capítulo 04

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Ele passou seis dias sozinho nas Bahamas, curtindo a solidão de uma ilha isolada, onde alugara um quarto numa pousada. Andara pela praia lembrando-se dos dias felizes ali desfrutados com Diana na lua de mel. Ainda sentia saudade dela, apesar do relacionamento turbulento.

Percebeu alguns fios de cabelo grisalhos e sentiu, como nunca, o peso da idade.

Deveria se casar novamente; deveria ter um filho. Diana não queria filhos e ele não a pressionara. Ainda tinham muito tempo pela frente. Ou assim acreditava.

O pôr do sol foi particularmente fulgurante, como um quadro pintado por um louco em cores flamejantes, com toques de preto, cortando o céu e descendo até o horizonte como uma faca. Suspirou admirando o céu e ouviu o som das ondas próximo a seus pés descalços. Era doloroso guardar no coração todo esse espetáculo sem ninguém com quem compartilhá-lo. Estava sozinho. Como desejava uma esposa afetuosa e muitos filhos brincando ao redor dele na praia! Talvez estivesse na hora de começar a pensar no futuro e não no passado. Dois anos era tempo suficiente para guardar o luto.

VOLTOU AO trabalho com entusiasmo, assumindo mais obrigações do que nunca. Operava um paciente particular no hospital O’keefe. Logo após uma cirurgia complicada, foi chamado ao CTI para examinar um paciente com quem a enfermeira da noite estava preocupada. Ele tinha três pacientes internados no hospital, além de pacientes no St. Mary e no Emory.

Não ficou nada satisfeito ao descobrir quem era a enfermeira da noite. Anahí, em sua habitual calça branca e jaleco comprido colorido, com um estetoscópio em volta do pescoço e o cabelo preso num coque, lançou-lhe um olhar frio quando ele parou na sala das enfermeiras.

— Não achei que você trabalhasse hoje no O’keefe — disse laconicamente, ainda usando seu jaleco verde de cirurgia.

— Trabalho sempre que necessário. E o que você está fazendo aqui?

— Um paciente solicitou que fosse operado aqui. Faço parte da equipe de três hospitais e esse é um deles — respondeu com igual frieza.

— Eu me lembro. — Ela enfiou as mãos nos bolsos do jaleco. — O seu Sr. Harris está vomitando. Não consegue segurar o remédio.

— Onde está o prontuário?

Ela foi até a porta do paciente, pegou-o da cesta de metal na parede e entregou-lhe. Ele fechou a cara.

— A náusea começou na última troca de turno. Por que não tomaram nenhuma providência? — ele perguntou.

— Algumas das enfermeiras estão trabalhando em turnos de 12 horas — ela o lembrou. — E chegaram quatro novos pacientes hoje à tarde nesta ala, todos em estado crítico.

— Isso não é desculpa.

— Sim, senhor — Anahí respondeu automaticamente, entregando-lhe uma caneta. — Poderia fazer algo agora?

Ele escreveu novos procedimentos e foi examinar o homem, pálido de tanto sofrimento. Saiu esbravejando.

— O cateter foi retirado ontem à noite e recolocado hoje de manhã. Por quê?

— Ele passou oito horas sem urinar. É o procedimento padrão. — Ele a encarou. — Ele está vomitando e sem beber muito líquido. Quanto mais tempo ficar com o cateter, maior o risco de uma infecção. Quero que a tire e só a recoloque até ele reclamar, e se reclamar de desconforto. Entendeu?

— Sim, senhor — respondeu ela.

— Quem pediu para que o cateter fosse retirado? — perguntou abruptamente.

Ela apenas sorriu.

— Esqueça — disse irritado, sabendo que nem mesmo sob tortura conseguiria que ela lhe dissesse quem havia sido. Os olhos fitaram o rosto oval. As bochechas estavam vermelhas, mas o resto do rosto, pálido e ligeiramente inchado. Ele fez uma careta. Nunca notara isso antes. Era o tipo de aparência encontrada em pacientes com problemas cardíacos. Ela voltou a guardar o prontuário.

— Os técnicos de enfermagem estão muito ocupados neste turno. Se alguém pudesse ficar com ele e lhe dar gelo picado, talvez ajudasse.

— Ele não tem família? — perguntou Alfonso, emocionado com a preocupação dela.

— Um filho em Utah. Está a caminho, mas só chega amanhã, é triste.

— Muito. — Ele olhou na direção da esposa de um dos pacientes passando pelo corredor com um copo de isopor e uma jarra de plástico. — Aonde ela vai?

 
Anahí sorriu os olhos faiscando.

— A técnica de enfermagem jamaicana, a Sra. Hawk, disse a ela onde ficam a máquina de gelo e a de café. Desde então ela está ajudando todo mundo. Ela pega até toalhas, panos e cobertas quando precisa, em vez de pedir a alguém.

— Isso é algo fora do comum?

— Bem, tem três outras mulheres que aparecem a cada cinco minutos na porta e nos pedem para dar água aos maridos delas quando eles estão com sede, depois que chegam aqui, vindos da cirurgia.

— As enfermeiras costumavam ter essas obrigações — lembrou-a.

— As enfermeiras costumavam ter mais tempo, menos pacientes, menos trabalho burocrático e não muitos processos judiciais com que se preocupar — retrucou suspirando.

Ele observou-lhe o rosto e voltou a franzir o cenho.

— Você está se sentindo bem? — perguntou, com evidente relutância.

Ela fechou a cara.

— Estou um pouco cansada, como todos neste turno. Obrigada por ter examinado o Sr. Harris, doutor.

Ele deu de ombros.

— Avise se ele tiver mais ânsias de vômito.

— Sim, doutor. — Ela agia de modo educado, mas frio, distante.

A paciente (Adaptada) ayaOnde histórias criam vida. Descubra agora