Eu te amo, Chloe Beale.

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— Ow! Acorda aí! - Sinto chutarem meu pé, mas viro de um lado e tento ignorar. — Acorda, fia! - Abro os olhos assustada, Stacie está parada com as mãos na cintura, quando a olho, ela aponta para o relógio em seu pulso. — São duas da tarde! - Diz indignada.

— Como assim? - Estou deitada num colchão no chão no segundo quarto da casa de Stacie.

— Como que "como assim"? Assim como os convidados chegarão em poucas as horas e eu nem consegui montar a árvore de natal. Ou você cuida da Bella, ou você arruma a casa. Você prometeu ajudar. - Natal? É dezembro? mas porque é dezembro?

— Ela acordou... - Digo olhando para a porta.

— Eu acabei de por ela pra dormir... - O choro de Bella vem do quarto de Stacie, ela acordou. — Como você sabia disso?

— Eu não sabia. - É claro que eu não sabia, eu me lembrava.

Me levanto e a sigo para seu quarto, o papel de parede antigo, os móveis do quarto e os enfeites de natal... Não é realmente dezembro, é um sonho. Me lembro desse dia, me lembro de tentar distrair uma criança de um ano enquanto a mãe dela tenta vesti-la com roupa de mamãe noela para seu primeiro aniversário. Dezembro, Bella faz aniversário em dezembro.

— Aqui, olha a sua fantasia, vê se vai servir. - Stacie me entrega uma caixa.

— Vai servir... - Digo sem ao menos olhar. Sei que vai e eu odiei aquela fantasia. "Ajudante de papai noel" tem como ser menos humilhante agradar uma criança? Ouvi piadinhas sobre meu tamanho durante a festa inteira, toda vez que alguém me chamava de gnomo ou elfo, eu dizia "duende!" para corrigir como se aquilo fosse me ajudar, eles riam mais. Era pequeno de qualquer forma.

— Okay, então se apressa. Sabe quem eu convidei?

— Nem imagino... - Era tão estranho estar aqui, tão real e palpável, mas eu tinha medo de tocar nas coisas e tudo virar fumaça. Stacie está linda, irradiando vida, mas sua voz ecoa em minha mente como num sonho febril.

— A Chloe. - "A Chloe" digo mentalmente junto com ela. — Ela confirmou que viria, ja pensou se ela trás presentes de Paris?? Tomara que seja um perfume.

Ela não vem. Eu esperei e esperei, olhei para a porta toda vez que ela se abria e me enchia de esperança de que fosse ela dessa vez, mas não era. Chloe nunca apareceu, nem respondeu as minha ligações... Eu me lembro de tudo e a decepção em meu coração também é tão real quanto a mão de Stacie em meu ombro. Me viro rápido ao sentir o toque e tudo se acende, a claridade me cega por alguns minutos.

A minha visão se força para se adaptar, mas aos poucos reconheço o quarto atual, o novo papel de parede, a luz do sol sob os lençóis e por ali entre suas camadas, os cabelos ruivos de Chloe espalhados pelo travesseiro.

Eu acho que foi a primeira vez que sonhei com uma lembrança, ou talvez nunca com tantos detalhes.

Que maneira de iniciar a semana.

Me levanto disposta a colocar o meu planejamento pessoal em prática, Bella é um relógio natural e sempre desperta esse horário, bem antes das sete. Faço questão de passar as primeiras horas do dia com ela para que Chloe possa dormir mais já que passará o resto do dia sozinha aqui.

— Bom dia, minha princesa. - Acendo a luz, Bella está de preguiça em seu berço, porém completamente acordada em seu pijama de carneirinhos.

Troco sua fralda e amo como essa criança acorda de bom humor, ela sorri desde o momento que entro no quarto e isso só melhora enquanto encho ela de beijos na barriga, quando aproximo meu rosto, sua mãos alcançam meus cabelos e ela segura minha cabeça uns minutos.

— Isso é um abraço ou está ensaiando para me dar um mata leão?

Troco a roupa dela, já são sete horas, ainda não sei exatamente como organizar o tempo, mas posso ficar até às oito... oito e pouquinho. Então vamos tomar café da manhã. Ao passar pelo espelho do corredor, vejo como como ela deixou o meu cabelo desgrenhado.

— Feliz? Pareço doida. - Automaticamente penso nela respondendo "você é!" e meio que me ofendo. Crianças são cruéis.

A coloco em sua cadeirinha de papa, corto algumas frutas e faço suco de laranja para ela enquanto a cafeteira passa um café para mim. Coloco babador na pequena e deixo ela tentar comer sozinha, pegando o melão com as mãos mesmo, mas a auxilio para tomar o suco já que ela não gosta de mamadeira desde os seis meses, nem chupeta... nem leite? O que ela quer da vida?
Não sinto fome de manhã e sei que Chloe não toma café preto, então deixo suco e coloco dois pães na torradeira para ela que não demora muito a acordar.

— Bom dia. - A ruiva se anuncia enquanto estou de costas passando geleia em seu pão.

Quando me viro, ela está mais perto do que eu esperava, fico entre ela e a bancada e meu coração acelera com a presença dela como se eu fosse uma adolescente.

— Bom... - Ela beija meus lábios cortando minha fala. — ...dia. - Uow.

— Dormiu bem? - Pergunta e me da um beijo em cada lado da bochecha. É assim a vida de casados? Acho que posso me acostumar.

— Sim, só tive uns sonhos confusos.

— Com a Stacie?

— Como sabe? - A entrego suas torradas.

— Obrigada! - Ela leva até a mesa e se senta perto de Bella, aproveita e limpa a boca da menor. — Você fala bastante dormindo...

Fico muda, não sei se quero falar sobre isso no momento.

— ... algo sobre uma fantasia? - Ela pergunta.

— Oh, é... Você sabe, ela tinha um gosto esquisito. - Disfarço, passo os dedos sob minha sobrancelha sem olhar nos olhos de Chloe. — Eu já vou me arrumar pro trabalho, vocês vão ficar bem?

— Sim, temos muitos planos para hoje, você sabe, vamos comer e dormir várias vezes. - A ruiva ri.

*

No estúdio, deixo minha bolsa numa cadeira ao meu lado, tenho em mãos uma canena e um bloco de notas, apesar de um laptop e um tablet a disposição, as vezes prefiro fazer anotações a mão.
Faço a base de duas músicas com introdução, tempo, batida, gravo uma demo com a minha voz para ver se tudo se encaixa, deixo essa linha de projeção bem suscetível a mudanças.
Checo o meu celular várias vezes durante o dia caso Chloe tenha mandado mensagem precisando de algo e vejo como o tempo tem passado rápido, nem ao menos parei para almoçar. Tenho menos de um mês para preparar dez faixas para o disco, mas por hoje, meu trabalho está terminado.

Me dirijo para casa, meu estômago quase fala comigo de tanta fome, estaciono em frente a casa, vejo as luzes acesas em seu interior e me sinto acolhida. Quando abro a porta me deparo com a cena que quero ter para sempre em minha memória: Bella dando voltas no sofá, Charlie a segurando pela fralda e sendo arrastada pela pequena que não perde o equilíbrio por nada e gargalha com as mordidas em seu bumbum de tanajura e... Chloe. Correndo atrás das duas para garantir a segurança de ambas provavelmente. Dando risada alto e se sentindo tonta por todas as voltas que deram e quando me vêem, as três param de correr e olham para mim, Bella grita, eu juro que ela grita feliz por me ver chegar do trabalho pela primeira vez e eu faço o que qualquer mãe bobona faria, eu acho.

Com os olhos cheios, corro para abraça-las, mas me deixo demorar nos braços da ruiva, escondo o rosto na curva de seu pescoço e enlaço sua cintura, ela passa os braços ao redor dos meus ombros e pousa gentilmente seu rosto sob o topo da minha cabeça.

Sei exatamente quando me apaixonei por Chloe, no primeiro dia em que a vi no Campus de Barden, quando eu tinha dezenove anos. Nunca tive dúvidas que a partir do momento em que ela lançou seu olhar em minha direção, me apaixonei como quem pula de cabeça numa piscina olímpica de cinco metros de profundidade e desde então não tento nadar para cima. Posso dizer que passei todos os dias apaixonada por ela desde então, mas não saberia dizer quando a amei pela primeira vez.

Agora aqui, sentindo o perfume em seu pescoço, sendo abraçada como se fosse o mundo inteiro dela, tão forte que mal consigo respirar, tendo ela de volta inteiramente pra mim, com data, hora e lugar...

— Eu realmente te amo, Chloe Beale.

Bella's lullabyOnde histórias criam vida. Descubra agora