𝒄𝒂𝒑𝒊́𝒕𝒖𝒍𝒐 𝟑𝟐 - 𝒆𝒖 𝒏𝒂̃𝒐 𝒂𝒈𝒖𝒆𝒏𝒕𝒐 𝒎𝒂𝒊𝒔

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Naomi's POV

Monte Carlo, Mônaco
Sábado: dia de classificatório.

Fato: eu sou um poço de orgulho.

Nem sempre fui assim, e não sei exatamente quando deixei de ser a garotinha que transparecia tudo, mas em algum ponto da minha vida eu me tornei quase profissional na arte de esconder que algo havia me magoado. Às vezes isso me atrapalhava, não vou mentir, mas na maioria dos casos era algo bastante útil - e aquele dia com certeza se enquadrou na segunda opção.

Eu tenho certeza de que tanto Aya quanto Gui desconfiaram que havia algo de errado - me conheciam bem o suficiente pra isso -, mas acabaram dançando a mesma música que eu e o dia correu normalmente. Só que, claro, isso cansa. Ficar segurando a mágoa até ficar sozinha e tudo mais acaba esgotando um pouco nossa energia, sabe?

Por isso, poder andar naquela praia mesmo depois do pôr do sol estava sendo um grande alívio. Poder ficar um pouco sozinha comigo mesma, colocar o pensamento no lugar e tentar entender de uma vez por todas que havia a possibilidade de Lucca e eu termos nascido como água e óleo - não importa o quanto você force a mistura, ela não acontece. Muito pelo contrário: só causa problema e dá trabalho para limpar a bagunça que fez.

Separado era muito melhor.

Longe um do outro e, como ele mesmo havia feito questão de ressaltar, sem qualquer tentativa de acertar as coisas. Enquanto pensava nisso, distraída, fui me aproximando da água e sentindo o vento fresco do mar soprar contra mim enquanto eu esmagava o cascalho sob os tênis. Parei um pouco antes da área em que o mar alcança e me sentei por ali mesmo.

Abracei os joelhos, trazendo-os para mais perto do meu peito para poder apoiar o queixo por ali e observar o jeito como, à noite, o céu e o mar pareciam ser uma coisa só. A faixa de areia - ou melhor, cascalho - era iluminada por uma série de postes de luz amarela, e alguns casais esporádicos se espalhavam por ali.

Era engraçado. Não havia nada demais e ouso dizer que o Brasil tinha muita praia mais empolgante que aquela, mas cada minuto em Monte Carlo parecia um pouquinho mais poético do que o anterior e, conforme eles se passavam, eu entendia todas as letras de quem dizia que Mônaco era a "jóia da coroa da Fórmula 1". É claro que a parte histórica do apelido todo mundo sabia de cor e salteado, mas havia algo a mais em estar ali. Um "je ne sais quoi", como Aya havia definido no idioma local.

Deixei que a paz do local me envolvesse. Não sei quanto tempo se passou, mas quando a risada de um dos casais começou a me alcançar, fechei os olhos para respirar fundo e me concentrar em sentir o cheiro do mar. A maresia soprava algumas mechas do meu cabelo, fazendo com que os fios soltos dançassem pela parte exposta da minha nuca e me causasse um calafrio leve.

Até que a única palavra solta alguns passos atrás de mim fez com que meus olhos se fechassem com mais força:

- Frio?

Toda a porra da paz que tinha me consumido até ali foi embora. Sumiu, evaporou, puff. A ideia de me virar e ver os olhos escuros que me causaram tanto peso no estômago durante todo o dia me deu vontade de levantar e sair batendo os pés para fora daquela praia como a bela criança mimada que um dia eu já havia sido, mas meus músculos pareciam retesados e tensos o suficiente para me obrigar a continuar ali, sentada, imóvel. Não me mexi, tampouco respondi a pergunta inocente que Lucca havia feito.

Água e óleo, água e óleo, água e óleo.

Senti uma parte do cascalho sendo levemente empurrada contra o meu corpo, indicando que o rapaz estava se sentando ao meu lado, e foi o necessário para que meu corpo saísse daquele torpor.

FLYING LAP [HIATUS E REVISÃO]Onde histórias criam vida. Descubra agora