Deixando as cenas alegres de Paris, nós voltamos àquelas dos Apeninos sombrios, onde os pensamentos de Emily ainda eram fiéis a Valancourt. Olhando para ele como sua única esperança, ela se lembrava, com uma exatidão invejável, de cada promessa e cada prova que havia testemunhado da afeição dele; lia novamente as cartas que havia recebido; avaliava, com ansiedade intensa, a força de cada palavra que falava de seu afeto; e enxugava suas lágrimas ao confiar na verdade dele.
Enquanto isso, Montoni havia feito uma investigação estrita quanto ao motivo estranho de seu espanto, sem obter informação alguma; e foi finalmente obrigado a explicar isso com a suposição razoável de que era um truque maldoso de algum de seus criados. Seus desentendimentos com Madame Montoni, quanto à questão de suas posses, agora eram mais frequentes do que nunca; ele até mesmo a deixava confinada em seu próprio quarto, e não tinha escrúpulos ao ameaçá-la, com uma severidade muito maior, se ela perseverasse em sua recusa.
Se ela consultasse a razão, esta teria a deixado perplexa em sua escolha de qual conduta deveria ser adotada. Teria apontado o perigo de se opor mais e irritar um homem como Montoni havia provado ser, e a cujo poder ela havia se entregado tão completamente; e esta também teria dito de qual importância extrema para o seu conforto futuro era reservar para si aquelas posses que a permitiriam viver independentemente de Montoni, se ela conseguisse escapar de seu controle imediato. Mas, ela era dirigida por um guia mais decisivo do que a razão – o espírito de vingança, que a estimulava a opor violência com violência, e obstinação com obstinação.
Completamente confinada à solidão de seu aposento, ela estava reduzida a solicitar a companhia que havia rejeitado recentemente; pois Emily era a única pessoa, além de Annette, com quem ela era permitida conversar.
Portanto, Emily, generosamente ansiosa pela paz dela, tentou persuadi-la, quando não conseguiu convencê-la, e com todos os meios gentis, tentou induzi-la a evitar aquelas respostas ásperas que tanto irritavam Montoni. O orgulho de sua tia, às vezes, se suavizava com a voz calmante de Emily, e havia, inclusive, momentos em que ela tratava suas atenções afetuosas com boa vontade.
As cenas terríveis de contenção, as quais Emily era frequentemente compelida a testemunhar, exauriram seu espírito mais do que quaisquer outras circunstâncias que haviam ocorrido desde sua partida de Toulouse. A gentileza e a bondade de seus pais, juntamente com as cenas da sua antiga felicidade, tomavam conta de sua mente muitas vezes, como visões de um mundo superior; enquanto os personagens e as circunstâncias, passando sob seus olhos agora, excitavam tanto terror quanto surpresa. Ela mal podia ter imaginado que paixões tão ferozes e variadas, quanto as que Montoni exibia, poderiam se concentrar em um indivíduo; porém, o que a surpreendia mais era que, em ocasiões importantes, ele podia misturar essas paixões, selvagens como elas eram, à causa de seu interesse, e geralmente conseguia disfarçar em seu rosto as operações delas em sua mente; mas, ela o havia visto vezes demais, quando ele pensava que não fosse necessário esconder sua natureza, para ser enganada em tais ocasiões.
A sua vida presente parecia um sonho de uma imaginação desregulada, ou uma daquelas ficções apavorantes, nas quais, às vezes, os gênios selvagens dos poetas se deleitavam. A reflexão trazia apenas arrependimento, e a antecipação terror. Quantas vezes ela desejava "roubar as asas da cotovia e montar na ventania mais veloz" para que Languedoc e o repouso pudessem ser dela mais uma vez!
Emily perguntava frequentemente sobre a saúde do Conde Morano; mas Annette só ouvia relatórios vagos sobre o perigo que ele corria, e que o seu médico havia dito que ele nunca sairia do chalé vivo. Emily não conseguia deixar de ficar chocada ao pensar que ela, não importa o quão inocentemente, pudesse ser a causa da sua morte; e Annette, que não falhava em ver suas emoções, interpretava-as do seu próprio jeito.