capítulo: 15

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Ela dormiria a noite toda, ele tinha certeza.

Foi para casa e, num impulso, procurou o telefone de um cirurgião chamado Myers em Macon. Encontrou o homem sem maiores dificuldades. Quando este soube quem estava ao aparelho, ficou atônito.

— Ouvi falar de você — disse a Alfonso. — Você é bastante conhecido. Está ligando a respeito de algum paciente meu?

— A prima da minha falecida mulher, Anahí Portilla.

— Ah, Any — assinalou com um sorriso na voz. — Difícil mandar a menina para a mesa de cirurgia, se entende a que me refiro. Eu visitava um velho amigo num prédio chique em Atlanta há dois anos quando o porteiro encontrou uma jovem desmaiada nas escadas e pediu socorro, depois de ter ligado para a ambulância. Eu a examinei e acompanhei-a ao hospital da cidade, onde expliquei o caso ao médico da emergência. Ele pediu raios X e imediatamente constatamos um problema. Ela estava consciente e confusa, e fizemos um eco cardiograma. — Ele suspirou. — A válvula apresentava leve regurgitação e recomendei a cirurgia, mas ela estava lúcida o suficiente para opor-se. Não parava de balbuciar palavras desconexas sobre a prima que, aparentemente, ficara na chuva e que precisava voltar. Achei seu estado preocupante, então a sedei e a mantive no hospital aquela noite até o quadro se estabilizar.

Enquanto Diana morria... Alfonso fechou os olhos. Então não fora negligência. Anahí havia desmaiado.

— Ela teve um ataque cardíaco?

— Pode ter sido, mas leve, embora o eletrocardiograma não acusasse nada. Ela se recobrou e recusou-se a ser operada, mas insisti em manter o controle. A cada três meses, eu a examinava. Há cerca de um mês, a regurgitação começou a piorar e insisti na cirurgia, antes que a situação se tornasse crítica. Já apresentava sintomas... — Fez-se uma pausa, como se o silêncio de Alfonso quisesse comunicar algo. — Como ela está?
 

— Hoje ela desmaiou no ônibus. Trancou a bolsa no carro e correu para pegar o ônibus para ir ao trabalho, mas não chegou lá. Eles a trouxeram para o hospital em que opero, sem saber quem era, e realizei uma cirurgia de emergência, desconhecendo sua identidade até terminar o procedimento.

— Bem, ela foi muito bem atendida, independentemente das circunstâncias. É um alívio saber que está em boas mãos. Ela vai ficar bem?

— Tudo dentro de níveis aceitáveis, e está consciente. Precisamos esperar para saber como reage. Espero que se recobre por completo. — Respirou fundo. — Nunca soube que ela sofria do coração. Não me contaram.

— Não se sinta mal. Ela nunca contou a ninguém. É uma jovem independente e sem família.

— Ela tem um tio e uma tia que cuidaram dela quando os pais morreram.

— Claro, mas você sabe o que acontece quando os parentes pegam crianças indesejadas. Nunca as consideram como filhos.

Alfonso ainda tentava recuperar-se do choque.

— Ela contou que morava com os pais da prima?

— Sim. Havia tirado o passaporte e estava com a certidão de nascimento quando veio aqui da última vez. Planejava trabalhar no exterior, em algum país do terceiro mundo. Graças a Deus, tudo isso aconteceu antes de ela deixar o país. — Alfonso sentou-se.

— É mesmo.

— Bem, fico feliz por saber que minha paciente sobreviverá. Por favor, diga-lhe que gostaria de vê-la quando estiver de pé novamente.

— Pode deixar. Obrigado por tudo.

— Nada fiz senão obrigá-la a fazer os exames de rotina.

— Você a manteve viva. Venha me visitar quando estiver em Atlanta. Trabalho no St. Mary's.

— Farei isso. E você também pode retribuir o favor, se por acaso um dia vier a Macon.

Alfonso deu uma gargalhada.

— Pode deixar. Boa noite. — Desligou e o sorriso desapareceu. Sabia tão pouco acerca de Anahí. Será que os vásquez tinham conhecimento de sua doença? Precisava descobrir. Telefonou, mas a ligação caiu na secretária eletrônica, que informou que eles tinham viajado e só voltariam na semana seguinte.

Ele pediu a chave mestra ao proprietário e ao chaveiro que abrisse a porta do carro de Annie. Pagou o chaveiro e dispensou-o. Depois, acenando para o proprietário do prédio e carregando a bolsa, abriu a porta do apartamento no segundo andar. A gatinha foi correndo ao seu encontro, provavelmente morta de fome, pensou ao pegá-la no colo e escondê-la dentro do paletó para que ninguém a visse enquanto trancava a porta do apartamento e saía.

Precisou parar no supermercado a caminho de casa para comprar alguns itens necessários ao filhote, um bichinho muito bem comportado. A gata deitou-se ao lado de Alfonso no assento da frente do carro e ficou ali, quietinha, miando contente, sem incomodar em nada.

Ao chegar em casa, gostou da companhia. Nunca percebera o quão solitário era seu apartamento. Preparou um bule de café, sentou-se numa poltrona com uma xícara fumegante na mesinha ao lado e abriu o jornal médico que recebera naquele dia. A gatinha pulou em seu colo, aninhou-se confortavelmente e dormiu ronronando. Antes de deitar, ligou para o CTI para saber notícias de Anahí. Recebeu a informação de que ela continuava a progredir. Quando deitou, a gata o acompanhou. Sentiu-a ao lado da cabeça no travesseiro ao pegar no sono.

A paciente (Adaptada) ayaOnde histórias criam vida. Descubra agora