CAPÍTULO 01: A Branca de Neve e seu dobermann

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Ella Rodrigues

— Senhorita Rodrigues? Senhorita? — Sinto alguém tocando gentilmente meu braço enquanto uma voz soa ao longe. — Acorde, senhorita Rodrigues. Já chegamos.

Retiro a máscara de dormir felpuda vermelha dos olhos e olho ao redor preguiçosamente vendo Antônio sorrindo em minha direção com as rugas da idade aparecendo em volta dos olhos castanhos claros. Sorrio de volta enquanto me espreguiço. Se tem alguém fora da minha família que considero mais que ele, desconheço.

— Bom dia, Antônio! — Coço o rosto e bocejo. Até que não demorou muito. Rapidamente me levanto já desamassando o conjunto de saia curta tubinho e terninho xadrez vinho junto à blusa branca gola alta.

— Bom dia, Ella! Seu pai já desceu e está a sua espera, criança. — Pontua e aceno sorrindo. Tom é um dos únicos que permito me chamar assim.

O senhor Antônio trabalha pra nossa família desde muito antes do meu nascimento, mas só veio ficar conosco depois da morte dos meus avós paternos. Segundo papai, quando ele ainda era uma criança, Antônio já estava lá. Sinceramente, não entendo muito bem o porquê dele não se aposentar.

Às vezes acho que Tom é uma espécie de Alfred do Batman. Rio comigo mesma em negação e me levanto pegando a mochila preta de couro da Louis Vuitton.

Quando já estou andando pelo corredor do jatinho particular, sinto falta de algo... Meus saltos! Volto correndo até meu lugar e pego os Louboutin branco que ficaram jogados no pé da poltrona.

Ai, por Nossa Senhora! Desculpa, meus bebês! — Abraço o salto alto contra o peito, aliviada, e ouço a risada baixinha de Tom. — Ei! O senhor está rindo de mim? — Faço bico, mas ele sabe que estou brincando, tanto que só vem até mim e me entrega a necessaire vermelho-sangue. Rio com ele e pego o objeto de suas mãos enrugadas. — Obrigada, Tom!

— Não há de que, criança. — Aperta minha bochecha e rio ainda mais. Ele é como um avô protetor pra mim.

Desde que apareceu, era ele quem cuidava de mim a maior parte do tempo e garantia que ficasse viva, visto que papai nem sempre podia estar presente por causa do trabalho.

— Estou bonita, vovô? — Ele cerra os olhos em minha direção pelo apelido. Sorrio travessa e dou um girinho para que ele veja a composição do dia.

Sempre que quero brincar com ele de alguma forma, chamo-o assim. O senhor Antônio ficou viúvo muito jovem, então não teve filhos. Por isso gosto de chamá-lo assim... Faz com ele fique ainda mais próximo da minha família do que realmente é. Mas, na verdade, ele também é família para mim e sempre será.

— Hum... Venha aqui. — Me aproximo e ele começa a mexer no meu cabelo. Já que sou mais alta, acabo me abaixando para que fique mais fácil para ele fazer isso sem grandes dificuldades. — Prontinho, querida. Está maravilhosa como sempre. — Abraço-o rapidamente e corro em direção à saída do jatinho. Porém, paro abruptamente ao ouvir a voz de Tom.

— Sabe de uma coisa? Sinto falta do seu cabelo cacheado... — Sorrio nostálgica. Irá fazer dois anos que os alisei.

Não que eu não gostasse do meu cabelo natural. Pelo contrário, eu o amava! Mas queria mudar um pouco e gostei do resultado. Confesso que não pretendo ficar a vida inteira com o cabelo liso e longo. Só enquanto eu não surtar de novo e resolver mudar para outra coisa. Ademais, qual a graça de ser sempre igual?

— Quem sabe eu não apareça com ele um dia, hum? — Brinco sorrindo. Tom ri de volta e me deseja um bom primeiro dia de aula.

— Juízo, Ella! — Avisa e aceno com a cabeça freneticamente. — Ah, não se esqueça: você é uma princesa e ninguém tira a coroa de uma princesa. — Pisca e sorrio maldosa.

Ela é Ella || ✔Onde histórias criam vida. Descubra agora