Alfonso, cortês, mesmo com desconhecidos, estranhara a escolha. Dois dias antes do casamento, enquanto Diana falava entusiasmada do vestido de noiva com a mãe, Alfonso parara na porta da cozinha onde Anahí retirava bolinhos do forno para perguntar por que ela não fora escolhida como dama.— Eu? — perguntara Anahí, suando por causa do calor da cozinha onde preparava o lanche da tarde.
Ele franzira a testa.
— Você nunca usa nada além de jeans e essas camisetas? — perguntara, gesticulando com a mão morena. Ela desviara o olhar.
— São confortáveis para trabalhar. — Ela havia percebido que ele a observava enquanto arrumava os bolinhos num prato de porcelana e colocava a fôrma de aço inoxidável na pia.
— Diana não gosta de cozinhar — murmurara ele.
— Imagino que você não se importe em contratar alguém para isso — retrucara, constrangida. Odiava estar na presença dele, mesmo a essa distância, com receio de se denunciar. — De qualquer modo, Diana é bonita demais para perder tempo com afazeres domésticos.
— Você tem inveja dela porque ela é bonita e você não?
O tom debochado da pergunta fizera com que seus olhos azuis cintilassem. Ela quase nunca retrucava, mas ele parecia trazer à tona um temperamento que nem ela se dava conta de possuir. Lembrava-se de ter ficado ereta, olhando-o com o rosto ardendo de calor e raiva, os cabelos loiros caindo em mechas despenteadas do coque no topo da cabeça.
— Muito obrigada por me lembrar das qualidades que não possuo. Imagino que não lhe ocorra que posso me olhar no espelho.
Os olhos falsearam, pela primeira vez, para ela. Os cílios desceram cobrindo o brilho e ele a fitara até seu coração descontrolado bater feito louco.
— Então você não é um capacho? — ele dissera, provocando-a.
— No, no soy — respondera no espanhol perfeito que aprendera na escola. — Y usted, señor, no es un caballero.
Ele arqueara as sobrancelhas diante da afirmação de não ser um cavalheiro.
— Que sorpresa eres — murmurara, fazendo-a corar de novo com a intimidade do pronome só usado com amigos íntimos ou parentes, quando ela usara o tratamento formal.
— Só porque falo espanhol? — ela perguntara. Ele sorrira, pela primeira vez sem sarcasmo.
— Diana não fala. Ainda não. Pretendo ensinar a ela as palavras mais importantes. Claro, aquelas que não podem ser pronunciadas em público.
Apesar dos anos passados, lembrava-se com curiosidade do modo como ele a provocava, falando acerca de seus sentimentos por Diana. Fora assim desde o começo e ficara ainda pior quando o casal comemorara um ano de casamento. Anahí não sabia ao certo o motivo de ter sido convidada para a festa. Planejava não ir, mas Alfonso mandara um carro buscá-la.
Frederico e Elsa vázquez a receberam com entusiasmo na frente dos convidados e, depois, a ignoraram. Diana parecera furiosa ao vê-la e a puxara para o canto durante uma breve ausência de Alfonso, agarrando-a pelo braço com unhas tão afiadas que a arranharam.
— O que veio fazer aqui? — perguntara furiosa. — Não convidei você!
— Alfonso insistiu — respondera por entre os dentes. — Ele mandou um carro me buscar. — As loiras sobrancelhas delicadas da mulher se arquearam.
— Entendo. — Ela soltara o braço da prima abruptamente. — Ele está querendo me dar o troco — dissera com uma risada irritante. — Só porque convidei Larry para jantar aqui em casa enquanto ele operava em Nova York. — Ela estava inquieta. — Bem, ele nunca está em casa. O que espera que eu faça? Fique sentada olhando para o teto? — Os olhos raivosos examinaram Anahí. — Não fantasie que ele vê estrelas quando olha para você, queridinha — continuara agressiva. — Só convidou-a para me fazer ciúmes.
Anahí perdera o ar.— Mas isso é loucura! — exclamara, chocada. — Pelo amor de Deus, Diana, ele nem gosta de mim! Ele me critica o tempo todo.
Os olhos castanhos profundos da outra mulher estreitaram-se.
— Você não entende mesmo, não é? — perguntara indiferente. — Você é tão boba, Any...
— Não compreendo o quê?
Alfonso entrara na cozinha com a expressão fechada.
— Por que se escondeu aqui? — perguntara a Diana. — Temos convidados.
— Temos, não é mesmo? — ela respondera, fitando Anahí.
— Eu devia ter convidado Larry — concluíra.
Os olhos de Alfonso cintilaram furiosos. Diana passara por baixo do braço dele e fora ao encontro dos convidados, deixando Anahí entregue ao mau humor dele. E Alfonso descontara nela.
— A faxineira em pessoa — comentara com frieza, examinando os eternos jeans e camiseta. — Não podia usar um vestido para a festa?
— Eu não queria vir — retrucara furiosa. — Você me obrigou.
— Só Deus sabe a razão — ele respondera, examinando-a novamente com frieza.
Ela não sabia o que dizer. Sentia-se totalmente deslocada. Ele se aproximara e ela recuara. A expressão no rosto dele, impagável. Infelizmente, seu gesto instintivo havia provocado uma reação ainda pior.
— Eu lhe causo nojo? — ele perguntara, aproximando-se até ela encostar-se na pia. — Incrível que uma mulher apagada assim recuse qualquer demonstração de atração por parte de um homem, mesmo de um repulsivo.
Ela estremecera e cruzara os braços defensivamente.
— Um homem casado — completara.
Ele cerrara os punhos, como se as palavras tivessem alcançado o efeito desejado. Não fizera mais nenhum movimento em sua direção. Os olhos buscaram os seus, propondo respostas que ela não podia dar.— Pau para toda obra — provocara. — Cozinha, limpa a casa e cumpre tarefas banais. Nunca se cansa da santidade?
Ela engolira em seco.
— Gostaria de ir embora, por favor. — Ele estufara o peito.
— Para onde? Para longe de mim?
— Você é casado com minha prima — dissera com os lábios cerrados, lutando contra uma atração que lhe fazia mal.
— Claro que sou. Aquela mulher linda, charmosa, de rosto e corpo divinos, é toda minha. Os homens morrem de inveja do que eu tenho. Diana, a divertida e maravilhosa, com minha aliança no dedo.
Anahí engasgara.
— Tem razão, ela é... — A fúria a deixara intimidada. Aqueles olhos verdes pareciam espadas a feri-la. Ele a odiava. Ela apenas não entendia o motivo. Afinal, nunca havia feito nada de mau a ele.
Ele se afastara com aquela cortesia e formalidade inatas.
— Cresci num subúrbio em Havana — murmurara baixinho. — Meus pais deram um duro danado para eu entrar na universidade e conseguir escapar da pobreza. Quando viemos para os Estados Unidos, subimos social e financeiramente, mas não esqueci de minhas origens. Parte de mim não sente senão desprezo por essas pessoas. — Ele acenara com a cabeça para a sala de estar — Todas contentes no ambiente do Country Clube, sem saber como a pobreza pode corromper a alma.
— Por que está me dizendo isso? — ela perguntara. O rosto de Alfonso suavizou-se ligeiramente.
— Porque você conheceu a pobreza — respondera, surpreendendo-a. Ela não fazia idéia de que ele soubesse algo sobre sua vida. — Seus pais eram fazendeiros, não eram?
Ela assentira.
— Eles não se davam muito bem com tia Elsa e tio Frederico — confessara. — Se não fosse o medo da opinião pública, eu teria ido para um orfanato quando eles morreram.
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A paciente (Adaptada) aya
RomanceAlfonso é o último homem de quem Anahí aceitaria ajuda, mas ela estava doente. Como médico, era dever de Alfonso buscar a cura de seus pacientes. Como homem, ele tinha de encontrar um meio de cuidar do coração da mulher que assombrava seus sonhos. S...