Cheguei em casa radiante. Meu pai notou assim que passei pela porta. Era muito bom tê-lo em casa por três dias seguidos. Quando ligam para os pais, a maioria das minhas amigas faz a tradicional pergunta: "Oi, pai, como você está?" A minha pergunta é sempre diferente: "Oi, pai,onde você está?"
Minha mãe ainda não tinha chegado para almoçar, mas não aguentei segurar a novidade. Abri a mochila e mostrei o envelope da CSJ Teen para o meu pai. Ele me abraçou de felicidade.
– Parabéns, filha! Eu sei como você gosta de vôlei, e esse é o resultado do seu esforço. Como tudo que a gente faz na vida. Nada que vem muito fácil tem valor, pode acreditar nisso. Você sempre treinou e jogou com vontade e dedicação. Estou orgulhoso de você.
– Posso saber que alegria toda é essa? – minha mãe perguntou assim que entrou na sala.
– Valéria, olha que notícia ótima! – meu pai levantou e mostrou o envelope. – A Susana foi chamada para entrar em um time infantojuvenil de vôlei. Vai ser a grande chance de a nossa filha se tornar uma profissional.
Ela ficou séria e pegou o envelope. Olhou toda a papelada em silêncio.
– Eu não concordo com isso, Amauri.
Meu coração parecia que ia saltar pela boca. Meu pai, que estava sorrindo, ficou sério e apertou os olhos.
– Como assim não concorda? – ele cruzou os braços.
– Esse negócio de jogar vôlei não dá futuro para ninguém. Eu concordei que ela praticasse esportes no CEM, mas isso já foi longe demais. Nós temos duas farmácias para administrar, e ela tem que pensar nos negócios da família. Já basta você, que fica mais no céu do que na terra.
– Não estou acreditando no que estou ouvindo.
– Não está acreditando por quê?
– Esse é o sonho da nossa filha. Ela se esforçou e foi reconhecida.
– Sonho não enche barriga. Aqui diz que ambos os pais devem assinar autorizando. Eu não vou assinar.
Começou uma discussão feia. Eles gritavam e gesticulavam muito. Foram para o quarto e fecharam a porta. Mesmo assim, dava para escutar tudo. Comecei a chorar de nervoso. O cheiro de comida que vinha da cozinha me embrulhou o estômago. Não queria mais ficar ali. Peguei papel e caneta, deixei um bilhete e saí.
Cheguei na casa da minha avó e ela se assustou com a visita surpresa. Deitei no colo dela e chorei sem parar. Ela não perguntou nada, apenas fez carinho na minha cabeça e esperou que eu me acalmasse. Fiquei uns dez minutos assim. Quando finalmente consegui falar, contei o que tinha acontecido. Ela segurou a minha mão e escutou. Eu parecia uma metralhadora, falava sem parar. Até que chegou uma hora que eu cansei e me calei.
– Minha querida, entendo toda a sua chateação. Você precisa se acalmar. Já almoçou?
– Não, estou enjoada. Não vou conseguir comer nada agora.
– Eu tenho um refresquinho de maracujá na geladeira. Vou pegar nem que seja meio copo para você. Vai te fazer bem. Depois, deite um pouco na minha cama. Vou terminar o almoço e quando você acordar estará com fome. Fiz aquele frango ensopado que você gosta.
Tomei o suco e me deitei. A única coisa que me lembro é de ter olhado para o relógio na cabeceira e ter visto que estava marcando 14h10. Ao abrir os olhos novamente, já eram 16h30!
Praticamente desmaiei por mais de duas horas. Senti a barriga roncar. Bem que a minha avó disse que eu acordaria com fome.
Levantei e não encontrei o meu par de tênis. Fui andando de meias pelo corredor quando ouvi a voz da minha mãe. Ela tinha acabado de entrar na sala, e então me escondi.
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As Mais - Patrícia Barboza
Roman d'amourMAIS é a sigla da amizade, formada pela inicial do nome das amigas Mari, Aninha, Ingrid e Susana. As MAIS são alunas do Centro Educacional Machado, no Rio de Janeiro, e são inseparáveis. Tanto que resolveram escrever um livro juntas, relatando suas...