Capítulo 18

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Após as descobertas recentes, Emily foi distinguida no castelo pelo conde e sua família, como uma parenta da casa de Villeroi, e recebeu, se isso fosse possível, ainda mais atenção amigável do que já havia lhe sido mostrado.

A surpresa do Conde De Villefort com a demora de uma resposta à sua carta, que foi dirigida a Valancourt em Estuviere, misturou-se à satisfação com a prudência que havia salvo Emily de uma parte da ansiedade que ele estava sofrendo, apesar de que, quando ele a viu cabisbaixa com o efeito de seu erro anterior, toda a sua resolução foi necessária para impedi-lo de contar a verdade que lhe daria um alívio momentâneo. O casamento próximo, de Lady Blanche, dividia a atenção dele com esse outro motivo de ansiedade, pois os habitantes do castelo já estavam ocupados com os preparativos para esse evento e a chegada de M. St. Foix era esperada diariamente. Emily tentava, em vão, participar da animação que a rodeava, sua disposição estava deprimida, com as descobertas recentes e com a ansiedade quanto ao destino de Valancourt, que foi causada pela descrição de seu comportamento quando ele havia entregue o anel. Ela via nisso a imprudência sombria do desespero; e, quando considerava o que esse desespero pode tê-lo levado a fazer, seu coração murchava de medo e tristeza. O estado de suspense quanto à sua segurança, ao qual ela acreditava estar condenada até voltar para La Valée, parecia ser insuportável e nesses momentos ela não conseguia nem se esforçar para assumir a compostura que havia deixado sua mente, mas muitas vezes saía abruptamente do grupo, com o qual estava, e tentava acalmar seu espírito na solidão profunda da floresta, que contornava a costa. Ali, o rugido fraco das ondas espumantes, que se quebravam lá embaixo, e o murmúrio ranzinza do vento, entre os galhos ao redor, eram circunstâncias em harmonia com o temperamento de sua mente; e ela se sentava numa colina ou nos degraus quebrados de sua torre de vigia preferida, observando as cores mudando nas nuvens da noite e a escuridão do crepúsculo espalhada sobre o mar até os topos brancos das ondas que, vindo em direção à margem, mal podiam ser discernidos em meio às águas escurecidas. Ela repetia frequentemente os versos entalhados nessa torre por Valancourt, com um entusiasmo melancólico, e, então, empenhava-se para interromper as lembranças e a tristeza que eles causavam e voltar seus pensamentos para assuntos indiferentes.

Uma noite, após caminhar com seu alaúde até esse local favorito, ela entrou na torre em ruínas e subiu uma escada em espiral, que levava até um cômodo pequeno, que estava menos destruído do que o resto da construção, e de onde ela tinha olhado muitas vezes com admiração para a vista ampla do mar e da terra, que se estendia abaixo. O sol estava se pondo naquele trato dos Pirineus, que dividia Languedoc de Rousillon, e se posicionando do lado oposto a uma pequena janela com grade que, como os topos das árvores abaixo e as ondas ainda mais para baixo, brilhavam com a luz vermelha do oeste, ela tocou os acordes de seu alaúde numa sinfonia solene, e, então, acompanhou-o com sua voz em uma das melodias mais simples e emocionantes, a qual, em dias mais felizes, Valancourt havia ouvido frequentemente em êxtase, e que ela adaptou para os versos seguintes.

À MELANCOLIA

Espírito de amor e tristeza – salve!
Tua voz solene de longe eu ouço,
Misturando-se com a ventania da noite que morre;
Salve, com essa lágrima tristemente agradável!

Ó, nesta hora quieta, nesta hora solitária,
Tua própria doce hora do dia que termina,
Desperta teu alaúde, cujo poder encantador
Chamará a imaginação para obedecê-lo:

Para pintar o sonho da natureza romântica,
Que encontra os olhos do poeta refletindo,
Enquanto na margem do riacho escuro,
Ele dá para ela o suspiro ardente.

Ó espírito solitário! Deixa que tua música
Leve-me por todos os teus locais sagrados,
Pelos corredores do ministro iluminados pelo luar,
Onde espectros entoam o canto da meia-noite.

Os Mistérios de Udolfo (1794)Onde histórias criam vida. Descubra agora