Fantasia e Ciência se beijam

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Ilméria e Hazim



De volta a Paris, dessa vez em Nancy, na Villa Majorelle, Hazim apoiava-se com as mãos em um gradeado, sobre o qual enramavam-se algumas flores. Ele próprio cantarolava baixinho a canção 'When I Fall in Love', que a vitrola cantava.

Uma voz feminina, bem conhecida dele, o chama de volta. No entanto, pelo rubor que tingiu sua face, a realidade soou mais encantadora que os devaneios nos quais estava imerso.

— Ilméria!

— Não está feliz em me ver?

— Estou… quero dizer, estou mais surpreso que feliz. Não que eu esteja descartando a felicidade de vê-la depois de tanto tempo. Eu não ouvi você entrando. Veio pela árvore do quintal?

— Sim. Dheam me mandou em uma missão confidencial e íntima.

Hazim sempre foi firme e resoluto, em todos os aspectos da sua vida. Todavia, quando se tratava de externar emoções, ele sempre se comportava de modo inseguro. E que tremendas emoções ele sentia naquela hora!

— Eu vi que você estava bastante concentrado na música. Estava pensando em uma paixão?_ a velha amiga não havia mudado nada; sempre direta ao ponto e sem cerimônias.

— Ah! Não sei... — Hazim estava agora recostado na grade, apertando-a com as duas mãos. Ilméria chegou mais perto, não se intimidando pelo olhar fixo dele.

— Eu não acredito, Hazim! Você desviou o olhar? Está com medo de mim?

— Não… não — diz ele, titubeando.

— Em quem estava pensando? A quem gostaria de dar teu coração, Prunus Hazim?

Essa pergunta atravessou Hazim mais que todos os milênios que ele já vivera. Ele apenas baixa a cabeça, deixando cair uma lágrima. Ilméria a colhe com o dedo, para em seguida tocar o cavanhaque ruivo, posicionando seu rosto de frente para os olhos dela. Ela segura uma das mãos de Hazim e a beija ternamente.

— Você não confiaria esse segredo nem à mulher que lhe amou desde o primeiro dia que o viu?

Eles entram para a privacidade do cômodo. Agora, ambos choravam. Hazim continuava sem palavras. Sua instintiva reação foi reclinar a cabeça no ombro de Ilméria e chorar copiosamente. Depois de alguns minutos abraçados, ele se volta para ela e lhe diz:

— Todo esse tempo não significou nada pra mim. Mas esse instante com você representou mais desafio e cansaço que milhões de anos. Eu não suporto mais guardar isso sozinho. Por favor, divida comigo esse peso que cala fundo em meu peito!

— Divido — disse isso e beijou-lhe.

Foi a sensação mais libertadora que Hazim sentiu em toda a sua longa vida. Não foi um beijo ardente, ou demorado. Quem os visse, poderia até pensar que estavam sentindo dor. Esse toque de lábios foi como o encontro raro que a fantasia às vezes tem com a ciência. Ambas, amigas muito achegadas, sempre conviveram intimamente, contudo, sem jamais exprimirem os sentimentos mais intensos que as mantinham próximas. Aquele foi esse raro momento: um leve roçar de pétalas macias. Eles se encaravam e acariciavam a face um do outro como se nunca tivessem se visto. Tão opostas; tão diversas; tão proporcionalmente lindas; e, acima de tudo, tão correspondentes, semelhantes, complementares. Apenas um tênue espelho separava os dois rostos, no qual viam refletidos a transparência de seus desejos.

— Desde o primeiro dia que me viu? — Hazim sussurrou a interrogação com um risinho de inocência disfarçada.

— Sabes disso. Tua inteligência me denunciou.

A Noz DouradaOnde histórias criam vida. Descubra agora