Capítulo 4

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Na noite seguinte, perto da mesma hora que na anterior, Dorothee veio para o quarto de Emily com as chaves para aquela suíte de quartos que era, particularmente, apropriada para a Marquesa falecida. Estes se estendiam ao longo do lado norte do castelo, formando parte do prédio antigo; e, como o quarto de Emily ficava no lado sul, elas tiveram que passar por uma grande extensão da fortaleza e pelos quartos de vários membros da família, cujas observações Dorothee estava ansiosa para evitar já que estas poderiam incitar perguntas e levantar rumores, tais que iriam desagradar o conde. Portanto, pediu que esperassem meia hora antes de seguirem adiante, para que pudessem ter certeza de que todos os criados tivessem ido para a cama. Era quase uma da manhã antes do castelo ficar perfeitamente quieto, ou de Dorothee achar que fosse prudente sair do quarto. Nesse intervalo, a sua disposição pareceu ficar muito afetada com a lembrança de eventos passados e do prospecto de entrar novamente em lugares onde esses haviam ocorrido, e nos quais ela não havia estado por muitos anos. Emily também estava comovida, mas seus sentimentos eram mais de solenidade e menos de medo. Elas, enfim, despertaram do silêncio, no qual a reflexão e a expectativa haviam as colocado, e saíram do quarto. Dorothee primeiramente carregava o lampião, mas sua mão tremia com tanta fraqueza e medo que Emily o tomou dela e ofereceu seu braço para apoiar os seus passos débeis.

Elas tiveram que descer a escadaria grande e, após passarem por uma vasta extensão do castelo, tiveram que subir por outra, que levava até a suíte de quartos da qual elas estavam à procura. Andaram cuidadosamente ao longo do corredor aberto, que corria pelo grande salão, e para o qual os quartos do conde, condessa e Lady Blanche davam, e de lá, descendo a escadaria principal, elas cruzaram o próprio salão. Procedendo através da sala dos criados, onde as chamas da lenha, apagando-se, ainda brilhavam na lareira e a mesa de jantar estava rodeada por cadeiras que obstruíam a passagem, elas chegaram ao pé da escadaria dos fundos. A velha Dorothee pausou e olhou em volta: "vamos escutar, se alguma coisa está se mexendo; Ma'amselle, você ouve alguma voz?"

"Nenhuma", disse Emily, "certamente não há pessoa alguma acordada no castelo, além de nós."

"Não, Ma'amselle", disse Dorothee, "mas eu nunca estive aqui antes a essa hora e, dado o que sei, meus medos não são infundados."

"O que você sabe?", perguntou Emily.

"Oh, Ma'amselle, nós não temos tempo para conversar agora; vamos continuar. Aquela porta, à esquerda, é a que devemos abrir."

Elas prosseguiram e, tendo chegado ao topo da escada, Dorothee colocou a chave na fechadura. "Ah", disse ela enquanto tentava virá-la, "tantos anos se passaram desde que ela foi aberta que eu temo que não vá se mexer." Emily teve mais sucesso e elas imediatamente entraram num quarto espaçoso e antigo.

"Ah!", exclamou Dorothee enquanto entrava, "a última vez que passei por essa porta... eu seguia o corpo de minha pobre Lady!"

Impressionada com a circunstância e comovida pelo ar empoeirado e solene do aposento, Emily permaneceu em silêncio e elas seguiram em frente por uma longa suíte de quartos, até que chegaram a um mais espaçoso do que o resto, e rico com os restos do esplendor desbotado.

"Vamos descansar aqui um pouco, Madame", disse Dorothee fracamente, "estamos entrando no quarto onde minha Lady morreu! Aquela porta dá para ele. Ah, Ma'amselle! Por que você me convenceu a vir?"

Emily puxou uma das poltronas pesadas, com a qual o aposento era mobiliado, e implorou que Dorothee se sentasse e tentasse se recompor.

"Como a visão desse lugar traz tudo que se passou antes à minha mente!", disse Dorothee; "parece que foi somente ontem que todo aquele evento triste aconteceu!"

"Ah! Que barulho é esse?", perguntou Emily.

Dorothee, levantando-se parcialmente de sua poltrona, olhou em volta do aposento, e elas escutaram, mas, como tudo continuava silencioso, a velha senhora falou novamente no motivo de sua tristeza. "Este salão, Ma'amselle, era o aposento mais fino do castelo na época de minha Lady e foi arrumado de acordo com o próprio gosto dela. Toda essa mobília grandiosa, mas agora você mal consegue ver o que é por causa da poeira e nossa luz não é das melhores... ah! Como eu via esse quarto iluminado na época de minha Lady! Toda essa mobília grandiosa veio de Paris e foi feita à moda de algumas peças do Louvre lá, exceto aqueles espelhos grandes, e eles vieram de algum lugar distante, e aquela tapeçaria rica. Como as cores já se desbotaram desde que eu o vi pela última vez!"

Os Mistérios de Udolfo (1794)Onde histórias criam vida. Descubra agora