Discórdia

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Para o desencanto do casal, já numa manhã de uma segunda feira, depois de um domingo tranquilo na nova residência, já havia se instaurado uma briga na casa deles. O motivo era óbvio. Goku descobriu (não pelas palavras dela) que Chichi estava tratando do seu avô. As crianças estavam dormindo cada um em seu devido quarto, no andar de cima, e se aproveitando de que os quartos eram no final do corredor, eles brigavam incessantemente na cozinha, no andar de baixo.
Chichi sabia do seu erro, e entendia completamente o motivo da raiva dele. Mas ele repetia toda hora que ela tinha escondido isso dele, e então uma hora sua paciência foi pro ralo e ela começou a jogar na cara dele coisas que Goku já tinha escondido e ela teve de descobrir sozinha. E então, toda discussão que poderia ser resolvida com um simples pedido de desculpas, virou uma lavação de roupa suja que parecia ser interminável.
— Porra, Chichi, você quer colocar em pauta coisa que a gente já superou há um tempão só pra tentar razão, PORRA!
— Cala a boca, porra, teu filho tá dormindo.
— Eu te pedindo há um tempão pra descobrir quem tá tratando meu avô, e você me escondendo que era só você esse tempo todo? Caralho, não entra na minha cabeça o que se passou na tua cabeça, porra.
— Você também já me escondeu tanta coisa e agora por um erro meu você quer fazer essa cena toda?
— Essa coisa que a gente quer não vai dar certo se você esconde as coisas de mim.
— Então você aprendeu a lição?
— Porra, você não me contou só pra fazer eu me sentir como você se sentiu?
— Se sentir traído? Enganado? Goku, olha aqui...
— Essa porra não vai dar em nada. — Ele simplesmente a interrompe e a deixa falando sozinha, sem tomar o café da manhã e indo direto pro trabalho.
Ela distribui um tapa na coitada da frigideira que seria usada para fazer o café da manhã, mas que ficou apenas no balcão, sem ser usada.
— Porra!
Ela puxa o ar com força e esfrega as têmporas com os indicadores, até sua campainha tocar. A babá, é claro. Ela ainda teria que trabalhar.



O clima no hospital não era um dos melhores, ironicamente. O casal não se olhava, não se falavam, nem mesmo almoçaram juntos. Enquanto Chichi almoçou do lado de fora, no mesmo banco onde ela e Goku costumavam almoçar juntos, Goku almoçou num food truck na esquina. Era torturante para ambos, visto que aquela briga foi estendida por muito tempo, podendo ser resolvida com uma simples palavra. Por mais que reconheciam o erro e que aquela briga era bem desnecessária, o ego ainda era muito grande, e nenhum deles daria o braço a torcer e ser o primeiro a pedir desculpas.
Depois de uma manhã bem desgastante e um almoço conturbado, Chichi saiu da emergência para checar todos os seus pacientes. Nunca tivera que cuidar de tantos pacientes, visto que ela zelava pelos pacientes dela e pelos pacientes de Vegeta. Ao entrar no quarto do senhor Son, teve a surpresa de encontrar Goku no quarto dele, o que não deveria ser uma surpresa. Não é?
— Senhor Gohan, como está se sentindo hoje?
— Bem, querida.
— Tô vendo aqui seus exames, sua taxa de hemoglobina já subiu bastante, e já te coloquei na lista pro transplante de novo. Com sorte, não deve demorar muito, tem pouquíssimas pessoas na sua frente. — Ela se aproximou da cama do senhor Gohan e começou a checar os aparelhos e anotar na ficha dele. — Tá saturando muito bem, pressão tá estável, não tem febre e os batimentos tão fortes!
— O que foi que eu disse, minha filha? Forte como um touro! — O Son mais velho gargalhou.
— Tá tudo ótimo. Mas pra garantir, vou pedir pra enfermeira vir recolher sangue pra fazer um hemograma completo, só pra ver como tudo está. O senhor precisa de alguma coisa?
— Não, estou bem, obrigado!
— Eu vou voltar logo com os resultados. — Ela higienizou as mãos com o álcool em gel antes de sair da sala, sem ao menos olhar para o Goku.
Suspirou cansada. Andou em passos largos até o quarto de Seripa, onde ela estava acamada e para lhe fazer companhia, estava Toma.
— Como está hoje, Seripa?
— Tive dias melhores. — Ela respondeu, usando um cateter de oxigenoterapia.
— Tava vendo aqui sua ficha de como passou a noite, teve muita dificuldade pra respirar?
— Foi como se tivessem colocado um elefante em cima do meu peito. Daí veio a médica e me colocou isso aqui.
— Ainda parece que tem um elefante em cima de você?
— Agora parece mais um cachorro bem grande.
— Já é uma melhora. — Ela anotou na ficha e se aproximou dos aparelhos. — Sua pressão tá estável, os batimentos estão fortes, mas sua saturação tá abaixo do normal. Eu vou aumentar seu oxigênio e vamos torcer pra sua saturação subir.
— E se não subir?
— Receio que terá de ser intubada antes de perder a consciência. Mas não vamos esperar pelo pior, ok? — Tentou dar uma dose de esperança e aumentou o oxigênio. — Precisa de alguma coisa?
— Não, não preciso.
— Eu vou voltar logo pra ver como você está. Qualquer coisa pode me chamar!




Depois de passar alguns minutos conversando com o avô, minutos preciosos para Goku, ele desceu para a emergência. Ainda teria que trabalhar. Problemas pessoais não são desculpas para folgas. Assim que chegou na emergência, foi receber uma mãe que estava aos prantos com seu bebê no colo. Dizia ela, que ele não estava conseguindo respirar. Goku os levou para uma sala de emergência e checou os sinais vitais dele, e de fato, sua saturação estava um pouco baixa.
— Qual o nome dele? — Ele perguntou enquanto preparava uma máscara de oxigênio e colocava sobre a boca e nariz do bebê.
— Chris. Eu sou April. — April era uma mulher afro-latina, baixa e mirrada.
— Eu sou o doutor Son. O que aconteceu com o Chris? — Depois de ter certeza que a máscara de oxigênio não ia cair, o conectou nos aparelhos para ver a frequência cardíaca, a saturação e a pressão arterial. Apesar da saturação estar mais baixa que o normal, o resto estava tudo nos conformes.
— Eu não sei! — Ela deixou algumas lágrimas de desespero caírem enquanto se exasperava pra falar. — Quando eu o acordei hoje depois do almoço, ele não conseguia respirar.
— Ele comeu alguma coisa diferente? Tocou em algo diferente? Teve contato com algo estranho?
— Não, meu Deus, não! Eu sequer recebo visitas! — Uma enfermeira entrou na sala para auxiliar.
— Ok, eu vou querer um hemograma, raio x dos pulmões, tomografia da cabeça, toxicológico, parasitológico, ecocardiograma e um teste de covid. — Doutor Son entregou uma bateria de exames para enfermeira e tentou acalmar, em vão, a mãe desesperada.

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