Não muito antes do jantar, naquele dia, depois de tomarmos um drink em xícaras de chá pois não encontramos as taças, Chloe me fez distrair Emily e Bella por uns vinte ou trinta minutos enquanto conversava com Aubrey. Uma conversa particular e apesar de talvez imaginar a pauta, creio que nunca vou saber o que foi dito ali, mas eu não teria coragem de perguntar, pelo menos não depois de ver a expressão de Aubrey quando deixou o quarto, pura preocupação, sorrindo pra disfarçar, se apressando para ir embora, sem coragem de me encarar. Chloe por outro lado, tinha um olhar um pouco vazio, a ponta do nariz avermelhado indica que estava chorando e ao mesmo tempo que me sinto íntima o suficiente para ampara-la, não vejo espaço algum. Sou uma estranha dividindo a casa com outra estranha.
Bree e Emilly se despedem, quiseram ir antes da noite cair e, mais uma vez, somos só nós. Ainda me assusto com a forma em que o silêncio nos espreme dentro dessas paredes, ainda me assusto com os fantasmas das lembranças vividas aqui, mesmo agora com outro papel de parede, os fragmentos de Stacie preechem os quatro cantos dessa casa.
— Chloe... - Ela havia colocado Bella no berço, parou encostando a porta do quarto atrás dela.
— Você pode passear com o cachorro? - A ruiva me pede mansa, as pupilas mais pareciam um buraco negro, vejo meu reflexo ali.
— Claro... - Espera! Eu? Passear com aquela praga?
— Obrigada! Você é um amor. - Ela faz meia volta e se apressa para a cozinha.
— ... que não - Ela ignora.
Eu estava decida a ser prestativa aqui em casa, não queria só trabalhar fora e deixar Chloe com o resto das tarefas, mas passear com o cachorro não estava incluso nisso, posso listar uns cem motivos para não fazer, "primeiro, eu odeio animais, segundo...", me abaixo para colocar o cão na guia enquanto penso no próximo motivo e noto que na cozinha tudo está quieto, não sei o que exatamente a ruiva está fazendo, mas talvez consigo compreender o seu pedido, ela quer um tempo sozinha.
Deixo de listar minhas razões e agora meu pensamento voa longe, flutua em direção a Chloe Beale. Caminho até a porta na frente, a bola de pelos não hesita em me acompanhar, deixo a luz da varanda acesa para nos receber na volta, já que o dia está chegando ao fim em tons de rosa e lilás.Não presto a atenção no caminho, apenas sigo Charlie que lidera o passeio determinada, sem olhar para os lados nem tão pouco parar para cheirar territórios marcados... Cachorros fazem isso, certo? Continuo distraída com os olhos para o céu, para as silhuetas das casas no fim da rua, para a maneira como as luzes amarelas dos postes vem se acendendo uma a uma em minha direção, até que Charlie para e a sinto puxar a guia.
— Vamos! Aqui garota!
Tento chamar sua atenção, mas ela não move um músculo, olhos e orelhas atentas em uma só direção, intrigada, ou hipnotizada... Olho também e estamos de frente a um tronco de árvore, nada muito especial aos olhos, aliás, é um dos mais peculiares até aqui. Mas meu coração acelera. Olho ao meu redor e pouca coisa mudou desde a última vez, na verdade tudo está igual, exceto pela árvore a minha frente que costumava ser o cartão postal mais lindo do bairro, com o enorme tronco e uma sombra maravilhosa, tinha tantas folhas que forravam o chão, foi por isso que queriam corta-la.
Charlie me trouxe até a árvore de Stacie. Elas provavelmente fizeram esse passeio inúmeras vezes, não duvido que minha amiga tenha virado baba de uma árvore, a conheço bem, estava comprometida e envolvida, caso contrário não me faria me amarrar ao tronco por uma tarde inteira em protesto. É... Você conseguiu, salvou a árvore.
Vou para mais perto, uma de suas enormes raízes me serve de banquinho, solto Charlie para explorar e ela circula o tronco várias vezes.
— Ela não está aqui... - Digo para a bolinha como se ela fosse entender. — Idiota.
Respiro fundo, a brisa do outono fazem meus fios de cabelos dançarem no ar, vejo as casa da nossa rua, algumas abóboras acesas em uma varanda aqui e outra ali, folhas secas correndo pelo asfalto. A paisagem é a mesma, apenas a árvore mudou. Sinto um frio na espinha ao erguer os olhos para seus longos galhos tortos e petrificados, sem nem uma folha sequer, completamente seca, a grama alta ao seu redor... grama seca. A árvore estava esquecida aqui há dias, mas parecia estar morrendo como se não recebesse uma gota de água faz anos.
Apoio minha cabeça para trás, Charlie senta ao meu lado.
— É quase halloween...
Começo, o cachorro me olha, mas não estou falando com ele. Tenho Stacie em meu pensamento, sigo com o olhar cada um dos galhos, desenho-os em minha mente.
— Eu seria o que você quisesse dessa vez, se você estivesse aqui, mesmo você tendo um péssimo gosto para fantasias, eu seria qualquer personagem da família Adams ou de Os Flintstones, não seria tão ridículo assim ver a Bella fantasiada de Pedrita... Eu...
O céu gradativamente ganha cores azuis cada vez mais escuros.
— E se eu te dissesse que não doamos suas roupas, que seus anéis ainda estão na cômoda, acharia loucura? Mais, e se eu te contasse que deixar seu chinelo ao lado do meu não se compara a checar o meu celular ou esperar a sua ligação todas as noites, isso sim seria insano?
Fico em pé, de frente para a árvore, me sinto estúpida por querer abraçar o tronco, mas apenas apoio minha mão ali.
— Diria que perdi a cabeça se eu confessar que te espero voltar?
Encho meus pulmões de ar, apesar de toda essa saudade, existe um sensação calma, algo que me faz querer voltar para casa, algo que me diz que estou no lugar certo, seja lá onde isso vá me levar, seja qual for o rumo dessa história que agora não é mais só minha, Stacie me escolheu por um motivo e por elas, por Chloe e Bella, eu reescrevo essas linhas mil vezes, eu não aceito menos que um final feliz para nós.
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Bella's lullaby
FanfictionFamília a gente não escolhe, mas em alguns casos, somos escolhidos. História Bechloe numa realidade alternativa depois dos acontecimentos de Pitch perfect 3, inspirado por Juntos pelo acaso.