Ilméria e Dheam

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Os sorrateiros e a cozinheira



A semana do tão aguardado festejo se aproximava. Todas as províncias foram convidadas. O rei havia solicitado a produção de milhares de pergaminhos, que ele selou com ouro, carimbado pelo brasão de Kayolius.

 No dia seguinte após a conversa animadora entre os cinco amigos, todos partem para Kayolius. Afluíra para a cidade, moradores de cada uma das três comarcas, incluindo um punhado de Canto do Pássaro, que havia se voluntariado em juntar-se na organização dos comes e bebes. O próprio casal, Ticum e Attalea, foram no mesmo dia que a turminha de Ilméria. Havia hospedagem para todos, no castelo, nas casas dos generais ou de parentes e amigos, que ofereciam de bom grado os seus lares.

 A rotina passou a ser bastante puxada. Geralmente trabalhavam com ardor o dia inteiro, até tarde; mas acordavam também tarde, no dia seguinte.

 Depois que ouviu aquelas teorias propostas pelo irmão Caliandro, Ilméria não parou de pensar nas conjecturas e perpectivas. Enquanto participava em confeccionar as decorações, hora e outra, se punha a perder-se em devaneios sobre hipóteses em torno da árvore do penhasco e sobre a anileira. Inia se responsabiliza por trazê-la à realidade.

— Ilméria! É fita dourada, não azul. E você colocou flores azuis naquele vaso. Em que coisa azul você está pensando? — indaga a amiga, premeditando do que se tratava.

— É nisso mesmo que você está pensando. Não paro de pensar na associação que a anileira possa ter com a Noz. Onde você plantou a sua semente?

— Em Ioni; na parte de baixo, é claro. Entra um pouco de luz por uma fresta no teto.

— E ninguém vê essa fresta, ou passa por cima?

— Ela fica no jardim do quarto de mamãe e papai. Ninguém entra lá, além de nós.

— Genial. Gostaria de conhecer mais a dona Glicinia. Ela é uma mulher mais do que fantástica.

— Obrigada! Papai não cansa de dizer isso a ela.

— Onde está Prunus?

— Eu lhe falei ontem, quando estávamos no bar do senhor Ticum. Prunus saiu em uma viagem.

— Aonde ele foi?

— O destino eu não sei. Mas vou lhe contar algo que quase ninguém sabe... Lembra quando Akademus instituiu a realização de um projeto no fim de nossa graduação na escola? Pois é; acontece que Prunus e papai construíram um máquina que viaja debaixo d'água. Ele partiu nesse transporte, que chamou de submarino, através do rio que desagua em Ioni. Isso foi no início do mês.

— Prunus é extraordinário! Fazendo tudo isso na surdina. Não vejo a hora de experimentar esse invento. Já que estamos falando de inventos, vou çhe confessar algo também: eu e Cauã também estamos arquitetando um veículo. Mas esse não será aquático. Será aéreo. Ainda falta muito.

— Isso é o máximo!

— Mas não conte a ninguém, por favor!

— Tudo bem. E onde está Cauabori?

— Caliandro disse que queria mostrar-lhe algo. Saíram os dois cochichando, hoje cedo. Quase nem falaram comigo no café da manhã. Estão aprontando algo também…

— Amiga, você trocou as cores de novo — alertou Inia, com um sorrisinho complacente.

— Não estou conseguindo me concentrar. Acho que vou dormir. Boa noite, 'Ininha' — elas despedem-se com um beijo.

 No caminho para o castelo, enquanto atravessava o jardim, Ilméria ouviu um ruído de conversa em um dos canteiros de palmeiras e helicônias. Ela tentou identificar as vozes, mas o barulho da multidão reunida no pátio dos preparativos confundiram-lhe. Pois ela estava ouvindo três pessoas; uma parecia o inconfundível timbre poçante de Prunus e a fala branda de Caliandro; a outra, porém, ela nunca tinha ouvido; era uma voz profunda e gutural. Na tentativa de se aproximar, acabou escutando algo sobre "voe para a floresta" e "árvore… penhasco". Temendo ser descoberta, a moça saiu pé ante pé, indo se recolher em seu quarto. Mas antes de pegar no sono, ela ficou mentalmente tentando juntar as peças daquele quebra-cabeça. Nisso, acabou sendo vencida pelo sono.

A Noz DouradaOnde histórias criam vida. Descubra agora