Peças do jogo

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O vento estava forte, uma garoa leve regava a floresta do lado de fora. Pela primeira vez, Gyutaro estava pensativo e calmo, uma sensação de estranheza permanecia em seu coração, mas ver Ume agasalhada e dormindo em paz, afastava todos os pensamentos negativos.

Estavam numa casinha pequena e bem arrumada que se localizava no extremo da floresta, há poucos metros de um rio e bem longe da cidade. Gyutaro jamais imaginou que Douma tivesse um lugar daqueles escondido, muito menos que ele os mandaria para lá, afim de ficarem protegidos de Muzan. Quando o loiro apareceu no sótão, o alfa pensou que fosse se iniciar mais uma conversa sem objetivo e cheia de piadinhas, mas o ômega estava sério demais para ser isso.

Douma os ajudou a fugir, lhes deu as instruções necessárias para chegarem até aquela casinha, e não só lhes deu um cobertor e comida, como também se desculpou pelas atitudes de Muzan. Gyutaro ainda se sentia totalmente perdido em relação á isso, aquele tempo todo Douma parecia ser o filho mais fiel do Kibutsuji, mas aparentemente, era justamente o contrário.

- Oni-chan. - Ume chamou se encolhendo dentro do cobertor.

- Que foi, Ume?- Se virou para a mais nova.

- Sai da janela e vem dormir, ninguém vai aparecer por aqui do nada.- A platinada resmungou.

- Mesmo assim, é bom prevenir. E eu não estou com sono ainda.

- Você está pensando sobre o Douma não é?- A beta se levantou, indo abraçar o irmão com o cobertor enrolando os dois.

- É estranho e confuso. - Gyutaro coçou o cabelo verde. - Não faço a menor ideia de quais as motivações dele para fazer isso, quer dizer, ele está indo contra o próprio pai.

- Você não notou nada?- Ume olhou para a lua no céu, brilhando por trás das árvores altas.

Ela havia passado mais tempo no meio da família Kibutsuji do que Gyutaro, já que era uma das faxineiras mais ativas da casa, enquanto que o irmão era o responsável por cuidar dos bichos que Muzan usava em suas "caças".

- O que eu deveria ter notado?

- Douma é um ômega protetor, ele se responsabilizou pela criação dos mais novos quando Sumire morreu, isso diz muito sobre ele. Muzan-sama sempre fez questão de demonstrar que Douma valia pouco para ele, todos viam isso, eu mesma vi isso.

- Então ele quer se vingar do pai por tê-lo rejeitado?- Gyutaro fez uma careta achando a motivação meio ridícula.

- Não, cabeça oca!- Ume deu um beliscão no irmão. - Douma não se importa com Muzan , mesmo sendo seu pai, justamente por nunca ter sido valorizado nem amado. Douma era alvo de violências e xingamentos sempre que algo dava errado, mesmo ele não sendo o culpado. Juntando isso, com o fato dele ser um ômega que protege seus filhotes, ele provavelmente quer tirar Rui, Enmu e Daki dali e criá-los numa vida melhor. Seu burro!

- Eu sou obrigado a ter todo esse raciocínio sobre proteção e mais sei lá o que?

- Você não entende nada de ômegas, é por isso que ainda está solteiro! - Segurou a risada quando o alfa revirou os olhos. Gyutaro não dava a mínima para relacionamentos.

Mergulharam num silêncio sereno, o cheiro de terra molhada e o barulho das árvores se movendo ao vento lhes fazia lembrar de todas as vezes que ficaram expostos aos males da natureza, sozinhos, na rua. Ume seria eternamente grata por todos os sacrifícios que seu irmão fez por si, para protegê-la de todo perigo. Gyutaro era a pessoa que Ume mais admirava no mundo, e ela jamais o abandonaria, não importando a situação.

Gyutaro os guiou de volta para a cama no cantinho do cômodo, deitando de forma a deixar sua irmã confortável. O alfa pensou um pouco mais nas palavras de Ume, se lembrou do olhar cansado que Douma tinha quando os ajudou, como se um peso estivesse posto em suas costas. Todas as vezes que Douma foi no sótão, nunca houve mais do que pratos de comoda e tentativas de conversa, sendo um Kibutsuji, Gyutaro pensou que logo começariam as agressões ou ameaças, mas nada disso veio. Pensou em como ele entendia o sentimento de proteção do ômega, ele também protegia muito sua irmã, ele também sentia aflição sempre que ela estava em perigo.

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