A dívida

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   O dia amanheceu, e Júlio César se remexia bem desconfortável na cadeira de plástico da recepção. Ao seu lado, Sara dormia no colo de Ravi, que pescava no sono por estar virado sem descansar.
  Já se aproximava de 9 horas da manhã, o local havia se enchido potencialmente de pessoas enfermas e feridas. O menor detestava aquele ambiente.
  _ Vocês que estão acompanhando a paciente da sala 08?
  Um outro enfermeiro se aproximou deles, e até Sara se ergueu ao ouvi-lo.
  _ Sim, Felicia! - Disse Ravi.
  _ Bom… Ela já acordou, mas não vai poder ir embora por enquanto. Vocês conseguem comunicar a algum familiar?
  Júlio pensou.
  _ Eu já avisei ao pai dela. Ele está no trabalho, mas assim que conseguir vai passar aqui para vê-la.
  _ Certo. Se quiserem ir em casa, descansar…
  A oferta era bem convincente, mas ninguém queria arredar os pés, enquanto Felicia não estivesse totalmente melhor.
  Um tempo depois, Sara e Ravi foram para fora até um mercado comprar algo para comerem, e não demoraram muito, pois ela logo retornou agitando o seu celular para que Júlio o pegasse. Ele olhou a tela e respirou fundo.
  Era ninguém menos que, Wesley, em ligação.
  _ Júlio César, o que está acontecendo!!? - Ele gritava.
  _ Wes, agora não!
  _ Que história é essa de pronto socorro? Dá para me explicar!?
  _ Não é nada… A Felicia acabou ficando mal, e estamos aqui aguardando sua melhora.
  _ Que diabos você está fazendo fora de casa, Júlio? - O menor tentava manter a calma. Os gritos do outro no telefone podiam ser ouvido pelas pessoas que estavam próximas. _ Eu me lembro bem de ter dito para ficar em casa ontem! Eu sou uma piada para você, Júlio César?
  _ Amor, para de me chamar assim! Eu vou te explicar tudo mas agora não consigo…
  _ Em qual pronto socorro estão?
  _ Santa Clara. Mas não precisa vir, daqui a pouco a gent…
  Júlio mal pode concluir que iriam logo para casa, a ligação foi encerrada pelo outro e o alerta de confusão foi acionado.
  Ele entregou o celular para Sara, que junto a Ravi, o olhavam com cara de pena.
  _ Isso vai dar merda? - Ela o perguntou.
  _ Você conhece ele… Bom, vou lá para fora o esperar chegar, e segurar a fera.
  _ Boa sorte…
  Júlio agradeceu, e foi para a calçada frente à rua, onde se sentou em um pequeno canteiro com grama e algumas flores. Ao menos o sol estava agradável.
  Não demorando mais que 20 minutos, um carro estacionou próximo à ele, e Wesley desceu após pagar o motorista. Se virou e mirou sua vítima, aproximando.
  _ Antes que comece a gritar… Devo te lembrar que estamos na rua, e tem pessoas doentes lá dentro?
  _ Eu estou cagando para eles, Júlio César! Que isso na sua cabeça?
  Wesley, nada delicado, puxou a cabeça do menor para o lado, conferindo o curativo.
  _ Bati a cabeça…
  _ Onde? Porque?
  _ Amor eu não quero falar disso aqui, é um assunto delicado.
  _ Eu fiquei ontem a noite toda tentando te ligar, hoje de manhã… Até receber a notícia de que tinha se ferido. Quer mesmo que eu seja delicado, numa hora dessas?
  _ Quero que você respeite a minha vontade! Você sabe que é escandaloso e vai arrumar confusão, sem pensar duas vezes.
  _ Eu só queria cuidar de você…
  _ Então me dá um abraço!
  _ Vai me dizer onde estava? - Nesse momento Ravi apareceu na porta, e Wesley o encarou. _ Acho que não será mesmo necessário.
  _ Wes, para com isso! Fica do meu lado, porra! - Júlio ensaiou um choro. _ Tive uma noite horrível, e não posso receber um pouco do seu carinho sem tomar bronca antes?
  _ Quem devia estar chorando, sou eu. Você me traiu, Júlio César!
  _ Não! Eu não trai você! Só estava cuidando de alguém que amo, coisa que você não sabe fazer!
  Wesley parecia insultado com essa afirmação, então ameaçou ir embora.
  _ Fique então com quem cuida de você…
  Júlio se levantou, quando o maior começou a andar.
  _ Amor… A Felicia quase foi estrupada! - Ele tentou não falar tão alto. Mais lágrimas escorreram de seus olhos. _ Por favor, fica comigo!
  Sem dizer nada, o maior foi voltando, até acolher Júlio em um abraço apertado e amoroso.
  _ O que vocês estavam fazendo…?
  _ Amor, eu estou tão assutado.
  _ Calma, meu pequeno. Agora estou aqui.
  Ninguém no mundo conseguia trazer tamanha calmaria, quanto ele e seus braços longos e fortes. Wesley o deu um beijo na testa.
  _ Vamos para casa, você precisa descansar um pouco.
  _ Não posso a deixar agora…
  _ Mas a mãe e o pai dela, estão aqui?
  _ Não. - Júlio desfez o abraço. _ Sei que deveríamos os ter chamado, mas não nos sentimos confortáveis em deixar que vissem a filha naquele estado. A mãe dela é super paranóica, você sabe!
  _ Sim. Então vamos aguardar até que melhore um pouco, e então te levo para casa!
  O menor assentiu, e Wesley pediu para ver como ela estava.
  Ele cumprimentou Sara, mas não disse nada à Ravi. Quando chegaram no quarto, se surpreenderam com a amiga com os olhos abertos, admirando o teto. Mas logo os encarou.
  _ Felicia! - Júlio se adiantou. _ Se sente melhor?
  Ela concordou com a cabeça, levemente. Parecia fraca e cansada.
  _ Estamos preocupados. Você se lembra do que aconteceu?
  Novamente ela concordou, e entristeceu o semblante.
  _ Amiga, quer que chame seus pais? - Sara questionou.
  _ Não. - Ela se esforçou para falar. _ Eles não irão saber disso…
  _ Mas amiga… Você passou por algo horrível! Eles tem que saber.
  _ Quero que me prometam.
  Felicia parecia decidida, então os amigos respeitaram sua decisão.
  Ravi se aproximou, e pegou em sua mão. A outra ainda estava com o acesso conectado ao soro.
  _ Felicia… Eu sinto muito. Se em qualquer momento eu imaginasse que aquilo pudesse estar acontecendo, juro que teria impedido de imediato!
  Ela ficou em silêncio.
  _ Não foi sua culpa, Ravi. - Sara o respondeu.
  _ Não. Mas foi culpa do seu irmão, e isso terá consequências! - Júlio afirmou.
  _ Eu sei que todos tem o direito de estarem com raiva dele, e eu também estou. Mas me deixem conversar, e tentar entender o que aconteceu…
  _ Tentar entender, Ravi? Todos nós vimos. Ele pode ser preso pelo que fez!
  _ Mas você pode me deixar apenas falar com ele? Quero sim que ele pague, mas…
  Ravi estava determinado a entender as motivações do irmão, eles se amavam. No entanto, Júlio César e Wesley só alimentavam mais ódio, a cada segundo.
  _ Esse merdinha só quer ter tempo de ajudar o irmão a fugir… - Disse Wesley, o encarando com raiva.
  _ Não é isso!
  _ Então o que é, Ravi?
  _ Júlio, por favor entenda! Ele é meu irmão…
  _ Agora é um criminoso!
  _ Deixa que eu vou quebrar os dentes desse ai! - O loiro se moveu, mas seu namorado o segurou. _ Se não pegarmos Dilan, ao menos nos vingamos de alguém e a dívida está paga! 
  _ Não.
  Todos se voltaram para Felicia novamente. E então ela continuou a falar.
  _ Não. Vocês irão deixar que Ravi vá embora em segurança! E quero que todos me deixem sozinha, agora!
  _ Mas amiga… - Sara não a compreendeu.
  _ Você pode até ficar, mas eles… Os quero fora!
  Ravi, Wesley e Júlio César a olhavam surpresos, de repente tudo parecia confuso. Por não desejar um estresse maior da amiga, foram deixando o quarto em silêncio.
  Do lado de fora, Wesley tornou a ameaçar o outro.
  _ Você e seu irmão iram pagar por isso!
  _ Cara, você nem sabe o que aconteceu! Volta para a sua toca!
  Júlio teve de segurar seu namorado novamente.
  _ Wesley para! Estamos na frente de um pronto socorro!
  _ Ótimo! O atendimento dele será mais rápido.
  _ Não! Ravi vá embora, e vamos descansar em respeito à Felicia!
  O moreno foi seguindo em direção a onde seu carro estava estacionado, e o casal para um ponto de ônibus, onde esperaram até uma condução que os levassem para a casa do menor chegar.
  Um tempo depois, e Júlio César finalmente pode se jogar em sua cama. Wesley o deixou aconchegar a cabeça em seu peito, e então puderam dormir juntos.

NOSSO PRIMEIRO ASSASSINATO - Parte 1 (Drama Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora