A esposa de Nigrus

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Tonka, Avellana e Nigrus



A impressão que o gesto de Nigrus produziu, deixou no coração de Tonka e Avellana, no mínimo, um sentimento de gratidão e amizade. Isso criou entre os três um forte vínculo, que para muitos era bonito de ver, mas não para todos.

Geode, por exemplo, comentou com a esposa sobre a curiosa conversa que Nigrus havia tido com uma flor.

— Que estranho! E você viu que planta era?

— Não deu pra ver. Tinha muito mato em toda volta. Mas de uma coisa te garanto: esse tal de Nigrus parece ser muito solitário, eu diria até amargurado. O porquê, eu não sei.

— Então, talvez seja até bom, que Tonka e Avellana acolham ele dessa maneira. Pode ser que esses sentimentos de solidão desapareçam com o tempo.

— Teve outro detalhe que está martelando em minha cabeça mais que tudo.

— O quê? — pergunta ela, já esperando uma esquisitice.

— Tinha mais de uma sombra.

— Como assim?

— Dava pra ver Nigrus e a projeção da sombra dele. Mas, eu tive a impressão de que havia uma sombra do lado dele. Não sei... talvez fosse apenas o ângulo em que eu me encontrava ou a irregularidade da vegetação.

— Que medonho!

— Foi isso que fez eu me retirar. Não foi uma sensação boa.

Ela pouco adivinhou sobre o assunto. Por outro lado, Geode, no íntimo do subconsciente, deduzia algo que chegava perto da verdade. Pois ele ouviu pessoalmente o tom da voz de Nigrus e viu o olhar de suas expressões. Guardava, no entanto, seus palpites apenas para si. Sendo forasteiro, não queria parecer ingrato à recepção que todos lhe deram calorosamente.

A união entre os três amigos cresceu tanto, que faziam quase tudo juntos, incluindo as refeições. Tonka e Nigrus criaram um forte hábito de sempre irem caçar e fazer a coleta das provisões em companhia um do outro. Avellana ficava com as outras mulheres, com quem fez amizade, tecendo objetos de palha de carnaúba, a mesma palmeira que Geode usou para fazer suas roupas. Inclusive, foi uma das primeiras coisas que quiseram aprender dele. Dessa mesma palha, também aprenderam a construir taperas, depois que uma chuva fora de estação os induziu à necessidade. As cabanas de Tonka e Avellana eram, previsivelmente, ao lado da cabana de Nigrus.

Em um dia costumeiro, em que os dois amigos saíram à caça de alimentos, Avellana chamou algumas amigas para nadarem na lagoa. Tratavam-se de Aysha, Attalea e Azhola, que junto com Avellana, formavam as Quatro 'As', como Geode as apelidou. O belo quarteto gostava muito de natação, e tornaram-se muito boas na prática, especialmente Azhola, que recebeu o nome em vista disso. A lagoa era mais precisamente um igapó de formato indefinido, pois era enredado de ilhotas e montículos de terra, onde cresciam uma vegetação variada, além de muitos braços que vinham da floresta ou que desciam para o extremo oeste. Em uma dessas porções de terra, no meio do alagado, elas resolvem descansar e conversar um pouco.

— Quando tu vai levar a todas nós nesse lugar onde Geode te deu essa pedra? —pergunta Avellana, querendo provocar Aysha.

— Vocês irão começar de novo? Não tem mais pedra nenhuma lá. Se tivesse, ele não teria quebrado a dele para me dar esta — responde Aysha, tocando o pedaço de pedra incrustado de quartzo.

A Noz DouradaOnde histórias criam vida. Descubra agora