Vítima do acaso

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   _ Júlio César. Eu nunca te abandonei meu filho…
  O menor o olhou com desprezo.
  _ Então eu simplesmente estou enlouquecendo, e tudo o que senti foi invenção minha?
  _ Sua mãe disse, foi bem traumatizante toda a situação. Eu errei muito, e também sai ferido.
  _ Todos nós erramos! - Dora pontuou. _ Só que isso não deve ser a única coisa a ser levada em conta, porque nossa família não se resume somente a isso.
  _ Para você não, mãe. Você é fraca!
  _ Júlio! - Ela gritou.
  _ É a realidade! Eu estudo muito e vejo as pessoas por aí… Que outra explicação teria, uma mulher bonita, independente, interessante, descobrir que um homem que sempre chegava bêbado em casa, que largou tudo para ir se aventurar por aí, sem nem pensar na mulher e filho, sem nem dar uma explicação… Ainda o aceitar em sua vida?
  _ Eu amo sua mãe, Júlio! 
  _ Esse amor é fraco. Fraco como o orgulho dela, que ainda te aceita aqui.
  _ Te disse que não tem o direito de ficar me julgando dessa forma. - Dora parecia triste, e decidida. _ Quando me contou que era gay, eu te acolhi tão bem. Onde está a parte em que você é grato e me dá o seu apoio?
  _ Para de falar isso! Não é uma troca de favores! Eu sou gay e você gostando ou não, teria de entender isso hora ou outra. Mas, querer que eu compre essa história de que vocês vão ser felizes juntos…
  _ E estamos tentando, você não vê? - Omar interviu. _ Ao invés de ficar julgando, deveria sim apoiar, e ajudar a gente a concertar a relação.
  _ Ajudar a passar pano para os seus erros… Nao, eu dispenso!
  _ Pelo que vejo, não vamos chegar a lugar algum. - Não é, Júlio!?
  _ Não, mãe. Não vamos.
  Dora coçou a cabeça. Estava com uma expressão de insatisfação enorme, mas seu tom de voz parecia bem posicionado.
  _ Me dói muito ter de fazer isso, e eu realmente não queria ir por esse caminho… Você tem certeza de que não quer cooperar para ficarmos, bem?
  _ Vai mãe, pode dizer…
  Júlio meio que já sabia o que estava em jogo nesse momento. Mas não iria regredir, pois seu orgulho o dizia estar no caminho certo.
  _ Cuidei de você com muito carinho, tentei te ensinar coisas como o perdão, e o respeito… Mas parece que cresceu muito, e agora já está podendo responder por suas ações.
  _ Sou um homem, mãe.
  _ Sim você é! E é por isso que não estou tão preocupada… Quero que encontre outro lugar para morar.
  Aquelas palavras não o feriram, apenas o deram um calafrio na espinha, com o qual soube lidar.
  _ Está me mandando sair de casa?
  _ Estou dizendo que, seu pai e eu estamos nos esforçando para retomar nossa vida. E se você ficar aqui do jeito que está, só vai nos atrapalhar com essa birra toda.
  _ Birra… certo.
  _ Filho, você não precisa sair. Sabe disso! - Omar o encorajou.
  _ Sinto muito por decepcionar vocês. Mas, jamais vou compactuar com esse circo que é o casamento de vocês.
  Dora o olhou por uma última vez, os olhos marejados de lágrimas. Suspirou com pesar, e se retirou da sala. Omar ainda o encarava, mas desistiu depois de um ou dois minutos, deixando o jovem sozinho e explodindo de ódio internamente.
  Ele estava incrédulo, de que sua mãe havia mandado sair da casa em que crescera, para dar atenção ao seu casamento falido. Foi bem pior do que todas as surras que já tomara na vida, reunidas.
  Após alguns minutos, mordendo o próprio braço de raiva, e surtando internamente enquanto ouvia sua mãe chorar no quarto, ele se levantou e seguiu para o seu.
  Muito pouco tempo depois, um carro businou do lado de fora, e ele saiu já todo arrumado e com pressa, entrando no veículo e se jogando nos braços fortes.
 
  Chegando na casa de Wesley, subiram as escadas laterais da pizzaria, e encontraram com o pai do maior que já ia saindo na porta.
  _ O que é isto?
  _ Ele veio passar a tarde, comigo.
  Seu pai encarava o rosto molhado de lágrimas do menor, que nem ousava o olhar nos olhos.
  _ Porque está chorando? O que você fez, Wesley?
  _ Quê? Nada! Porque tudo sou eu?
  _ Porque você é um pestinha!
  Wesley riu, mas pediu passagem empurrando o pai para o lado, eles entraram e fechando novamente a porta, Júlio foi tomado por um abraço apertado e em silêncio.
  _ Seu pai… Parece ser bem maneiro.
  _ E é! Aquele velho é bem mais sociável que minha mãe… No entanto, bem cabeça fechada para alguns assuntos.
  Júlio secou o rosto na barra da sua camisa, e respirou aliviado de estar ali.
  _ Vamos para meu quarto, quero entender tudo.
  Ao chegar no cômodo, o menor se deitou com cuidado na cama, e se aconchegou no travesseiro macio. Wesley veio logo depois de encostar a porta, retirando a camisa e bermuda, para abraçar o namorado semi nú.
  _ Vou muito conseguir me concentrar, com você pelado assim…
  _ Que foi? Quer transar antes?
  _ Adoraria, porque faz um tempinho que não…
  _ Podemos fazer agora!
  _ Não Wesley. Eu não estou com cabeça para isso.
  _ Certo… O que aconteceu, lá?
  Júlio se reconfortou nos braços do maior.
  _ Como te disse… Minha mãe pediu para eu sair de casa.
  _ Mas, como isso aconteceu? Eu li a mensagem só que fiquei confuso.
  _ É que ela disse que está tentando se entender com meu pai, e basicamente a minha presença está atrapalhando eles.
  _ Mas que idiotice! Estava tudo bem, eles já não estão bem?
  _ Sim… Mas eu e ele não conversamos, pelo menos não quando estamos discutindo. A questão é que para ela, o fato de que eu falo as verdades, de que essa volta deles é um erro…
  _ Isso sempre vai gerar um clima, ruim? - Wesley completou.
  _ É. O que não é uma inverdade. Cara eu não sei mais o que fazer…
  _ Ju… Porque não tenta abrir a guarda um pouco? Quem sabe…?
  _ Não diga besteiras! Jamais vou voltar a me dar bem com aquele cara.
  _ Está sendo muito intolerante, não conhecia esse seu lado.
  Wesley se ergueu, e Júlio o puxou de volta para grudarem os corpos.
  _ Sempre que eu puder enfrentar ele, eu o farei!
  _ Mas que comportamento ruim, esse!? Cara você é tão tranquilo no dia a dia. Não tem coragem de meter a mão nos babacas da faculdade, mas é completamente rebelde em casa.
  _ Wes, você está do lado de quem? Poxa, eles são meus pais, é mais fácil de resolver.
  _ Tão fácil, que foi expulso de casa…
  O menor se entristeceu.
  _ Não tenho para onde ir. Pensei na minha tia, mas seria o mesmo que continuar ouvindo sermões e aguentar minha mãe lá, todo fim de semana.
  _ Ela disse quando tem de sair?
  _ Não. Mas também pretendo os deixar o quanto antes, para não dar espaço de gerar outra briga.
  _ Tem razão. Você poderia ficar aqui, mas…
  Júlio o olhou em reprovação.
  _ De forma alguma! Isso não daria certo com os seus pais.
  _ Claro! Eu tenho de conversar com eles, porque por enquanto a casa ainda é deles. Mas pensa que, daqui a pouco tempo eles irão sair mesmo…
  _ Não sei se isso funcionária.
  Wesley pensou um pouco, pegou seu celular e deu play em um música calma, que estava pausada, voltando a reproduzir sua playlist.
  _ Vou te ajudar no que puder, não se preocupa. - O loiro disse, antes de dar o primeiro beijo no menor.
  Ficaram por um tempo se beijando e trocando carícias, até a vontade de fazer sexo os tomou e se entregaram ao desejo.
  Pouco tempo depois estavam relaxados, e suados. Não demorou para que o loiro dormisse, e o menor ficou com seus pensamentos trabalhando.
  Realmente tinha sido pego de surpresa, mesmo que já imaginasse toda a movimentação de seus pais. Sair de casa agora implicaria em ter de apelar para a proteção de seu namorado, que instintivamente o ofereceria abrigo. Tanto para o bem de sua relação, quanto para estar mais próximo e comprovar toda a devoção de Wesley para com ele.
  Passos bem calculados. Júlio era intencionalmente uma vítima do acaso, e isso o libertava de certas responsabilidades.

NOSSO PRIMEIRO ASSASSINATO - Parte 1 (Drama Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora