Capítulo 2

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Enquanto isso, Valancourt sofria os terrores do remorso e do desespero. Ver Emily havia renovado todo o ardor com o qual ele a amava inicialmente, e que havia sofrido um abatimento temporário pela ausência e pelas cenas passageiras da vida corrida. Quando ele foi para Languedoc, ao receber a carta dela, soube, então, que a sua própria insensatez o havia involvido na ruína e não era parte do plano dele esconder isso dela. Mas ele só lamentava o atraso que sua má conduta traria ao casamento deles e não previu que a informação poderia induzi-la a terminar a conexão para sempre. Enquanto o prospecto dessa separação tomava conta de sua mente, ferida anteriormente com a autocensura, ele aguardava a segunda entrevista deles num estado pouco longe da distração, porém ainda estava inclinado a ter esperança de que suas súplicas a convenceriam a não exercer isso. Pela manhã, ele enviou alguém para saber quando ela o veria; e o seu bilhete chegou quando ela estava com o conde, que havia buscado uma oportunidade de conversar com ela novamente sobre Valancourt, pois percebeu a aflição extrema da mente dela e temia, mais do que nunca, que a fortaleza a abandonaria. Quando Emily dispensou o mensageiro, o conde voltou para o assunto de sua última conversa, insistindo em seu medo das súplicas de Valancourt e observando para ela novamente a infelicidade contínua que se seguiria, se ela se recusasse a enfrentar alguns desconfortos no presente. De fato, os argumentos repetidos dele por si só poderiam conseguir protegê-la da afeição que ela ainda sentia por Valancourt, e ela decidiu ser controlada por eles.

Contudo, a hora da entrevista chegou. Emily foi para esta pelo menos com compostura em seu comportamento, mas Valancourt estava tão agitado que não conseguiu falar por vários minutos, e suas primeiras palavras foram alternadamente de lamentação, súplica e autocensura. Depois, ele disse: "Emily, eu te amei... amo-te, mais do que a minha própria vida; mas eu fui arruinado pela minha própria conduta. Porém, preferiria lhe prender numa conexão que será miserável para você ao invés de me submeter à punição, que me é devida, perdê-la. Eu sou um desgraçado, mas não serei mais um vilão. Não vou tentar abalar a sua resolução com as súplicas de uma paixão egoísta. Eu a resigno, Emily, e tentarei achar um consolo em pensar que apesar de eu estar miserável, pelo menos você poderá ser feliz. O mérito do sacrifício, de fato, não é meu, pois eu nunca teria atingido a força de mente para desistir de você se a sua prudência não tivesse exigido isso".

Ele pausou um instante, ao passo que Emily tentava esconder as lágrimas que vieram aos seus olhos. Ela teria dito: "agora você está falando como deveria", mas se conteve. "Perdoe-me, Emily", disse ele, "por todos os sofrimentos que lhe causei e às vezes quando você pensar no Valancourt miserável, lembre-se que o único consolo dele seria acreditar que você não está mais infeliz por causa da insensatez dele." As lágrimas corriam rápidas pela face dela e ele estava persistindo no frenesi do desespero, quando Emily se esforçou para retomar sua fortaleza e pôr fim à entrevista que só parecia aumentar a aflição de ambos. Vendo as lágrimas dela e que ela estava se levantando para ir embora, Valancourt lutou para superar seus sentimentos mais uma vez e acalmar os dela. "A lembrança dessa tristeza", disse ele, "será a minha proteção no futuro! Oh! Nunca mais o exemplo ou a tentação terão o poder de me seduzir para o mal, exaltado como eu ficarei com a lembrança da sua aflição por mim".

Emily ficou um tanto reconfortada com essa garantia. "Estamos nos despedindo para sempre", disse ela; "mas, se a minha felicidade for importante para você, sempre se lembrará de que nada pode contribuir mais para ela do que acreditar que você recuperou a sua própria estima." Valancourt pegou a mão dela; os olhos dele estavam cheios de lágrimas, e o adeus que ele teria dito foi perdido em suspiros. Após alguns momentos, Emily disse, com dificuldade e emoção: "adeus, Valancourt, que você seja feliz!" Ela repetiu seu "adeus" e tentou puxar sua mão; mas ele ainda a segurava e a banhou de lágrimas. "Por que prolongar esses momentos?", disse Emily, em uma voz quase não audível, "eles são dolorosos demais para nós dois." "Isto é demais... demais!", exclamou Valancourt, deixando a mão dela e se jogando em uma cadeira, onde escondeu sua face com suas mãos e foi tomado por alguns instantes por suspiros convulsivos. Após uma pausa longa, durante a qual Emily chorou em silêncio e Valancourt parecia estar lutando com a dor, ela se levantou novamente para se despedir dele. Então, se empenhando em recuperar sua compostura: "eu estou lhe afligindo novamente", disse ele, "mais deixe que a angústia que eu sofro implore por mim." Então, acrescentou, com uma voz solene que tremia frequentemente com a agitação de seu coração: "adeus, Emily, você sempre será a única dona de minha ternura. Às vezes, você pensará no Valancourt infeliz e será com pena, embora não possa ser com estima. Oh! O que é o mundo inteiro para mim, sem você... sem a sua estima!" Ele se conteve. "Estou caindo novamente no erro que acabei de lamentar. Eu não devo me impor mais sobre a sua paciência, ou terei um relapso de desespero."

Ele deu outro adieu para Emily, pressionou a mão dela contra seus lábios, olhou para ela pela última vez, e correu para fora do aposento.

Emily permaneceu na cadeira onde ele a havia deixado, oprimida com uma dor em seu coração que mal a deixava respirar, e escutando os passos dele indo embora, ficando mais e mais fracos, conforme ele atravessava o corredor. Ela foi levantada finalmente pela voz da condessa no jardim e, quando sua atenção foi desperta, o primeiro objeto que impressionou sua visão foi a cadeira vazia onde Valancourt havia sentado. As lágrimas, que por algum tempo haviam sido reprimidas pelo tipo de choque que se seguiu à partida dele, vieram para aliviá-la, e, enfim, ficou suficientemente recomposta para voltar para o seu quarto. 

Os Mistérios de Udolfo (1794)Onde histórias criam vida. Descubra agora