Impulso

5 1 0
                                    

   Júlio estava na janela de seu quarto naquela manhã, o sol estava alaranjado e vindo vagarosamente por detrás da montanha que ficava há uma distância. Ele gostava de ver ao longe os prédios do outro quarteirão que não eram tão altos, mas davam a impressão de região central, ele gostava disso.
  Ele não tirou os fones de ouvido para ouvir o mundo lá fora. Pouco o importava se os pássaros cantavam, se o vento sussurrava qualquer coisa. Não era do tipo que queria fazer parte disso… o mundo.
  Virar a madrugada acordado não era ruim, seus olhos a cada minuto doíam mais, e seu corpo estava gelado porque ele escolhera não vestir uma blusa de frio. Já estava a no mínimo duas horas ali, em pé com suas músicas r perdido no tempo, petrificado pelos pensamentos.
  Em algum momento seu celular despertou, era a infeliz hora de ir à faculdade.
  Com raiva ele desligou o celular porque apertou demais o botão de bloquear a tela. Era um insulto algo o retirar desse momento de calmaria.
  Após murmurar muito, ele finalmente foi se arrumar, e então encontrou sua mãe hoje quando ia saindo pela porta da sala.
  _ Bom dia, filho!
  _ Mãe? Não foi trabalhar ainda?
  _ Júlio, são 7 da manhã… eu só começo às 9 h.
  _ Ah sim, desculpa… Não estava te vendo de manhã, me desacostumei.
  _ Tenho ido trabalhar todos os dias, faço a terapia, e tomo os remédios regularmente.
  _ Mãe, eu não estou dizendo que não está de cuidando agora…
  _ Agora, Júlio César, agora. Mas o que fez ontem foi bem ruim, e estou me assegurando de que você não vai me aprontar algo assim de novo.
  _ Eu só quero te ver bem.
  _ Mas me ridicularizar no meu local de trabalho é a pior forma de ajudar que você poderia tomar.
  _ Você tem razão. Me perdoa… Prometo que vou tentar me controlar, e por favor não precisa de levantar tão cedo só para me mostrar que está bem.
  _ Eu tomo meu remédio nesse horário, você sabe… Vou voltar para a cama.
  _ Isso, descansa mais um pouco.
O jovem saiu de casa com um aperto no peito. Sabia que havia errado, mas também tinha aquela pontinha de certeza, de que todo o cuidado que tinha era para um bem maior.
  Sua mãe provavelmente o odiava por muitas coisas, mas ele não se culpava pois, no momento em que foi decidido que ela seria internada e que passaria boa parte da vida dopada de remédios, para tentar a impedir de tentar cortar os pulsos novamente, ele estava salvando tudo o que ele tinha de mais importante.

  Ao chegar na faculdade ele encontrou com Felícia, e a deu um abraço.
  _ Eu garotão! Que cara é essa?
  _ Amiga, eu não dormi hoje então seja paciente porque estou meio lento.
  _ Você sempre é lento. - Ela riu, e ele tentou se animar ao entrar para a sala.
  Na cadeira ao lado da sua estava Wesley, mudo e cego.
  Não olhou para o lado, não o ouviu quando deu seu primeiro “bom dia". Foi bem difícil manter aquele silêncio pelas 3 aulas que vieram em seguida, até que o sinal os avisasse da pausa para lancharem.
  Felícia se sentava atrás deles, e foi os cutucando para levantarem e irem ao gramado lá fora. O menor se levantou no seu tempo.
  _ Vamos logo, Wesley!
  _ Não sei se quero ir, Felícia.
  _ Mas porquê? Você também está estranho hoje…
  _ Acho que preciso ficar um tempo sozinho, não dormi bem essa noite…
  _ Também!? Você e Júlio estavam juntos, o que é isso?
  O menor a olhou apreensivo, e precisava tomar alguma atitude.
_ Felícia, meu amor… Podemos nos ver lá fora?
Ela olhou para Júlio com desconfiança, mas concordou e saiu da sala.
_ Podemos ir para outro lugar?
Wesley não o respondeu, continuava olhando para a cadeira logo à frente.
_ Não faz isso cara… Vamos conversar, por favor. - Insistiu Júlio.
_ Eu…
_ Wes, por favor. Vamos conversar na biblioteca?
O maior pensou por um minuto, e foi levantando. Ambos estavam com muito sono, e não tiveram pressa para chegar à sala.
  A biblioteca estava vazia, a maioria dos alunos usava livros em PDF, então o local era bem pouco visitado. Entrando, eles se dirigiram a um dos corredores de livros ao fundo, e foram em silêncio olhando para as paredes de livros.
   Wesley não se deu o trabalho de ficar em pé, e se jogou sentado no chão encostando as costas entre os livros de Freud, empoeirados há muito tempo.
  _ Como você está? - Júlio perguntou, se juntando ao amigo, no chão.
  _ Com sono, Júlio. Tive uma noite péssima…
  _ E deixa eu adivinhar quem é o culpado…
  _ Se quer saber, eu acho que estou resfriado e provavelmente com febre.
  _ Você não está com febre.
  _ Você é médico agora?
  _ Wes, não vamos discutir, tá!?
C _ Então o que você quer? Estamos tão cansados, e o que há de tão importante para falarmos?
Júlio respirou fundo, olhou para os lados e se aproximou um pouco mais do outro.
  _ Wesley, você sabe que somos melhores amigos faz tanto tempo… Estou morrendo de medo agora, e eu juro que choraria, se meus olhos não estivessem tão pesados de sono.
  _ Os meus também estão, então vamos dormir.
  _ Me perdoa.
  _ Por? - Wesley olhou nos olhos do outro, e viu que o menor estava chateado.
  _ Caraca! Eu não julguei que fosse tão difícil dizer isso…
  _ O quê? Que você tentou me beijar?
  Júlio arregalou os olhos. Ouvir dessa forma tornou o ato tão ou mais grave do que tinha realmente sido.
  _ Ei ei ei! Não fala assim.
  _ Que foi, porra? Você tentou beijar minha boca, e eu tô tentando entender que merda você estava  pensando.
  _ Desculpa! Foi por impulso…
  _ Júlio você que me desculpa, mas… Impulso seria se acontecesse sem querer. Mas você segurou em minha cintura, eu senti seu aperto, e quando me afastei você segurou mais forte.
  _ Não precisa detalhar tudo, ok!? Eu sei o que fiz…
  _ Então cara? Porque temos de discutir isso?
  _ Eu só quero me explicar, não ficar brigando com você.
_ Não estamos brigando. Eu não estou com raiva só, não esperava isso de você.
_ Mas eu não sou… gay.
Wesley lhe deu um tapa na perna que estava mais próxima.
  _ Uau! Você acabou de inventar o hétero que fica com homens, que incrível!
  _ Wesley! Não faz piada!
  _ Então não venha fingir para mim. Eu sempre soube!
  _ Sabia?
  _ Júlio, você nunca ficou com nenhuma garota perto de mim. Isso não é nada hétero.
  _ Eu só sou tímido.
  _ E eu sou a Beyoncé. Porque não admite logo que tentou me beijar? Cara o que deu em você para fazer isso assim?
  _ Tudo bem eu confesso que… sei lá, eu senti algo estranho naquele dia. Mas prometo que não vai mais acontecer, ok!?
  Wesley ficou em silêncio, isso foi terrivelmente confuso. Eles se olhavam e por um tempo Júlio se esqueceu de toda a conversa desconfortável, e levou seu foco para aqueles lábios vermelhos, estavam tão próximos dos seus… tão próximos.
  _ Eu preciso dormir, estou destruído. - O maior se aproximou, repousou a cabeça no ombro do menor.
  _ Não está com raiva, mesmo?
  _ Hoje não… Talvez depois que eu dormir, consiga refletir melhor que meu melhor amigo estava apertando minha cintura, pronto para enfiar a língua na minha boca.
  Eles riram. Depois um silêncio se estabeleceu e os olhos de ambos foram se fechando, Júlio não sentiu o corpo pois, estava flutuando em um oceano.
  Os peixes lá no fundo faziam cosquinha em suas costas, e a água balançava seu corpo de forma massageadora.

NOSSO PRIMEIRO ASSASSINATO - Parte 1 (Drama Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora