Decidiu prosseguir com o assunto que interessava de fato naquela conversa.
— Afinal de contas, por que essa raiva toda contra o Breno?
Patrick desviou os olhos e pareceu mais interessado no copo d'água. Deslizou-o de uma das mãos para a outra deixando um rastro de umidade no tampo da mesa.
— Patrick...
— A gente já se conhecia. É isso.
— Sério? De onde?
— Eu... Eu fazia natação com um... um amigo dele. A gente acabou se conhecendo nessa época.
— Certo. E daí?
— E daí que ele... ele... — o copo de um lado para o outro parou e o garoto ergueu a cabeça. — Ele é muito chato.
Dessa vez, Tássia não se conteve e os olhos reviraram.
— E onde é que eu entro nessa história, Patrick? — Observou o corpo dele, as mudanças, o corpo, as roupas. — Tu fez isso tudo pra chamar minha atenção, é isso?
— É — confessou. — Eu queria... Eu quero tentar de novo.
A garota compreendeu o que viria adiante. Ofegou em antecipação. Sabia que seria inevitável escutar aquela pergunta. Esticou-se para pegar o copo d'água e bebeu o que restava do líquido de um só gole. O ex-namorado aproveitou o silêncio dela e atirou a queima roupa.
— Tássia, a gente pode voltar a namorar?
Ela não tinha certeza de nada. A face de Patrick lhe dizia que o rapaz também não fazia aquela pergunta com cem por cento de firmeza. De fato, ao invés de um ponto de interrogação, a frase merecia mesmo era um ponto final. Soava mais como uma saída óbvia para um problema, uma solução, do que como uma pergunta.
Ela pousou o copo sobre a mesa, o mundo parecia em câmera lenta. Tinha consciência de que o ex observava cada um dos seus movimentos, ansioso por uma resposta. De repente, ela compreendeu o motivo de brincar com o copo parecer algo tão interessante.
Era mais simples controlar um rastro de água na madeira do que formular uma frase naquele momento.
***
[Eita, a pergunta que atormenta muitas pessoas... Você voltaria? Daria uma nova chance? Não, não parece tão simples assim... Ou é? Tássia se mete em cada uma... Vamos ver qual será a resposta. Oremos!]
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Amor em Tempos de ENEM
Teen Fiction🏆 Vencedor Wattys 2022, Jovem Adulto Às vésperas do ENEM, Tássia, uma garota de 17 anos, se vê diante de uma difícil decisão: terminar o namoro com Patrick, já que o namorado não parece disposto a largar os jogos de videogame para estudar. Contudo...