7-Pergunta de criança

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No dia seguinte, não satisfeita em ter comido a torta de aniversário da Susana, banquei a gulosa justamente na casa do Lucas. Contrariando todas as regras culinárias da sogra, ela tinha feito um bolo de chocolate delicioso. Percebi que, desde que comecei a namorar, estou comendo muito.Preciso controlar minha boca! Não quero voltar a ser aquela garota gorducha dos meus 9 anos.Bom, mas eu estava me fartando com mais uma generosa fatia de bolo quando tocaram a campainha. Era a tia do Lucas com a criança mais fofa que eu já tinha visto.

- Mari, essa é a minha priminha, a Larissa - o Lucas falou todo orgulhoso, enchendo a menina de beijos.

- Oi, tudo bem? Quantos anos você tem?

- Cinco. E você, tem quantos anos?

- Eu? Tenho 14.

- Humm, você tá velha!

Eu e o Lucas caímos na risada. Nunca pensei que ia ser chamada de velha tão cedo.

Ela sentou rapidamente no sofá, com toda a desenvoltura do mundo se apossou do controle remoto da televisão e sintonizou no canal de desenhos animados. Achei engraçado. Não tem muito tempo que aprendi a usar o controle remoto lá de casa. Juro que não foi por lerdeza, mas pelo simples fato de não conseguir chegar perto dele. Até porque o Alex tomava conta do controle como se fosse um tesouro precioso. Ele ficava lá horas e horas, vendo todos os programas sobre a vida dos animais. E ai de mim se pedisse para colocar na MTV!

Voltei para o meu bolo de chocolate enquanto a mãe do Lucas conversava animadamente com a irmã. Até que decidiram ir ao supermercado, que fica logo na esquina.

- Lucas, meu filho, toma conta da sua prima. Não vamos demorar mais do que quinze minutos.

Querendo fazer amizade com a menina, sentei ao lado dela no sofá. Mas não tive muito sucesso na primeira tentativa. Ela estava prestando muita atenção na vida dos insetos que viviam no quintal de uma casa. Fiquei quietinha. Lembrei que detestava que me interrompessem quando estava vendo desenho.

- Amor, você fica com a Larissa cinco minutinhos? Vou tomar um banho rápido pra gente sair.

Concordei. Cinco minutinhos como babá não iam me atrapalhar em nada. E também não conseguia resistir aos pedidos do Lucas, principalmente quando ele começava a frase com "amor". Eu sou uma namorada bobona, reconheço.

Passou o primeiro minuto e o desenho dos insetos acabou. Nos comerciais, a Larissa se virou para mim e começou a falar com aquela voz de criança esperta.

- Ô, Mari... Por que os pássaros voam e a gente não?

- É... porque eles têm asas e a gente não tem.

- A avó da minha amiga da escola morreu. Para onde as pessoas vão quando morrem?

- Elas vão para o céu.

- Mas se a gente não tem asas, como vai para o céu?

Fiquei pasma com a garotinha, sem saber o que dizer. Mas ela nem esperou muito por uma resposta e já veio com outra pergunta logo em seguida.

- Por que o corredor tem esse nome se toda vez que eu vou correr nele minha mãe briga comigo?

- Xi, Larissa, agora você me pegou. Acho que é para você não se machucar, né?

- Por que a corda é grande e o cordão que a gente usa no pescoço é pequeno? Por que gente grande sai todo dia para trabalhar? Por que menino faz xixi em pé e menina faz xixi sentada? Por que comer feijão é bom pra gente crescer? Por que o céu é azul e não amarelo?

Eu já estava tonta com tantos por quês! Será que nessa idade eu também perguntava um monte de coisas desse jeito? Meus pais sempre comentam que eu adorava fazer peças de teatro.Obrigava todo mundo a sentar no sofá, colocava uma roupa bem doida e falava coisas sem sentido. E ai de quem não batesse palmas no final! O rei dos por quês lá de casa sempre foi o meu irmão. E eu, a rainha da comédia.

Cadê o meu namorado que não sai desse banho? Resolvi então virar o jogo.

- Larissa, agora quem vai perguntar sou eu. Você gosta do seu primo Lucas?

- Gosto! - ela bateu palminhas.

- Por que você gosta dele?

- Porque ele é lindo, cheiroso, conta um monte de histórias pra mim e me liga sempre para dizer que está com saudades.

Caramba, a menina me deu uma rasteira! Se me fizessem a mesma pergunta sobre o Lucas,acho que eu não responderia tão bem e tão rápido. Aliviada, ouvi um barulho de chave na porta.Minha ilustre sogra tinha voltado com a mãe da Larissa. Ufa!

- Oi, minha queridinha! Você ficou bem enquanto a mamãe foi fazer compras?

- Fiquei, mamãe! Fiquei conversando com a Mari.

Engraçada a noção que ela tinha de conversa. Fui bombardeada de perguntas e quase não consegui responder nada. Que vergonha. Fiquei intimidada por uma criança de 5 anos. Que mico! Finalmente o Lucas saiu do banho.

- Desculpa a demora, Mari. Vamos?

Dei um beijo de despedida na Larissa e fomos ao cinema. No caminho, o Lucas começou a contar como tinha sido o campeonato de basquete de que tinha participado no dia anterior. Eu olhava para ele e via como a Larissa tinha razão: ele é lindo, cheiroso, me conta um monte de histórias e me liga sempre para dizer que está com saudades!

As Mais - Patrícia BarbozaOnde histórias criam vida. Descubra agora