𝒄𝒂𝒑𝒊́𝒕𝒖𝒍𝒐 𝟏𝟕 - 𝒖𝒎 𝒈𝒐𝒔𝒕𝒐 𝒂𝒛𝒆𝒅𝒐

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Lucca's POV

Ímola, Itália.
Sexta-feira: dia de treinos livres.

Julie ajeitava com as mãos nervosas a gola do meu casaco, quase tão ansiosa quanto eu, e vez ou outra as passava pelo meu cabelo empenhada na difícil missão de arrumá-lo.

- Esse fiozinho nunca fica para baixo - ela reclamou, lambendo o polegar que passaria na minha têmpora se eu não tivesse desviado com cara de nojo. - Lucca, pelo amor de Deus, não dá para entrar lá com esse cabelo desse jeito.

- Eu tento deixar isso arrumado há vinte e um anos, não é seu dedo babado que vai conseguir agora - protestei, desviando de mais uma investida da ruiva que tinha os dedos trêmulos.

- Lucca Fontana, vem aqui, deixa eu...

A assessora foi interrompida no meio da própria frase quando a porta ao nosso lado se abriu, revelando um alemão baixinho que, agora, nos observava por trás das grossas lentes dos óculos com uma sobrancelha erguida. Andreas deu um sorriso amarelo, indicando com a mão para que eu entrasse em seu escritório e o obedeci assim que me recompus da pequena luta que tive contra o polegar de Julie.

- Obrigado - passei pelo chefe, olhando por cima do ombro para dar uma última olhada na ruiva aflita antes de a porta se fechar entre nós. - Me sento aqui, mesmo?

- Não precisa, serei breve - ele respondeu.

Isso não era bom. Nada, nada bom.

Na verdade, era tão ruim que o cheiro podre dessa conversa pôde ser sentido meia hora antes de ela começar, quando um dos engenheiros esticou o pescoço para fora do motorhome e gritou "Lucca, Andreas quer te ver!". Daquele momento até o instante em que o loiro se sentou na cadeira à minha frente, eu já tinha pensado em inúmeras possibilidades - e nenhuma delas era tão ruim que dispensasse uma mera cadeira para a minha bunda que, nessa altura, já estava para lá de borrada.

Respirei fundo, entrelaçando os dedos de uma mão na outra por trás das costas, enquanto esperava o homem se ajeitar em seu próprio assento.

- Maeson - uma voz firme por trás da porta chamou por Julie. - Não pode ficar com o ouvido na porta do chefe, né? Vai lá pra fora.

Ouvi alguns passos relutantes se afastarem de mim, e Andreas deu um riso fraco, colocando os cotovelos sobre a mesa antes de falar.

- Vou direto ao ponto, Lucca. A equipe analisou o seu desempenho nas corridas que participou e não estamos exatamente... Como posso dizer? Não estamos felizes com você.

- Sim, senhor - me limitei a responder. - Sinto muito.

- Mas essa não é a maior parte do seu problema - ele suspirou. - O que está te complicando mesmo é que nosso setor de relações externas percebeu que veículos de imprensa importantes no Brasil lhe fizeram críticas duras, o que vai dificultar bastante o processo de atrair empresas brasileiras para o time. Patrocinadores, entende?

- Críticas, senhor?

- Veja você mesmo, não há nada de bom aí.

Andreas conteve um riso cínico, arrastando duas capturas de tela impressas pela mesa até que entrassem no foco da minha visão. Matérias sobre meus dois únicos grandes prêmios na Fórmula 1, ambas assinadas por um nome que me causou um aperto inexplicável no peito.

- Tentaremos lhe fornecer mais alguma sessão de treinos livres até o fim do ano para ver como você se sai com o carro atualizado - ele fechou os olhos com força por um breve instante, como se não quisesse reconhecer que a versão da McLaren M36 que eu havia dirigido não era das melhores. - É provável que você fique sabendo meio em cima da hora, então esteja sempre preparado.

FLYING LAP [HIATUS E REVISÃO]Onde histórias criam vida. Descubra agora